Análise
Consolidar democracia e administrar expectativas serão os maiores desafios
Há imagens que marcam a história de um país. No caso de Moçambique, é uma foto de 1968, no 2º Congresso da Frelimo, a frente de libertação formada para combater o colonialismo português.
Nela estão perfilados todos os que seriam presidentes da República após a independência: Samora Machel, Joaquim Chissano e Armando Guebuza. Tal revezamento foi mera coincidência e, pela primeira vez, o próximo chefe de Estado não será um dos líderes do movimento.
Os moçambicanos escolhem entre Filipe Nyusi --da Frelimo, que governa desde 1975, tendo vencido todas as eleições desde 1994--, Afonso Dhlakama, da Renamo, movimento que lutou contra o governo durante a guerra civil que assolou o país por 15 anos, e Daviz Simango, líder do Movimento Democrático de Moçambique (MDM).
A eleição deve ser a mais disputada desde 1994 e é mais um passo rumo à consolidação de uma das democracias mais estáveis do continente, que já superou a exótica imagem do mundo sobre a política africana.
Há alternância de chefes de Estado, eleitos em pleitos elogiados e sem chance de terceiro mandato.
O próximo presidente terá dois grandes desafios.
O primeiro é consolidar a democracia do país via mudança geracional, fazendo com que a população passe a julgar os seus líderes pela qualidade de seus governos, e não pela gratidão devida aos libertadores coloniais.
O segundo é gerir as expectativas criadas pela descoberta da quarta maior reserva de gás natural do mundo, rivalizando com Catar, Irã e Rússia, e pelo início da exportação do carvão de Moatize, explorado pela Vale.
Segundo estimativas, a economia crescerá cerca de 15% ao ano a partir de 2018.
Adiciona-se a essa estimativa o fato de o país ter crescido a taxas de milagre brasileiro nos últimos anos sem muitos progressos sociais.
O que fazer para que esse crescimento tenha impacto positivo em um país com expectativa de vida de 52 anos e com 50% da população abaixo da linha de pobreza?
Essa é a pergunta mais importante dessas eleições. Para respondê-la, será quase impossível não mencionar casos recentes de grande inserção social, como o Brasil.
Abre-se aí uma oportunidade para o Brasil.
Com capacidade de investimento e com tecnologia em agricultura e saúde, podemos cooperar no desafio de unir o crescimento econômico à inclusão social no país.