Descrição de chapéu Planeta em Transe

Térmicas a carvão no Sul pesam nas emissões de carbono da energia elétrica no Brasil, mostra estudo

Levantamento identifica que um número menor de usinas foi ligado em 2022, mas tendência é de alta no uso de fontes fósseis como gás

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Brasília

As térmicas a carvão foram os destaques em emissões de gases de efeito estufa no ano passado na geração de energia elétrica no Brasil, seguidas pelos empreendimentos movidos a gás natural. O balanço anual dos efeitos do setor na poluição constam do 3º Inventário de Emissões Atmosféricas em Usinas Termelétricas, divulgado nesta quinta-feira (19), pelo Iema (Instituto de Energia e Meio Ambiente).

Fumaça saindo de usina à noite
Vista noturna da Usina Termelétrica Presidente Médici Candiota 3, em Candiota (RS) - Danilo Verpa 7.dez.2021/Folhapress

O levantamento avaliou as 72 usinas termelétricas fósseis conectadas ao SIN (Sistema Interligado Nacional). A pesquisa, no entanto, ainda não inclui o equivalente a 13% da geração térmica com fonte fóssil, que está nos sistemas isolados, em estado no Norte do país, mas o Iema trabalha para incluir essa fatia em avaliações futuras.

Com água farta nos reservatórios das hidrelétricas, e a expansão dos projetos de geração solar e eólica, boa parte das termelétricas ficaram desligadas, o que levou a uma redução na geração de energia elétrica a base de plantas com combustíveis fósseis. O conjunto das usinas inventariadas totalizou 31,1 TWh (Terawatt-hora) em 2022, frente a 95,7 TWh, ou seja, uma queda de 67%.

O conjunto da geração termelétrica fóssil brasileira voltou a representar os mesmos 10% da geração na matriz elétrica de 20 anos atrás.

"No entanto, foi um momento atípico, pois a produção de energia elétrica depende de condições climáticas, que variam muito", explica Felipe Barcellos e Silva, que coordenou o levantamento. "A sinalização no sistema brasileiro é de aumento da geração térmica a partir de fontes fósseis para a energia elétrica."

O levantamento, por exemplo, identifica o aumento no uso de térmicas com combustíveis fósseis ao longo dos anos, principalmente a partir da década de 2010. Essa categoria de geração passou de 30,6 TWh em 2000 para 91,8 TWh em 2020, uma expansão de 200%), o que levou a uma elevação de 113% nas emissões de gases de efeito estufa do setor elétrico brasileiro.

Quase a totalidade do CO2e (dióxido de carbono equivalente) emitido no ano passado, 98% do total, foi proveniente de metade das usinas fósseis. No entanto, o levantamento identificou que um grupo de dez usinas pesou mais, sendo responsável por 63% dos gases de efeito estufa —metade delas usam carvão mineral e as outras cinco, gás natural.

As quatro maiores emissoras estão na região Sul. A líder foi Candiota 3, no município gaúcho de Candiota, que sozinha foi responsável por 12,1% das emissões.

Na sequência vieram as térmicas de Santa Catarina, Jorge Lacerda 4, com 8,9% das emissões e Jorge Lacerda 3, com 7,1%, ambas no município de Capivari de Baixo. Na sequência, Pampa Sul, também em Candiota, no Rio Grande do Sul, com 6,7% da liberação dos gases de efeito estufa.

Uma outra usina a carvão ficou na décima colocação desse ranking. Trata-se de Jorge Lacerda 1 e 2, localizada em Capivari de Baixo, que foi responsável por 3,9% das liberações.

Existem projetos a carvão no Nordeste, mas eles só passaram por testes em 2022, e essa concentração de usinas a carvão em operação em municípios da região Sul fez com que esse subsistema fosse o maior emissor de gases de efeito estufa em 2022, com 40% do total, apesar de produzir apenas 24% da energia elétrica.

Essa fonte foi responsável pela geração de 6,9 TWh, 22% da base fóssil e 5 pontos percentuais a mais que em 2021.

O uso do carvão teve um outro efeito negativo nas emissões. Elevou a taxa média da liberação de gases de efeito estufa. O aumento proporcional do emprego de termelétricas a carvão contribuiu para o aumento de 9% na taxa de emissão média inventariada pelo estudo, que passou de 582 tCO2e por GWh (gigawatt-hora) em 2021 para 637 tCO2e por GWh em no ano passado

A expansão do no uso de carvão mineral no Brasil na produção de eletricidade vai na contra mão do mundo, que está banida essa alternativa, mas ocorre com apoio do Congresso Nacional, destacam os pesquisadores. A Lei 14.299/2022, por exemplo, prolongou o prazo para a concessão de subsídios ao carvão e a vida útil de usinas que utilizam esse mineral até 2040.

As usinas de gás têm outra geografia. Apesar de os projetos estarem espalhados pelo país, há uma concentração na região Norte.

No ranking das dez mais, a Termorio, um projeto de cogeração com vapor que fica em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, ocupa a quinta posição com 6,5% das emissões. Na sequência, Mauá 3, que emitiu 5,1% do total, está em Manaus, no Amazonas. A usina Maranhão 3, por sua vez, está localizada em Santo Antônio dos Lopes, no Maranhão, e emitiu 4,3% do total.

Outra usina que tem cogeração com gás e vapor, a Termobahia, em São Francisco do Conde , na Bahia, emitiu 4% do total, o mesmo volume do conjunto Parnaíba 1 e Parnaíba 5, em Santo Antônio dos Lopes, no Maranhão. Elas estão, respectivamente, em oitavo e nono lugar.

A pesquisadora Raíssa Gomes, que também esteve à frente do levantamento, destaca que, apesar da farta oferta de energias renováveis, novas usinas a gás entraram no sistema no ano passado. Trata-se parte dos projetos do PSC (Procedimento Simplificado de Contratação), leilão criado em caráter de emergência como tentativa de resposta à crise hídrica de 2021.

O peso do gás na matriz de energia elétrica subiu de 72% para 75% de 2021 para 2022.

Novos projetos ainda podem ser agregados, caso se cumpra a risca a Lei de Privatização da Eletrobras, que prevê a construção obrigatória de 8 GW (gigawatts) de térmicas a gás em diferentes pontos do Brasil.

"A indústria, especialmente em setores como o químico e o de fertilizantes, viu na geração de energia elétrica uma forma de alavancar o uso do gás, e isso está sendo uma política de governo", diz André Luis Ferreira, diretor-executivo do Iema.

"Mas aumentar o uso de gás no setor elétrico é um retrocesso, não apenas por questões ambientais, mas também no que se refere a custos para o consumidor."

O inventário do Iema desta ano também traz o ranking de emissão por empresas.

Do total, 75% das emissões no ano passado foram de responsabilidade de quatro empresas: a estatal Petrobras (22%), a recentemente privatizada Eletrobras (21%), o Fram Capital Energy (20%), um fundo de investimentos, e a Eneva (11%), que tem relevante atuação em geração, exploração e produção de petróleo e gás natural.

No ranking das dez mais, também estão Engie (7%),que tem negócios em geração, comercialização e transmissão de energia elétrica de diferentes fontes, mas atua também no transporte de gás, Ceiba Energy (3%), a francesa EDP, Électricité de France (3%), J&F Investimentos (2%,), mais conhecida por ser a controladora da JBS, maior empresa de carnes do mundo, o banco BTG (2%) e Termo Norte Energia (2%), que possui empreendimentos com diferentes combustíveis fósseis.

Esse conjunto de empresas foi responsável por 94% das emissões de 2022, o que equivale a mais de 18 milhões de toneladas de gases de efeito estufa emitidas.

Há, no entanto, uma movimentação acionária no setor.

A Engie se desfez da usina de carvão Pampa Sul, seu último ativo de geração com fonte fóssil. A transação foi concluída em maio deste ano. Os compradores foram os fundos de investimento em participações Grafito e Perfin Space X, geridos pelas empresas Starboard e Perfin, respectivamente.

A Eletrobras, por sua vez, em 7 de setembro deste ano, concluiu a venda do complexo termoelétrico de Candiota para o grupo Âmbar, braço de energia da J&F. A empresa afirmou que o negócio está no plano estratégico da companhia dentro da simplificação da estrutura, mas também da busca por redução de emissões de gases de efeito estufa. A meta é net zero em 2030.

"A redução dessas térmicas fósseis na geração de energia elétrica passa por um conjunto de iniciativas, como rediscutir o modelo de uso de fontes renováveis, o papel das baterias e do hidrogênio na geração de eletricidade, mas principalmente pela não contratação nos projetos de térmicas com combustíveis fósseis", afirma Ferreira.

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