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Pesquisador associado do Insper, é organizador do livro 'Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil'

Antes de gastar mais com investimento público, precisamos aprender com erros do passado

Para não desperdiçarmos recursos, temos que colocar racionalidade, prioridades, regras claras e contratos decentes

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Uma das propostas para dinamizar a economia no pós-pandemia é aumentar os investimentos públicos. Abre-se exceção a essa despesa nas regras de controle de gastos e, com mais estradas, portos, ferrovias e habitações, o país cresce, gera renda e paga o custo das obras.

A ideia é tão tentadora que já foi usada várias vezes: Programa Brasil em Ação (1996), Avança Brasil (2000), Programa Prioritário de Investimento –PPI (2005) e PAC (2007). Nas duas últimas versões, veio aditivado pela possibilidade de não computar as despesas dos programas no cálculo do resultado primário.

Nenhum desses planos foi capaz de entregar a revolução que prometeram, e continuamos muito atrasados na infraestrutura. O mais recente, PAC, deixou como legado inúmeras obras inacabadas e inviáveis, além de desmoralizar o resultado primário e a dívida líquida como indicadores fiscais, por adotar mecanismos criativos para mascarar o crescimento da despesa e da dívida.

O primeiro parágrafo da introdução de um manual do Banco Mundial sobre boas práticas em investimentos públicos descreve com clareza o problema da estratégia de abrir “espaço fiscal” para esses investimentos: “esse argumento é frequentemente fragilizado pela evidência de baixa eficiência dos investimentos públicos em várias dimensões: fraco mecanismo de seleção de projetos, incluindo os desperdícios com elefantes brancos; atrasos nos projetos e conclusões das obras; corrupção nas licitações; extrapolação dos custos projetados; obras inacabadas; incapacidade de operar e fazer manutenção dos ativos, de modo que os benefícios para a população resultam menores que os estimados”.

O caso brasileiro aí se encaixa perfeitamente. Antes de gastar mais, precisamos aprender com os erros do passado e superar os gargalos institucionais.

Nossos projetos de engenharia são muito ruins, porque são contratados pela lei de licitações, à base do menor preço. Em todo o mundo são poucas as boas empresas especializadas nesses projetos, e elas deveriam ser previamente certificadas para disputar os contratos no Brasil, como se faz nos principais países.

Uma iniciativa nessa direção, contida na MP 882, caducou. O projeto de revisão da lei de licitações, aprovado na Câmara, e que prevê modalidades inovadoras, como a contratação integrada, está parado no Senado.

Não temos um ritual para selecionar os investimentos prioritários. O Plano Plurianual é um inútil rol de todas as obras possíveis. O Senado aprovou um projeto de lei que propõe a definição de prioridades por meio de um banco de projetos, mas ele está parado na Câmara.

A aprovação da PEC do orçamento impositivo piorou a situação ao aumentar a despesa obrigatória com emendas parlamentares, em sua maioria investimentos que pulverizam e desperdiçam recursos.

Temos problemas com as regras de licenciamento ambiental (cujo PL está parado na Câmara), de restrições a participação de estrangeiros nas licitações, de ativismo dos órgãos de controle.

Adotamos modalidades de contrato de concessão que estimulam os parceiros privados a fazer a parte lucrativa da obra e abandoná-la na hora de fazer a parcela não lucrativa, ou a jogar o custo de serviços superfaturados sobre o parceiro público.

Não é de espantar que o TCU aponte que 47% das obras paralisadas têm como causa problemas técnicos e 23% por abandono pela empresa. Só 10% estão paradas por falta de recursos.

É sintomático que os símbolos da pretendida nova arrancada da infraestrutura sejam duas ferrovias herdadas do PAC. Em uma delas o TCU questiona a viabilidade econômica e aponta ausência de orçamento e projeto executivo adequados. A outra é uma ligação de uma mina de ferro a um porto que ainda não existe, e que será construído dentro de reserva de mata atlântica, gerando disputa judicial: grande chance de os trilhos chegarem e o porto não estar lá.

Antes de desperdiçarmos novamente recursos públicos, temos que colocar racionalidade, prioridades, regras claras e contratos decentes. Oxalá o novo marco do saneamento seja um sucesso e inaugure reformas na direção certa.

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