Reduzir literatura é endossar que ler não nos leva a nada, diz leitor
Que me desculpe a escritora Patrícia Secco, mas se ela é uma escritora e escreve em língua portuguesa, Secco, mais do que ninguém, deveria ter apreço ao uso de nosso idioma.
Machado de Assis, assim como todo e qualquer escritor ao dedicar-se ao árduo processo criativo, gastava seu valoroso tempo, deixando convívios familiares e sociais, para dar a nós, leitores, prazerosos momentos de leitura.
Entendo que é preocupante a ínfima adesão aos livros por parte dos jovens leitores; talvez Seco tivesse o intuito de mudar tal situação com seu projeto.
Mas não seria mais racional empregar o montante angariado via leis e junto ao Ministério da Cultura para publicar as obras machadianas com detalhados dicionários no rodapé das páginas?
Ou mesmo melhorando o vocabulário dos alunos, com projetos escolares, para que os não tão experientes leitores pudessem, num futuro próximo, ler não só Machado mas qualquer autor de nossa literatura?
Ainda que o exemplo a seguir não seja uma simplificação feita pelo projeto da escritora, reduzir trechos das obras como: "... a conversação que tive com uma senhora, há muitos anos" por "... o papo que tive com uma tiazinha há uma pá de tempo", é ridículo.
Reprodução | ||
O escritor Machado de Assis (1839-1908) |
Ao invés da literatura acrescentar valores, conhecimentos e melhorar o vocabulário de nossos jovens e iniciantes leitores, essas reduções deixam em ruínas nossa língua.
E, aceitando atitudes como essas, endossamos que ler os clássicos não nos leva a nada. Ratificamos, ainda, que Paulo Freire lutou durante anos em vão.
Se o conhecimento liberta o oprimido, aceitar essas "descomplicações" nos transforma em opressores daqueles que não tiveram oportunidade de estudar, constantemente excluídos do acesso à cultura.
Nessa imensa redoma virtual que hoje existe, repleta de leituras medíocres, vocabulários do tipo "mais qui carai..." farão parte do já maravilhoso repertório desses excluídos.
ÁLVARO AUGUSTO BOLZAN CATELAN, 38, é professor de Literatura Brasileira no Colégio Dinâmico, em Goiânia, além de adaptador das obras machadianas para o teatro.
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