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Jornalista, comenta na Globo e é cofundadora do Dibradoras, canal sobre mulheres no esporte.

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Torcer para um time não faz do jornalista menos profissional

Paixão e a profissão na maioria das vezes andam juntas, mas não misturadas

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Toda conquista no futebol é feita de histórias. As histórias de como os(as) jogadores(as) chegaram até ali, dos desafios do(a) técnico(a) para fazer aquele time vencedor, da contribuição de funcionários do clube para aquele título... e, claro, dos torcedores.

O jornalista, entre outras coisas, é também um contador de histórias. Em cada pauta, busca personagens para contar uma história que, de certa forma, ele também está vivenciando. A gente busca sempre encontrar o tom certo para isso, um distanciamento, uma busca eterna por não sentir o que se está efetivamente sentindo e ser 100% razão, mesmo quando a emoção insiste em dar as caras.

No jornalismo esportivo, há ainda uma preocupação extra. Porque qualquer "deslize" de conduta pode levar a um pecado que aprendeu-se ser mortal para quem trabalha na área: permitir que descubram seu time do coração. Não existe uma regra formal determinada em Manuais de Redação (ao menos, não que eu saiba) que proíba jornalistas esportivos de revelar para quem torcem. Mas se convencionou a prática generalizada deste hábito: a partir do momento em que você começa a trabalhar com futebol, esconda o que o levou a trabalhar com futebol.

Torcedores do Atlético-MG lotaram o Mineirão na vitória sobre o Red Bull Bragantino - Douglas Magno - 5.dez.2021/AFP

As cenas emocionantes da apresentadora da ESPN Mariana Spinelli e do comentarista Mario Marra, ambos amigos da profissão, levaram-me de novo a uma reflexão que costumo fazer com frequência desde que comecei a trabalhar no jornalismo esportivo. Na cobertura do título histórico do Galo após 50 anos sem conquistar um Campeonato Brasileiro, os dois transpareceram sentimentos no ar. Sentimentos esses que eram compartilhados com milhões de atleticanos do país inteiro que acumularam histórias ao longo dessas décadas de longa espera até esse momento chegar.

Foi genuinamente bonito ver e se identificar com o choro deles. Não é só o(a) torcedor(a) do Galo que entende aquele choro. Somos todos nós que já sofremos, rimos e choramos com o nosso time, que construímos laços por causa dele, que vivemos a essência do futebol desde que fomos apresentados um dia ao clube do nosso coração. E acredite: todos nós temos um.

Torcer para um time não nos faz menos profissionais. E até nos faz mais parte daquilo que cobrimos. Por mais clichê que possa parecer, "não é só um jogo", e só quem já viveu o futebol sabe o sentimento por trás da obsessão pelo que acontece dentro daquelas quatro linhas.

Posto isso, não acho que todo jornalista esportivo tenha que revelar seu time. Mas o esforço para esconder me incomoda. Porque, no fundo, não deveria ser problema se descobrissem o clube para o qual torcemos. É simplista demais reduzir a análise de um jornalista sobre um determinado time dizendo que ele está sendo "clubista". É partir do pressuposto de que não há trabalho nenhum ali, que ele simplesmente diz coisas sobre um porque torce para outro. Se é assim, não precisa de jornalismo esportivo, uma conversa na mesa do bar vai ser mais útil.

Não é difícil separar as coisas. Responsabilidade, isenção, análise racional, mas sem esquecer os componentes emocionais do jogo, essas, sim, são regras básicas para o exercício da profissão. Confesso que já me preocupei mais em fazer de tudo para esconder meu time. Hoje, encaro isso com mais naturalidade. Ao torcedor interessado em saber, uma pesquisa no Google ou nas redes sociais trará fácil a resposta. Gosto de acreditar e insistir para que seja possível viver a paixão e a profissão –que na maioria das vezes andam juntas, mas não misturadas. E, se o sentimento transparecer, que seja de maneira genuína e por um motivo nobre, como foi com Marra e Spinelli.

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