Coluna é assinada pelo jornalista e tradutor Daniel de Mesquita Benevides.
Clássico de Nova Orleans merece ser bebido ao som de Louis Armstrong
O hurricane, que leva rum e sucos, é um dos coquetéis com mais receitas diferentes que existem
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
Um filme mediano ainda pode dar um caldo —alguma cena específica, o reflexo de uma época, uma boa interpretação, o humor involuntário, a trilha sonora. "O Queridinho das Titias" ("Naughty but Nice", no caso, algo como "danado, mas bom menino"), comédia hollywoodiana de 1939, tem um pouco de cada.
Conta as desventuras de um professor de música careta e abstêmio (o cantor Dick Powell), que se envolve com uma letrista de canções populares e acaba virando um astro do swing, ritmo da moda, que abomina.
Com sua gravata borboleta e óculos redondos, o acadêmico, simpático mesmo quando tenta manter a pose altiva, vai a Nova York para promover sua sinfonia. Numa confusão típica das comédias malucas da época, ele acaba vendendo a composição para uma editora comercial —alterada, ela se torna um sucesso na voz sedutora de Ann Sheridan, uma das grandes pin-ups do cinema.
Para celebrar o hit inesperado, vão a uma casa noturna, ele, a letrista, o editor (o já insuportável Ronald Reagan) e a tia festeira em cuja casa ele está hospedado. Ela é o oposto exato de suas irmãs Cajazeiras, responsáveis pela criação carola do professor.
Pedem brandy com soda, bourbon com gelo, um hurricane (a tia) e limonada para o sóbrio sobrinho. Acontece que o hurricane, coquetel criado naquele ano, num bar nova-iorquino de mesmo nome, tinha então a aparência de uma limonada inocente.
Evidentemente, o garçom, com seu cabelo vesgo, repartido ao meio, faz a troca. Brindam. A tia dá um gole e cheira o copo com indignação: "O cara que preparou isso deve fazer parte de alguma liga de abstêmios." Já o compositor, virgem dos sabores alcoólicos, experimenta sua mistura, faz uma cômica careta de satisfação, e sentencia: "Refrescante! Garçom! Outro desse, por favor."
Ao receber o novo pedido, o barman comenta, de trás do balcão: "Espero que ele esteja com seu RG, no caso de explodir". De fato, é o que acontece. Mal recebe a segunda poção, já pede outra. Dessa vez o barman liga para uma ambulância, ao mesmo tempo em que prepara o coquetel arrasa-quarteirão.
Com tanto incentivo goela abaixo, o contido professor sai dançando loucamente e acaba pendurado no lustre, para alegria dos paparazzi. Passa de nice a naughty com entusiasmo insuperável. A tia, antecipando em décadas a famosa frase de "Harry e Sally", grita para o garçom: "Quero uma limonada dessas também!"
O hurricane é um dos coquetéis com mais receitas diferentes que já vi. Provavelmente, a poderosa limonada de Powell continha conhaque, vodca e absinto. Não é de estranhar o efeito. Mas o hurricane que hoje vende milhões no vieux carré (antigo quarteirão) de Nova Orleans é uma criação de Pat O'Brien, nos anos 1940. Seu salão, sobrevivente da clandestinidade, tem a própria marca de hurricane em pó ou engarrafado.
O queridinho das tias precisaria de alguns para acompanhar a música local, de Louis Armstrong e Irma Thomas aos Meters e Neville Brothers. No filme, um invejoso coloca fósforos acesos em seu sapato e ele, de novo, transforma a casa noturna num vendaval, superando os jovens no frenesi do jitterbug inventado no Harlem.
Laissez le bon temps rouler!
HURRICANE
- 60 ml de rum dourado
- 60 ml de rum branco
- 60 ml de suco de maracujá (sem açúcar)
- 30 ml de suco de laranja
- 15 ml de suco de limão
- 20 ml de xarope de açúcar (1:1)
- 10 ml de grenadine
Passo a passo
Bata os ingredientes com gelo e despeje todo o conteúdo numa taça hurricane. Decore com uma cereja e uma fatia de laranja.
Receba notícias da Folha
Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber
Ativar newsletters