Por que Elon Musk —e a Tesla— precisam tanto da China

Incentivos do governo chinês e custos baixos da fábrica de Xangai, a maior da montadora, criaram forte relação entre o país e o empresário

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Mara Hvistendahl
The New York Times

Quando Elon Musk estabeleceu uma fábrica da Tesla na China, ele parecia ter a dianteira. Ele obteve acesso aos principais políticos e garantiu mudanças de legislação que beneficiaram a Tesla.

Ele também fez com que os trabalhadores se acostumassem com longas horas de trabalho e menos proteções, após conflitos com reguladores dos EUA sobre as condições de trabalho em sua fábrica na Califórnia.

CEO da Tesla, Elon Musk, entra em um carro Tesla ao sair de um hotel em Pequim, China, em maio de 2023 - REUTERS

Assim, a fábrica de Xangai ajudou a tornar a Tesla a empresa de automóveis mais valiosa do mundo e Musk ultrarrico.

Mas a Tesla está enfrentando dificuldades agora. Musk ajudou a criar sua concorrência, fabricantes chineses de veículos elétricos que estão ganhando participação de mercado e se tornando uma preocupação de segurança para os Estados Unidos e a Europa.

A Tesla incentivou o crédito de carbono chinês

Na Califórnia, onde a Tesla lançou seu primeiro carro em 2008, a empresa lucrou com uma legislação sobre emissões de gases que permite vender créditos — bilhões de dólares — para fabricantes de automóveis que não conseguem atingir as metas de poluição.

Quando Musk se voltou para a China, seus lobistas incentivaram os líderes locais a adotar uma política semelhante. E-mails e outros documentos obtidos pelo The New York Times mostram que eles trabalharam com ambientalistas da Califórnia determinados a reduzir a poluição nas cidades chinesas.

Pequim adotou a política, que também estava sendo promovida por grupos não relacionados à Tesla, em 2017. Após a abertura de sua fábrica em Xangai em 2020, a empresa obteve centenas de milhões de dólares em créditos por meio da política, de acordo com a empresa de análise de mercado CRU Group.

A fortuna de Musk está ligada à fábrica de Xangai

A fábrica de Xangai da montadora substituiu a planta de Fremont, Califórnia, como a maior e mais produtiva, respondendo por mais da metade das entregas globais da empresa e a maior parte de seus lucros.

Enquanto a fábrica tomava forma em menos de um ano, Musk trabalhou em estreita colaboração com um funcionário da cidade que agora é o primeiro-ministro da China, Li Qiang.

Sob a supervisão de Li, bancos estatais ofereceram empréstimos juro baixo à Tesla, um acordo tão generoso que um oficial sênior do setor automotivo lembrou-se de um ministro hesitando em aceitá-lo.

A China também alterou as regras de propriedade para que a Tesla pudesse se estabelecer sem um parceiro local, uma novidade para uma empresa automotiva estrangeira na China.

Assim, Musk economiza em custos de produção e mão de obra em Xangai e não pode se desvencilhar facilmente, caso queira. Como a fortuna do bilionário está vinculada às ações da Tesla, seu dinheiro agora depende do que acontece na China.

O crescimento da Tesla vinculou Musk a Pequim

Essa dependência de Musk da fábrica de Xangai pode dar a Pequim uma vantagem sobre ele, o que é preocupante porque empresa SpaceX tem contratos sensíveis com o governo americano e controla grande parte da internet via satélite do mundo por meio de sua rede Starlink.

Musk disse que suas empresas não devem ser confundidas. Mas ele também elogiou os líderes chineses e tomou o lado da China em disputas geopolíticas, mesmo enquanto critica os políticos nos Estados Unidos.

Em uma conversa online com dois membros do Congresso em julho, ele se autodenominou "um pouco pró-China".

A China garantiu saída para questões trabalhistas

Musk, que insinuou que os trabalhadores americanos são preguiçosos, exigia intensidade na fábrica da Tesla em Fremont, às vezes até dormindo no chão da fábrica ele mesmo.

Em Xangai, ele poderia escapar dos reguladores americanos e dos organizadores trabalhistas.

O Times conversou com trabalhadores de fábricas chinesas que descreveram ter sido solicitados a trabalhar seis turnos consecutivos de 12 horas durante o lockdown de coronavírus da cidade em 2022.

Alguns dormiam no chão da fábrica, como Musk havia feito em Fremont. Eles poderiam optar por não trabalhar, mas com corte de salário, disseram.

Quando um trabalhador foi esmagado por uma máquina no ano passado, um relatório do governo citando lacunas de segurança foi retirado do ar.

A Tesla impulsionou elétricos da China

Os líderes chineses queriam uma fábrica da Tesla para impulsionar o setor de veículos elétricos da China. E foi exatamente isso que aconteceu.

Em Xangai, a Tesla passou a usar baterias e peças feitas localmente, em alguns casos ajudando os fornecedores a desenvolver tecnologias que depois foram vendidas para fabricantes chineses de veículos elétricos. A Tesla também treinou uma geração de talentos.

Agora, Europa e Estados Unidos estão tentando alcançar. O ministro das Finanças francês, Bruno Le Maire, diz que a China tem uma vantagem de cinco a sete anos sobre a Europa.

E a própria Tesla está cada vez mais vulnerável. Seus rivais chineses, como a BYD, a ultrapassaram em vendas mundiais no final do ano passado. Sem barreiras comerciais, Musk alertou em janeiro, a BYD e outros "praticamente demolirão a maioria das outras empresas de automóveis do mundo".

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