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Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

Descrição de chapéu mudança climática

Por que os republicanos se voltaram contra o meio ambiente

Partido Republicano associou política ambiental à guerra cultural, impulsionada por questões de raça e etnia

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Em 1990, o Congresso dos Estados Unidos aprovou uma emenda à Lei do Ar Limpo de 1970, que, entre outras coisas, adotava medidas contra a chuva ácida, a poluição urbana e o ozônio.

A legislação foi muito bem-sucedida, reduzindo enormemente a poluição por um custo muito menor do que os grupos de interesse empresarial haviam previsto. Às vezes vejo pessoas tentando usar a chuva ácida como um exemplo de alarmismo ambiental –era um grande problema na década de 1980, mas hoje quase ninguém fala sobre isso. Porém, a razão pela qual não falamos a respeito é que as políticas resolveram a maior parte do problema.

O que é realmente impressionante da perspectiva de hoje, porém, é o fato de que a legislação de 1990 foi aprovada no Congresso com maioria esmagadora e bipartidária. Entre os que votaram "sim" estava um senador de primeiro mandato de Kentucky chamado Mitch McConnell.

Conferência de Ação Política Conservadora em Dallas, Texas - Shelby Tauber - 6.ago.2022/Reuters

Isso foi naquela época. Agora é assim: a Lei de Redução da Inflação –que, apesar do nome, é principalmente uma lei climática com uma ajuda paralela à reforma da saúde– não recebeu um único voto republicano. Ora, a LRI não é um plano esquerdista para inserir o grande governo na vida de todos: não coage os americanos a se tornarem verdes; ela conta com subsídios para promover tecnologias de baixa emissão, provavelmente criando muitos novos empregos. Então, por que a oposição de terra arrasada do Partido Republicano?

A resposta imediata é que o Partido Republicano se tornou fortemente antiambiental ao longo do tempo. Mas por quê?

Estudos do Centro de Pesquisas Pew mostram a crescente divisão partidária sobre a política ambiental. Na década de 1990, os que se identificavam como republicanas ou democratas não divergiam tanto em suas opiniões ambientais: os republicanos eram menos propensos que os democratas a dizer que devíamos fazer o que fosse necessário para proteger o meio ambiente, e mais propensos a dizer que a regulamentação ambiental prejudica a economia, mas as diferenças eram relativamente moderadas.

Desde então, porém, essas fissuras se transformaram em abismos, e não de forma simétrica: os democratas tornaram-se um pouco mais favoráveis à ação ambiental, mas os republicanos tornaram-se muito menos favoráveis.

A maior parte da divergência é bastante recente, tendo ocorrido por volta de 2008. Não posso deixar de apontar que a tese republicana de que a proteção ambiental prejudica a economia disparou exatamente no período em que o progresso tecnológico revolucionário em energia renovável estava tornando as reduções de emissões mais baratas do que nunca.

Os eleitores republicanos podem estar seguindo as dicas de políticos e figuras da mídia. Então, por que os líderes de opinião conservadores se voltaram contra o meio ambiente?

Não se trata de fé nos mercados livres e oposição à intervenção do governo. Um dos aspectos mais marcantes das recentes disputas energéticas é a intensidade com que os republicanos tentaram usar o poder do Estado para promover fontes de energia poluentes, mesmo quando o setor privado prefere alternativas. O governo Trump tentou, sem sucesso, forçar as concessionárias de energia elétrica a continuar queimando carvão mesmo quando outras fontes de energia eram mais baratas. Atualmente, como noticiou o Times, muitos tesoureiros estaduais republicanos tentam punir os bancos e outras empresas que buscam reduzir as emissões de gases do efeito estufa.

E quanto à visão pessimista de que o Partido Republicano simplesmente está no bolso dos interesses dos combustíveis fósseis? Obviamente, o dinheiro fala e as contribuições do carvão e, em menor grau, do petróleo e do gás fluem principalmente para os republicanos. Mas a Lei de Redução da Inflação –que abrirá muitas oportunidades de negócios– foi endossada por várias grandes corporações, inclusive empresas de energia como BP e Shell. Os republicanos não se comoveram.

O que aconteceu, eu diria, é que a política ambiental foi capturada na guerra cultural –que, por sua vez, é em grande parte impulsionada por questões de raça e etnia. Suspeito que seja por isso que a divisão partidária sobre o meio ambiente se ampliou tanto depois que os Estados Unidos elegeram seu primeiro presidente negro.

Um aspecto especialmente notável da reportagem investigativa do Times sobre as empresas punidas pelos tesoureiros estaduais que buscam limitar as emissões de gases do efeito estufa é a maneira como essas autoridades condenam essas empresas como "conscientes" ("woke").

Ser "woke" normalmente significa falar sobre justiça racial e social. Na direita –que é cada vez mais definida por tentativas de limitar os direitos dos americanos que não são cristãos brancos heterossexuais– tornou-se um termo de abuso. Ensinar os alunos sobre o papel do racismo na história americana é ruim porque é "woke". Mas também, aparentemente, muitas outras coisas, como os restaurantes Cracker Barrel oferecerem salsicha sem carne e se preocuparem com as mudanças climáticas.

Isso talvez não faça muito sentido intelectualmente, mas você pode ver como funciona emocionalmente. Quem tende a se preocupar com o meio ambiente? Muitas vezes, pessoas que também se preocupam com a justiça social –ou isso, ou as elites globais. (A ciência climática é sobretudo um empreendimento global.)

Mesmo os republicanos mais esclarecidos não rompem com a posição anticientífica do partido. Como governador de Massachusetts, Mitt Romney tinha um histórico ambiental decente; ainda assim, ele se somou a todos os outros congressistas republicanos ao votar contra a Lei de Redução da Inflação.

​O que isso significa é que as pessoas que esperam iniciativas bipartidárias em relação ao clima provavelmente estão se iludindo. A proteção ambiental agora faz parte da guerra cultural, e nem detalhes de políticas nem argumentos racionais importam.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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