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Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

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Estou preocupado com as pessoas que desejam que eu não me preocupe

Julgo que as únicas vezes que perdi a calma foi na sequência de apelos à calma

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Um dos aspectos mais difíceis de compreender no mundo atual é a profusão de livros, páginas de internet e serviços de profissionais de saúde mental que se destinam a ensinar as pessoas a não se preocuparem. Não se preocupar era, no meu tempo, uma operação que se efetuava sem qualquer esforço. Era tão fácil que não requeria aprendizagem.

As únicas pessoas que viviam uma vida livre de preocupações eram os idiotas, os ricos e os ricos idiotas —um grupo surpreendentemente vasto.

Havia, sim, a necessidade oposta de ensinar as pessoas a se preocuparem. Durante toda a minha infância e juventude, a minha avó se dedicou a tentar que eu deixasse de ser um idiota e passasse a me preocupar com as coisas. Quanto a conseguir que eu me preocupasse foi bem-sucedida; no projeto de evitar que eu fosse idiota teve menos êxito.

Neste momento, estou bastante preocupado com a quantidade de pessoas que desejam que eu não me preocupe. Uma rápida pesquisa no Google devolve milhões de resultados a quem procura deixar de se preocupar e nenhum a quem pretende se preocupar mais. Quem queira se inquietar não obtém ajuda. E quem quer deixar de se preocupar recebe auxílio de pessoas que, claramente, não se preocuparam em delinear um plano sensato e credível.

Há dois grandes grupos de teóricos da despreocupação: os que sugerem que a gente respire e os que apelam a que a gente se acalme. Os primeiros ignoram que a maneira mais rápida e fácil de ficarmos livres de todas as preocupações é, precisamente, deixar de respirar; os segundos desconhecem por completo a história. Nunca, em qualquer tempo ou lugar, alguém se acalmou por lhe terem sugerido que se acalmasse. O efeito costuma ser, aliás, agravar a irritação, normalmente porque quem apela à calma o faz com uma superioridade bonacheirona de quem teve uma ideia que, sendo excelente, era também óbvia e, mesmo assim, escapou-nos.

Julgo que as únicas vezes que perdi a calma foi na sequência de apelos à calma.

Ao mesmo tempo que se defende a fuga às preocupações, louva-se a sabedoria antiga, o que não faz sentido. Como creio que deixei claro, os antigos sabiam que: 1. As preocupações tinham várias vantagens; 2. A melhor maneira de aliviar temporariamente algumas preocupações não é com livros de autoajuda caros. É com duas garrafas de vinho barato.

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