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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Leis trabalhistas precisam conciliar proteção e flexibilidade, diz iFood

Para Fabricio Bloisi, CEO do iFood, legislação não leva em conta novas formas de emprego trazidas pela era digital

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São Paulo

Diante da perspectiva de mudanças na regulamentação das atividades dos trabalhadores por aplicativos na gestão do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o CEO do iFood, Fabricio Bloisi, diz que a empresa está animada para "criar um ambiente que funcione melhor".

Ele afirma que a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) foi importante há 80 anos, mas hoje o mercado precisa de inovação, tecnologia e flexibilidade. Segundo Bloisi, o ideal seria um equilíbrio capaz de "abraçar o futuro" e garantir proteção social.

"Apesar de estarmos saindo de uma eleição de polarizações, em que metade da população acha que a outra metade está completamente errada, e todo mundo se vê na metade certa, nós acreditamos que os dois lados são importantes: proteção social e liberdade econômica para fazer empresas funcionarem bem", diz.

Lula disse que vai mexer na proteção dos trabalhadores de aplicativo, que são o cerne de negócios como o iFood. Isso deve ser um assunto grande no próximo governo? Como vocês pretendem se posicionar? A gente se posicionou sobre isso na Folha, há um ano, com um artigo importante dizendo que nós acreditávamos precisar de novas relações trabalhistas que nos dessem flexibilidade e autonomia para os trabalhadores, mas também proteção social. A CLT foi um avanço superimportante em 1940, quando foi escrita, e contribuiu bastante para equilibrar o mercado há 80 anos. Hoje, a gente tem um mercado que precisa de inovação, novos produtos de tecnologia, flexibilidade, que distribui trabalho. Relações acontecem através de telefones celulares.

Precisamos de leis que permitam que o Brasil continue gerando oportunidades de trabalho, mas conectado com para onde a gente está indo. Quanto a colocar mais energia em direitos sociais, a gente acha isso ótimo. A gente tem empurrado esse tema. Acho que é uma oportunidade para o Brasil ser um país que consegue abraçar o futuro, mas garantindo proteção social, que é uma necessidade de todas as empresas. Então, estamos animados para que a gente consiga andar com essa pauta no ano que vem.

Fabricio Bloisi é um homem branco com cabelo castanho. Ele está sentado em uma cadeira e gesticula enquanto fala. Ao fundo, é possível observar um escritório despojado.
Fabricio Bloisi, CEO do iFood, na sede da empresa, em Osasco - Bruno Santos - 19.nov.22/Folhapress

Algum representante de vocês fez contato com membros da equipe de Lula ou com ele próprio sobre esse assunto após a eleição? O iFood fala com todas as vertentes políticas, sempre reforçando nossa posição de que a gente quer mais proteção social, mantendo a flexibilidade, que inclusive é uma demanda dos próprios entregadores e parceiros, para que a gente possa criar mais trabalho, manter o mercado funcionando e bem, também com as proteções sociais que são necessárias. A gente fala com todos os partidos e vertentes politicas há dois anos sobre esse assunto.

E depois da eleição não houve nenhum contato? Depois da eleição não falamos ainda, mas pretendemos trabalhar junto com o novo governo o ano que vem inteiro, animados em criar um ambiente que funcione melhor.

Ter as regras dos trabalhadores de aplicativo na CLT inviabilizaria negócios como o iFood? Nós acreditamos em equilíbrio no iFood. Achamos que ser inovador e investir em educação e no futuro e ser liberal para criar novos negócios é fundamental para gerar valor. E, também, dividir esse valor é essencial para ter uma sociedade menos desigual. Então, apesar de estarmos saindo de uma eleição de polarizações, em que metade da população acha que a outra metade está completamente errada, e todo mundo se vê na metade certa, nós acreditamos que os dois lados são importantes: proteção social e liberdade econômica para fazer empresas funcionarem bem.

O que seria um exemplo na prática? Licença paternidade e maternidade para o entregador, por exemplo? Essa dialética do tipo "tem direitos sociais ou não tem" não existe na nossa cabeça. Temos uma plataforma que gera oportunidades para 2 milhões, 3 milhões de pessoas, e isso tem que acontecer com direitos sociais que sejam razoáveis, porém, conectados com o momento atual da tecnologia. O problema das leis atuais é que elas foram escritas em um momento em que não existiam telefones nem smartphone nem aplicativos. A maior parte dos trabalhadores de aplicativo —e não só os de aplicativos como também os entregadores, pessoal de carro, o pessoal que faz manutenção em casa ou limpeza— não se encaixa no formato de CLT que existe hoje. Tem muitos profissionais que trabalham sob demanda ou por hora. A gente precisa de uma lei que garanta proteção social, seguridade social, ganhos mínimos, mas que funcionem num modelo mais flexível.

O que pode vir de tecnologia para ajudar nessa questão e em outras? A gente está só começando tudo de tecnologia. As pessoas sempre falam que as mudanças foram muito rápidas nestes últimos dez anos. Nos próximos dez terá muito mais mudanças, mais rápidas ainda. Passou o tempo dos aplicativos, das redes sociais ou de vídeos na internet. O que está para a frente é muito mais.

A gente tem inteligência artificial mudando todos os segmentos, de fotografia ao jornalismo, ao mundo financeiro. Tem impacto de robótica, de tecnologia verde. Tem demanda não só em produção com mais baixo carbono, como energia renovável. Biologia sintética abre espaço para inúmeras mudanças de como o mundo inteiro funciona.

E isso é uma oportunidade, se a gente pensar que novas empresas vão ser criadas. Novos valores serão criados para as pessoas, e a gente tem a oportunidade, em um país emergente que somos, para, em pé de igualdade, lutar para construir este futuro, que eu acho que vai ser muito melhor.

Na briga dos aplicativos no Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica] por causa da exclusividade com os restaurantes, qual é a solução? O iFood, nos últimos anos, focou no que a gente tem que focar, que é o melhor produto para o cliente, para o entregador e para o restaurante. Se você comparar a satisfação do nosso cliente, entregador e restaurante com os concorrentes, é consistentemente muito maior no iFood. Alguns concorrentes nossos, às vezes, dizem que é por causa da exclusividade que o iFood está indo melhor que os concorrentes. Na verdade, nós temos dados de todo o Brasil de que a gente oferece o melhor produto. O iFood tem alguns restaurantes exclusivos, percentual relativamente pequeno. Assim como os concorrentes latino-americanos, os americanos, os europeus e os chineses têm, o que é uma prática completamente regular e legal nesse mercado.

O Cade nos pediu alguns esclarecimentos sobre isso. Nós demos e vamos continuar o mais próximo possível do Cade e das autoridades. É legítimo e normal eles estarem entendendo como funciona a dinâmica competitiva para garantir que a gente está num ambiente competitivo que funciona bem.

Vale lembrar que alguns dos concorrentes fazem, também, contratos exclusivos iguaizinhos aos do iFood nos países de origem deles. Mas eles tentam competir criticando algo que eles fazem exatamente igual. Minha sugestão é: melhora o produto, entrega mais. Quem sabe o cliente vai ficar mais feliz e vai contratar mais os outros concorrentes. Vamos continuar fazendo isso no iFood também.

Como está o mercado de benefícios, no qual vocês entraram nos últimos anos? O mercado de benefícios tem duas ou três grandes empresas há muitos anos oferecendo produto relativamente igual. O governo alterou algumas leis possibilitando que mais gente possa oferecer novos produtos. Temos que atender melhor o trabalhador, oferecer melhor serviço, aplicativo. Hoje não é assim que funciona. O mercado de benefícios é muito focado em que as empresas de benefícios vendam para as empresas contratantes, e ninguém está pensando como o cliente usa isso melhor. Estamos felizes com o ajuste da lei que permite colocar o cliente final no centro do produto. O iFood é pequenininho nesse mercado. Atendemos 600 mil pessoas, mas é um mercado de dezenas de milhões. A gente acha que pode ajudar com a nossa tecnologia.

Como ficam os negócios com a aquisição da fatia da Prosus? Muda a perspectiva de lucratividade? Quem comprou a totalidade do iFood foi a Movile, empresa que eu fundei há 20 anos e que sempre foi a dona do iFood desde o início. Então, o iFood continua sendo da Movile, da qual a Prosus é o principal sócio. Já era o principal sócio há dez anos. Então não mudou quem é o sócio nem quem é o dono do iFood, não mudou nada de estrutura societária.

Quando vamos ver o drone entregar pizza? O iFood já entrega com drone, há um ano e meio, em algumas cidades do Brasil. A gente também entrega com robôs em alguns locais. Nosso robô se chama Ada. E continuamos investindo em inteligência artificial para ter mais automação. Já é uma realidade e vai ser uma realidade cem vezes maior no futuro


iFood

Fundada há 11 anos, recebe mais de 65 milhões de pedidos mensalmente em seu aplicativo e possui cerca de 300 mil estabelecimentos cadastrados, com 200 mil entregadores em 1.700 cidades do país. Atua em outras frentes complementares, como fintech, mercado e benefícios

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