Siga a folha

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

Carol Solberg só pôs para fora o sentimento de dezenas de milhões de brasileiros

Aos atletas brasileiros a mudez só não basta. Alguns querem calar os que falam

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

“A gente não nasce negro, a gente se torna negro. É uma conquista dura, cruel e que se desenvolve pela vida da gente afora. Aí entra a questão da identidade que você vai construindo. Essa identidade negra não é uma coisa pronta, acabada. Então, para mim, uma pessoa negra que tem consciência de sua negritude está na luta contra o racismo. As outras são mulatas, marrons, pardas etc”, já dizia, em 1988, a antropóloga, filósofa, escritora e feminista Lélia Gonzalez (1935-1994).

Troque negro por cidadão e dará no mesmo, apenas que em vez de mulatas, marrons ou pardas, serão pessoas de segunda classe, submissas, acovardadas.

Para a Comissão de Atletas do vôlei de praia da Confederação Brasileira de Vôlei, Carol Solberg não deveria ter soltado o seu “Fora Bolsonaro!” em entrevista à SporTV.

Fez, assim, coro à própria CBV.

Se a CBV perdeu ótima chance de ficar calada, pior agiu a Comissão, presidida pelo campeão olímpico Emanuel Rego, candidato à vice-presidência numa das inconfiáveis chapas que disputam o poder no Comitê Olímpico Brasileiro.

Rego parece fazer campanha para ser Carlos Nuzman, de triste passado e futuro sombrio.

Ou tem João Havelange como exemplo, que dizia ser apolítico para praticar a pior das políticas e andar de braço dado com ditadores sul-americanos, africanos e asiáticos.

Negar ao atleta o direito de se manifestar politicamente é condená-lo a abdicar da cidadania, prática tão a gosto da elite brasileira, que há mais de 500 anos busca submeter os excluídos a ensino de terceira.

Pelo menos, em apreciação modesta das pesquisas, um terço da população quer ver o presidente da República pelas costas, cansado de vê-lo negar a democracia, a pandemia, as queimadas, a orientação sexual e o racismo.

Carol Solberg, filha da campeã mundial Isabel Salgado, também crítica permanente dos desmandos de Nuzman e a quem a história deu inteira razão, só pôs para fora o sentimento de dezenas de milhões de brasileiros.

Por que ela não pode?

É militar da ativa?

Faz parte do Poder Judiciário?

Estes, não que sejam de segunda classe, ao optarem por carreiras poderosas devem guardar para si opiniões sobre os governantes.

Mas, atletas?

Vá o senhor Rego dizer isso na NBA, ainda mais depois de ter servido ao atual desgoverno que o demitiu por conta de críticas feitas pela senadora Leila Barros, mulher dele.

Mais do mesmo, como se vê.

Uma vergonha!

A jogadora de vôlei de praia Carol Solberg se manifestou contra o presidente Jair Bolsonaro - Divulgação/CBV

Até porque, além da Constituição de 1988, que garante a liberdade de manifestação em seu artigo 5º, a própria Carta Olímpica é explícita ao dizer, no artigo 50, que o atleta tem o direito de se expressar livremente tanto na zona mista quanto em entrevistas.

Este texto, originalmente publicado em meu blog, sem os acréscimos do últimos parágrafos, é reproduzido aqui devido ao silêncio quase geral dos atletas brasileiros, incapazes de manifestar solidariedade ou garantir o sagrado direito de expressão.

E não se trata de exigir heroísmo com pescoço alheio, atitude deplorável de quem desconhece os limites de cada um.

Trata-se de pedir um mínimo de altivez, que não faz mal a ninguém, independentemente de preferências políticas.

Para que, hoje e amanhã, todos possam apoiar o governante de plantão, velho hábito da cartolagem sem espinha dorsal e bajuladora, além dos atletas despersonalizados.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas