Grupos saem das redes sociais e vão às ruas para mudar São Paulo
Leão odeia fios elétricos expostos. Ricardo quer que as plantas no meio-fio da avenida Paulista sejam iguais às de 453 anos atrás. João deseja andar de bonde pelo centro.
Pequenas revoltas, grandes repercussões. Cada um desses moradores de São Paulo começou na internet protestos que agora geram frutos (e algumas mudanças).
No caso do jornalista Leão Serva, 53, o jeito de combater a fiação elétrica que risca o céu da cidade foi expondo-a, a partir de 2011. Em redes sociais, ele posta duas fotos por dia do emaranhado de fios.
"Isso foi pegando, pegando, pegando. Até que ficou sério", diz. Malditos Fios!, nome da vinheta que usa no Instagram, virou exposição na Escola São Paulo, nos Jardins.
Mas a objeção não é só estética, diz. "Os fios estão particularmente em mau estado. Derrubam árvores, têm manutenção difícil."
O prefeito Fernando Haddad anunciou que aterrar a fiação era prioridade --segundo levantamento da Folha, no ritmo atual, demoraria 3.000 anos para esconder os 38 mil quilômetros da rede aérea na cidade.
BONDE DO BONDE
Já o administrador Roberto Silveira, 55, propõe a volta dos bondes como meio de transporte numa página do Facebook. O grupo, porém, é fechado para poucas pessoas depois de um anônimo chamar a causa de fútil. Silveira discorda: "Parece uma microcausa, mas está bem conectada ao espaço público"
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SENTE-SE MAL? SENTE-SE BEM
A assessora de imprensa Sofia Carvalhosa, 53, e o jornalista Ricardo Porto, 62, tentaram em vão namorar na praça. "Não dava para ficar confortável. O banco tinha sido feito para ser incômodo", diz Porto. Há um ano, fundaram a comunidade virtual Bancos com Encosto para Sampa!.
A prefeitura diz que o modelo de assento sem apoio, mais comum na cidade, valerá até que termine o contrato com uma empresa (sem especificar quando o acordo chega ao fim).
O casal não espera sentado: já se encontrou com políticos e organiza seu primeiro ato público. O banco atual, diz Sofia, "é feito para não sentar, deitar, se acomodar. O paulistano se adapta a tudo. Ou quase".
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EM PÉ DE GUERRA PELO PÉ DE ÁRVORE
Faz hoje duas semanas que o grupo SOS Praça Vilaboim, existe em redes sociais. São 450 internautas ao redor de uma causa. Ou de uma figueira, a maior árvore da praça em Higienópolis.
A designer Patrícia Cataldi e a consultora de "glamour" Micaela Marcovici leram no jornal que a árvore seria derrubada e reuniram vizinhas --como Mariana Verissimo, filha de Luís Fernando Verissimo, a apresentadora Marina Person, a jornalista Sílvia Poppovic e a designer Marta Meyer.
Recebido na Subprefeitura da Sé, o grupo conseguiu postergar a remoção. Um agrônomo australiano foi, inclusive, contratado para tentar salvar o pé com tratamentos alternativos. "Ganhamos alguns meses", afirma Micaela.
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VERDE VERDE-AMARELO
Ricardo Cardim se sente no exterior quando vai à avenida Paulista. O ambientalista rejeita as mudas importadas da África que ocupam as 47 jardineiras do logradouro mais famoso da cidade.
"Usaram plantas vindas de Madagascar no replantio, começado no ano passado. Precisava?" Ele mesmo responde: "É claro que não".
Desde que a prefeitura fincou as espécies exóticas, Cardim começou uma campanha de nacionalização da flora pública em seu blog, o Árvores de São Paulo.
Para o lugar dos pândanos, árvore africana que pode chegar a até dez metros de altura, ele sugere que seja usada a palmeira-jerivá, nativa da serra da Cantareira. "Queria plantar eu mesmo." Mas a prefeitura não permite que cidadãos cultivem espécies em lugares públicos, então ele se refreou. "A causa ainda está verde."
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FESTA DO INTERIOR
A Chácara Klabin deve voltar a ser mais "chácara" e resgatar o clima de cidade pequena. É o lema do gerente de sistemas Daniel Moral, 32, 30 deles morando no bairro rico, colado à Vila Mariana, na zona sul da cidade.
"Antes, todo mundo se conhecia por aqui. Agora, subiram vários prédios, e as pessoas perderam o contato." Para retomar o clima de interior, Daniel criou há dez anos um site para o bairro.
No ano passado, enveredou também para o Facebook. O grupo já fez três festas e cinco caminhadas até agora.
Em 9 de junho, acontece a primeira "cãominhada" do bairro, que já conta com cem inscritos. A política da boa vizinhança deve vencer os muros altos, aposta Moral.
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O PÚBLICO E A PRIVADA
"Estar apertado é um direito de todos", diz o professor de inglês Marcos Adalui, 32, em seu apartamento, no centro.
Após sete anos em Paris, ele voltou para o Brasil em 2012. E sentiu a coisa feder. "As ruas cheiram a urina. Vê se o centro de outras grandes cidades é assim. Não é. E sabe por quê?"
A resposta, defende, são banheiros públicos. Na segunda semana de Brasil, ele abriu um abaixo-assinado virtual pelo aumento de toaletes. Coletou 3.500 assinaturas.
Na semana que vem, quer sair à rua --cogitou usar uma tampa de privada ao redor do pescoço para chamar atenção, mas desistiu.
Adalui gosta de citar o guia "Banheiros em São Paulo. Onde ir? Como fazer?", criado por Homeo Bruschini, urologista do Hospital das Clínicas. A obra lista apenas 37 toaletes abertos e gratuitos em toda a cidade.