Nazistas recebem benefício social dos EUA
Segundo Associated Press, governo manteve pagamentos da Previdência em troca de criminosos deixarem o país
Em suposto acordo, autoridades destituíam cidadania americana dos beneficiários; Washington nega acerto
Dezenas de suspeitos de serem criminosos de guerra nazistas e guardas da SS (tropa paramilitar ligada a Adolf Hitler) receberam milhões de dólares em benefícios da Seguridade Social americana depois de serem forçados a deixar os EUA, descobriu a Associated Press.
Os pagamentos passaram por uma brecha legal que possibilitou ao Departamento de Justiça americano persuadir nazistas suspeitos a deixar os EUA.
Conforme documentos internos do governo americano, quando eles partiram, voluntariamente ou simplesmente fugiram antes de ser deportados, continuaram a receber os pagamentos.
Entre as pessoas que receberam os benefícios há soldados que foram guardas na rede de campos nazistas onde morreram milhões de judeus, um cientista aeroespacial que usou trabalhadores escravos em suas pesquisas no Terceiro Reich e um colaborador nazista que arquitetou a detenção e execução de judeus na Polônia.
Há pelo menos quatro beneficiários ainda vivos. Entre eles estão Martin Hartmann, ex-guarda da SS no campo de Sachsenhausen, na Alemanha, e Jakob Denzinger, que patrulhava o campo de Auschwitz, na Polônia.
Hartmann mudou-se do Arizona para Berlim em 2007, pouco antes de ser destituído da cidadania americana. Denzinger fugiu de Ohio para a Alemanha em 1989, quando já corria o processo para retirar a sua cidadania.
Ele se radicou na Croácia e hoje vive num apartamento amplo em Osijek.
Questionado por um repórter da Associates Press, negou-se a comentar a sua situação. Seu filho, que vive nos EUA, confirmou que Denzinger recebe pagamentos da Seguridade Social.
Funcionários da diplomacia americana disseram que os benefícios tornaram-se ferramentas para garantir acordos pelos quais suspeitos nazistas aceitariam a perda de cidadania e deixariam os EUA de modo voluntário.
"É um ultraje total que criminosos nazistas continuem a receber benefícios da Seguridade Social quando já foram proscritos em nosso país há muitos anos", disse a deputada democrata Carolyn Maloney, do Comitê de Inspeção e Reforma Governamental da Câmara.
Ela disse que pretende propor legislação para acabar com essa possibilidade.
A análise da AP constatou que, desde 1979, ao menos 38 de 66 suspeitos afastados do país mantiveram benefícios.
As autoridades austríacas ficaram furiosas quando souberam de um acordo fechado com Martin Bartesch, ex-guarda da SS no campo de concentração de Mauthausen, na Áustria.
Em 1987, Bartesch desembarcou em Viena, sem ser anunciado. Dois dias mais tarde, sob os termos do acordo, a cidadania americana foi revogada. Bartesch continuou a receber benefícios da Seguridade Social americana até sua morte, em 1989.
"Não é assim que os EUA deveriam agir. Não deveríamos jogar nosso lixo, por falta de um termo melhor, em países amigos", disse James Hergen, assessor jurídico assistente no Departamento de Estado de 1982 a 2007.
Um porta-voz do Departamento de Justiça, Peter Carr, disse em comunicado por e-mail que os pagamentos da Seguridade Social nunca foram usados para persuadir nazistas suspeitos a deixar o país voluntariamente.
A Administração da Seguridade Social rejeitou o pedido da Associated Press de informação sobre o número total de nazistas suspeitos que receberam os benefícios e os valores em dólares.