Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e Pequim.
Encontros sigilosos refletem pressões de Biden por mudanças no Oriente Médio
Reuniões entre sauditas e iranianos mostram como funciona diplomacia secreta na região
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O teatro da diplomacia no Oriente Médio testemunhou recentemente a revelação de duas iniciativas secretas. Sauditas e iranianos, arqui-inimigos regionais, reuniram-se em abril no Iraque, e, na semana passada, líderes dos aliados Israel e Jordânia dialogaram no palácio presidencial do país árabe.
Vazamentos da “diplomacia secreta” pela mídia internacional permitem identificar a busca de acomodação à era Joe Biden em dois capítulos do cenário médio-oriental.
Enquanto Donald Trump priorizava a “pressão máxima” sobre o Irã e minimizava a importância do diálogo com jordanianos e palestinos, o atual governo americano aposta em uma agenda destinada a ampliar negociações e a baixar a sempre alta tensão política regional.
Trump investiu na aproximação entre Israel e monarquias árabes conservadoras do golfo Pérsico, lideradas pela Arábia Saudita, como ferramenta para enfrentar a teocracia iraniana. Biden manterá a opção, mas com importantes flexibilizações: tentativa de retomada do pacto nuclear com Irã, recuperação de diálogo com lideranças palestinas moderadas e pressão por mudanças em estratégias sauditas.
E os encontros sigilosos dos últimos meses refletem tais mudanças. Bagdá, capital do Iraque, recebeu emissários de Riad e Teerã, cujas relações diplomáticas foram rompidas em 2016. Os dois países protagonizam disputa histórica por liderança no Oriente Médio, pois a Arábia Saudita capitaneia o mundo árabe e sunita, enquanto o Irã simboliza o nacionalismo persa e a vertente xiita do islamismo.
Sauditas e iranianos mergulham em batalhas por esferas de influência, apoiando lados antagônicos nos conflitos políticos ou militares em palcos como Iraque, Síria e Líbano. A rivalidade contamina também o cenário palestino, com apoio de Teerã ao fundamentalismo do Hamas, e monarquias do golfo Pérsico apostando em lideranças dispostas a dialogar com Israel.
O antagonismo saudita-iraniano se reflete na tragédia da guerra do Iêmen, conflito responsável pela morte de mais de 233 mil pessoas e por ondas de fome e destruição. Enquanto Teerã despeja apoio aos rebeldes houthis, Riad encabeça a aliança militar em auxílio ao governo iemenita.
A Casa Branca pressiona pelo fim da catástrofe no Iêmen. E a Arábia Saudita, em busca de acomodação com o aliado norte-americano, sentou-se à mesa com o rival Irã, que procura, via diplomacia, recursos financeiros para enfrentar sua dramática crise econômica. O próximo episódio do diálogo saudita-iraniano deve ocorrer em Omã, ainda sem data definida. E longe do sigilo diplomático da fase anterior.
Mas uma cortina de fumaça envolveu a conversa entre o primeiro-ministro de Israel, Naftali Bennett, e o rei jordaniano, Abdullah. O diálogo coloca a Jordânia, praticamente ignorada por Trump, de novo no epicentro da diplomacia do Oriente Médio.
Biden e Bennett concordam sobre a importância do país árabe para a estabilidade regional, devido a sua posição geográfica, perfil demográfico e liderança religiosa. A monarquia abriga relevante população de origem palestina, guarda laços fundamentais com locais sagrados para o islamismo em Jerusalém e compartilha fronteiras com cenários de conflitos, como Síria e Iraque.
Abdullah viaja aos EUA no dia 19, para se reunir com Biden, poucos meses após enfrentar crise doméstica descrita como tentativa de derrubá-lo do poder. A Casa Branca oferece luminoso apoio ao monarca, primeiro líder árabe a ser recebido com pompa e circunstância em Washington.
E longe das sombras da diplomacia secreta.
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