Indígenas rompem com grupo de trabalho sobre a Ferrogrão

Em carta ao Ministério dos Transportes, manifestantes afirmam que não foram ouvidos nas discussões

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Reuters

Grupos indígenas que consideram a construção da Ferrogrão, ferrovia para transportar grãos até porto na Amazônia, como uma ameaça às suas terras ancestrais se retiraram nesta segunda-feira (29) de um grupo de trabalho criado pelo governo no ano passado para avançar o projeto.

Os povos munduruku e kayapó, ao lado de povos do Xingu, disseram em uma carta ao Ministério dos Transportes que o grupo de trabalho não estava fazendo o seu trabalho de discutir a ferrovia Ferrogrão, de 1.000 km, com todas as partes envolvidas.

Procurados pela reportagem da Reuters, o ministério não respondeu a um pedido de comentário. A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e a empresa pública de infraestrutura, Infra S.A., responsável pelo projeto, também não se manifestaram até o momento.

Homem segura cartaz que diz: trilhos da destruição, ferrogrão não, com um símbolo de caveira; atrás dele há um edifício e uma bandeira do Brasil em um mastro
Cacique munduruku Juarez Saw em protesto contra a Ferrogrão, em Brasília, nesta segunda (29) - Adriano Machado/Reuters

O plano da Ferrogrão é apoiado por agricultores e comerciantes de grãos que afirmam que ela reduziria a dependência em estradas e diminuiria os custos do transporte de soja de Mato Grosso aos portos fluviais na bacia amazônica para exportação. Comunidades indígenas dizem que não foram consultadas sobre um projeto que afetará seu meio ambiente e levará ao desmatamento.

O STF (Supremo Tribunal Federal) suspendeu o plano no ano passado, aguardando mais estudos sobre o impacto da ferrovia polêmica.

"Não está tendo respeito. Está sendo plantado mais soja para exportar à Europa e à China. Não tem diálogo, não tem consulta", disse Alessandra Munduruku, vencedora do prêmio ambiental Goldman, em 2023, pelos seus esforços para interromper o desenvolvimento da mineração na Amazônia.

"O governo tem preguiça de fazer consultas. Eles querem tudo na mão para construir mais rápido em nosso território", disse ela à Reuters, do lado de fora do ministério.

Em sua carta ao ministro dos Transportes, comunidades indígenas afirmaram que os estudos foram feitos sem envolvimento do grupo de trabalho, ou discussões com ele, e que a ANTT já decidiu seguir em frente e abrir licitações para a construção da ferrovia.

"A partir de hoje, não mais participaremos do grupo. Não mediremos esforços para barrar esses trilhos de destruição", diz a carta.

A ferrovia deve elevar o desmatamento na região e afetar 16 terras indígenas, destacam os manifestantes, e "tudo isso para aumentar os lucros de grandes empresas transnacionais exportadoras de soja e milho".

O governo argumenta que a ferrovia ajudaria a proteger a região, ao reduzir o tráfego pesado em uma estrada que liga os mesmos pontos, e diminuiria o uso de combustíveis fósseis em caminhões.

Sydney Possuelo, principal especialista do Brasil em povos indígenas isolados, avalia que a ferrovia é "dos males o menor" porque traria menos pessoas de fora do que uma rodovia aprimorada em uma região que já é foco de grileiros, garimpeiros e madeireiros.

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