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Jornalista especializada em diversidade, escreve sobre quem vive às margens nada plácidas do Ipiranga, da América Latina e de outras paragens

'Simone Biles' mostra elíptico caminho de conquista da própria humanidade

Documentário mostra o redemoinho de emoções que a ginasta norte-americana precisou dominar

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"Não é o fato de penteá-la. É tocá-la, é poder estar junto sem dizer muito." Assim explica a avó-mãe da ginasta norte-americana Simone Biles por que procura sempre trançar os cabelos da neta-filha e por que nos fatídicos Jogos Olímpicos de Tóquio, onde não esteve por conta da Covid-19, muitas coisas (incluindo detalhes aparentemente invisíveis como esses) não pareciam bem.

Simone Biles e seu marido, Jonathan Owens, jogador de futebol americano, na série 'O Retorno de Simone Biles', da Netflix - Reprodução

A cena é uma das mais comoventes de "O retorno de Simone Biles", série documental em exibição na Netflix que recupera a ascensão e queda da até então vencedora de sete medalhas olímpicas após um colapso mental em 2021 que a fez se retirar da competição no Japão antes do final, e no auge da carreira.

Simone Biles na final da ginástica artística por equipe, nesta terça; EUA levaram o ouro - AFP

Biles é a ginasta mais premiada de todos os tempos e sua decisão abriu debates em escala mundial sobre a necessidade de preservar a saúde mental dos atletas, para além da física, em ambientes de máxima competitividade. Também trouxe à baila com mais força os abusos sexuais denunciados por Biles e outras mais de 130 ginastas contra o médico da equipe de ginástica artística norte-americana Lawrence Nassar.

"Um sistema inteiro permitiu que seu abuso se perpetuasse", disse Biles ao Senado também em 2021, ao lado de colegas que indicaram graves negligências nas investigações do crime por instituições como o FBI e o Comitê Olímpico dos Estados Unidos. Nassar foi condenado a 175 anos de prisão.

O marido da ginasta, suas companheiras de treino e seu treinador, jornalistas especializados, psicólogos e ex-campeãs olímpicas ajudam a contextualizar elementos-chave que levaram a norte-americana a uma desconexão entre mente e corpo que poderia ter sido fatal em Tóquio. São os temidos "twisties" —perda de controle corporal e de noção do espaço, um fantasma onipresente entre ginastas das mais distintas gerações e que levou a atleta a dois anos sabáticos longe de competições.

Biles alinhava tudo isso a um olhar sereno e acrescenta outros fatores que estilhaçaram sua (auto)imagem de máquina implacável de vencer. Por exemplo, a pressão das redes sociais e dos meios de comunicação, que em vários casos responderam com crueldade ao não cumprimento de expectativas no Japão.

Nos momentos imediatamente após os deslizes da ginasta nas provas, a hoje dona de 37 medalhas em vários campeonatos foi sonoramente criticada por "abandonar" a equipe, como se por obra de um capricho fosse.

No documentário, o ritmo vertiginoso dos treinamentos; o brilho dos uniformes, em conjunto com a juventude das competidoras e seus rostos de apreensão; os gritos da arquibancada; o redemoinho de emoções que Biles precisou dominar a cada passo evocam a atmosfera feérica e pesadelar de um Coliseu. Não importa o que aconteça, nem a que custo, o show não pode parar.

Biles foi criada pelos avós depois que seus pais perderam a guarda dos filhos por abuso de drogas e álcool. Os profundos traumas da infância e adolescência, a intensa dedicação ao esporte, o bloqueio mental em Tóquio a levaram a tatuar na clavícula "Ainda assim eu me levanto", título do célebre poema de Maya Angelou.

Aos 27 anos e frente a um novo desafio olímpico, a atleta quer provar a si mesma que, sim, se levanta, com novas e incomparáveis habilidades.

Assim como os movimentos batizados com seu nome e que marcaram um antes e um depois na ginástica artística, o superpoder que busca agora é o equilíbrio interior para além das barras assimétricas.

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