Descrição de chapéu Financial Times União Europeia

Noruega pretende abrir área oceânica extensa para mineração em águas profundas

País pode se tornar o primeiro a extrair metais de seu leito oceânico para fabricação de baterias

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Kenza Bryan Richard Milne
Londres e Oslo | Financial Times

O governo da Noruega prepara planos para abrir uma área oceânica quase igual à superfície da Alemanha para a mineração em águas profundas, com o objetivo de ser o primeiro país a extrair materiais para baterias de seu leito oceânico.

O Ministério da Energia norueguês deve apresentar ao Parlamento nas próximas duas semanas uma proposta para disponibilizar uma área vasta a pedidos de exploração e extração. O plano então seria submetido ao voto do Parlamento no outono.

Mas Oslo enfrenta a oposição de empresas pesqueiras e organizações ambientalistas e corre o risco de abrir uma disputa com outros países porque quer permitir a extração mineral nas proximidades do arquipélago norueguês de Svalbard, no Ártico.

Foto aérea mostra algumas casas em poucos quarteirões cercados de neve e o mar ao lado direito. o dia está nublado, com nuvens cinzentas
Vista aérea da cidade de Ny-Alesund, em Svalbard, na Noruega - Lisi Niesner - 6.abr.23/Reuters

A Noruega diz que detém a exclusividade dos direitos de extração mineral numa área maior nessa região do que Rússia, Reino Unido e a UE consideram ser o caso.

Nascentes vulcânicas em profundidades de até 4.000 metros que emergem da crosta terrestre nas falhas entre as placas tectônicas na área proposta contêm estimados 38 milhões de toneladas de cobre, mais do que é extraído em todo o mundo a cada ano.

Amund Vik, o secretário de Estado do Ministério de Petróleo e Energia norueguês, disse ao Financial Times que a mineração em águas profundas ajudará a Europa a suprir "a necessidade enorme de mais minerais, mais materiais de terras raras para fazer a transição acontecer". Ele disse ainda que o governo adotará uma abordagem preventiva em questões ambientais.

O fluido que emerge de fissuras hidrotermais como as que existem nas águas norueguesas também contém outros metais usados na fabricação de baterias de carros elétricos, incluindo o cobalto. Enquanto isso, metais de terras raras como neodímio e disprósio podem ser extraídos das crostas metálicas do fundo do mar. Esses metais são usados na fabricação dos ímãs de turbinas de vento e dos motores de veículos elétricos, mas sua cadeia de fornecimento é em grande parte controlada pela China.

Da região prevista para a potencial extração de minerais, a parte mais controversa seria a área próxima a Svalbard. O Tratado de Svarlbard, que confere à Noruega a soberania sobre as ilhas, também dá a outros países o direito de extrair minerais em terra e nas águas territoriais que cercam o arquipélago. Rússia, União Europeia e Reino Unido estão em desacordo com a Noruega em relação à extensão de água coberta pelo tratado.

Enquanto isso, operações pesqueiras receiam que a poluição gerada pela mineração contamine os peixes. Jane Sandell, executiva-chefe da empresa UK Fisheries –cujo super-arrastão Kirkella é uma das últimas embarcações pesqueiras britânicas a operar tão ao norte— disse que encara com profunda preocupação a possibilidade de serem liberadas partículas de metais pesados tóxicos.

Sverre Johansen, secretário-geral da Associação de Pescadores da Noruega, disse que a indústria pesqueira norueguesa não está "nem um pouco impressionada" com a proposta. O governo diz que o potencial conflito de interesses é pequeno, dada a atividade pesqueira limitada e o pouco tráfego de navios na área.

A agência ambiental da Noruega se opõe fortemente ao plano. Em resposta a uma consulta feita este ano, ela disse que a proposta viola o quadro legal norueguês para a exploração do leito oceânico, por não incluir dados suficientes sobre sustentabilidade.

A agência alertou para "consequências graves e irreversíveis para o ambiente marinho" devido à mineração e argumentou que as fissuras hidrotermais devem permanecer intocadas e que apenas áreas pequenas devem ser abertas à mineração.

Um problema para o Ministério da Energia é o fato de a Noruega declarar-se no palco internacional como protetora de seus oceanos e fonte de peixes capturados de modo sustentável.

Kaja Loenne Fjaertoft, bióloga marinha na representação norueguesa do grupo de campanha WWF, disse que "o governo está falando em duas línguas" quando defende a conservação marinha e ao mesmo tempo segue adiante com planos de mineração.

O primeiro-ministro norueguês Jonas Gahr Støre, atualmente co-presidente da rede Ocean Panel de líderes mundiais comprometidos com a proteção dos oceanos, disse a um jornal local em março que a mineração em águas profundas pode ser feita sem prejudicar a biodiversidade.

Empresas de mineração que operam em outros países, incluindo China, Papua-Nova Guiné, as Ilhas Cook, Japão e Nova Zelândia, vêm explorando como extrair metais de águas costeiras.

O organismo regulador apoiado pela ONU que fiscaliza licitações para mineração em águas internacionais, principalmente no Pacífico, deve chegar a um ponto crucial nas negociações no próximo mês.

Egil Tjaland, secretário-geral do Fórum Norueguês de Minerais Marinhos, entidade representativa da indústria de mineração, disse que a extração em águas profundas é uma especialidade para a Noruega, devido à sua base forte de extração marinha de petróleo e gás.

O grupo recentemente promoveu um workshop em Berlim para discutir parcerias entre as indústrias norueguesa e alemã em mineração em águas profundas.

"Se alguém chegar lá primeiro, devemos ser nós", disse Walter Sogness, executivo-chefe da Loke Marine Minerals, que pretende garimpar as crostas metálicas da Noruega e recentemente firmou dois contratos de exploração no Pacífico patrocinados pelo Reino Unido.

"Somos uma grande nação pesqueira, vivemos à beira-mar, o oceano é nosso maior recurso natural. Não estaríamos reinventando a roda."

Tradução de Clara Allain 

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