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Economista, ex-presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005, governo Lula)

Solaria

Em tempos de distanciamento social, a literatura, mesmo a descompromissada, é bem melhor do que assistir ao presidente

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Nada como uma história despretensiosa que antecipa um mau momento.

A praga atual convida alguns a sugerir romances admiráveis, como "A Peste", de Albert Camus, "O Deserto dos Tártaros", de Dino Buzzati, ou "À Espera dos Bárbaros", de J. M. Coetzee, que ecoa o poema homônimo de Konstantinos Kaváfis.

Não se espere nada tão sofisticado desta coluna. São tempos de miudezas em meio ao desastre conduzido por um presidente que parece não saber o que faz.

"O Sol Desvelado" é o segundo livro da trilogia de Isaac Asimov sobre um policial precipitado e atrapalhado, ainda que bem-intencionado. Um romance ligeiro de banca de jornal.

A Terra estava sufocada por excesso de gente havia muito tempo, o que levara alguns a imigrar para outros planetas. Algo compreensível, afinal, a balbúrdia da aglomeração e dos conflitos pode ser insuportável.

O surpreendente é tão raro na vida quanto nos folhetins, e, já em meados do século passado, a possibilidade de máquinas substituírem o trabalho humano era tema corriqueiro.

Os terráqueos, conflagrados pelo excesso de gente, rejeitavam os robôs. Os colonizadores de planetas, no entanto, os adotavam para cuidar dos afazeres mundanos e proibiam novos imigrantes.

O planeta Solaria foi o último a ser colonizado, levando ao extremo a opção de utilizar robôs e evitar a proximidade social. As pessoas moravam a centenas de quilômetros de distância umas das outras e se falavam por meio de videoconferências tão impecáveis que pareciam estar lado a lado. Para elas, era insuportável compartilhar fisicamente o mesmo ambiente.

Naquele mundo de violência improvável, no entanto, houve um assassinato. Para investigar o crime, nada melhor do que convidar um terráqueo, que convive com gente e sabe das suas vilezas.

A parte divertida do livro é o contraste entre o detetive gregário de uma Terra atrasada e o mundo com as tecnologias mais modernas que rejeita a proximidade humana.

Em tempos de distanciamento social, alguma histeria e muito oportunismo, a literatura, mesmo a descompromissada, é bem melhor do que assistir ao presidente e ao seu entorno disfuncional.

A sociedade testemunha, abismada, a gestão atabalhoada de um governo que não entende a diferença entre ciência e pensamento mágico.

O Brasil atual redime a ficção científica e transforma qualquer Asimov em Shakespeare.

A calamidade empilha suas vítimas. Alguns perdem o emprego e temem pela família em dificuldades.

Outros perdem a vida e são enterrados sem a despedida próxima das pessoas queridas.

A dor em demasia torna compreensível perder a paciência com a insensatez dos despreparados.

Esta coluna é dedicada ao casal Josiane Motta e Hélio Schwartsman.

Josiane é médica intensivista, isolou a família no sítio de Ibiúna e foi cuidar das vítimas da pandemia. Contraiu o vírus, que não é um “resfriadinho”.

Hélio sabe de ciência e de ética. Aprendo mais com suas colunas curtas do que com muitos livros.

Para esses meus amigos, medicina e responsabilidade não são temas abstratos.

Hélio devora qualquer coisa, menos ficção científica ou as admoestações dos insensatos.

Erramos: o texto foi alterado

Versão anterior da coluna de Marcos Lisboa deste domingo (19) foi publicada por engano sem a frase que abre o texto - "Nada como uma história despretensiosa que antecipa um mau momento."

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