A propósito dos 70 anos do reinado de Elizabeth 2ª, pus-me a pensar em todas as suas obras. Como não me ocorreu nenhuma, fui ver se algum jornal tinha publicado uma lista completa das suas façanhas.

Concluí que, ao longo de sete décadas, Elizabeth 2ª foi uma senhora que, basicamente, existiu. Pelo que faz sentido estarmos, no fundo, a celebrar o fato de continuar viva.

Todas as notas biográficas indicam, como pontos altos do seu reinado, o fato de ter casado, ter sido coroada, ter tido filhos, netos e bisnetos, ter tido vários outros jubileus antes deste.

O resto é descrito com verbos tais como "testemunhou", "visitou", "conheceu". Testemunhou vários acontecimentos que mudaram o curso do mundo, visitou mais de 90 países, conheceu 14 primeiros-ministros britânicos e 13 presidentes americanos.

Em 70 anos, contemplou, viajou e conviveu. Viveu adotando exatamente o mesmo comportamento que, segundo creio, se exige a quem visita o palácio de Buckingham: não mexer em nada, para não estragar.
Qualquer trabalhador que apresente este índice de produtividade não dura 70 minutos no seu posto de trabalho, quanto mais 70 anos.

"O que é que você fez este ano, Machado?"

"Gerei descendência, chefe."

"E no ano passado?"

"Fui ao México, aos Estados Unidos e à Suécia."

"Rua."

O sindicato dos monarcas deve ser muito forte.

Ainda mais impressionante do que a sua capacidade para não fazer nada é o talento para não dizer nada.
Não fazemos ideia nenhuma do que Elizabeth 2ª pensa sobre a política interna, ou sobre o brexit, ou até sobre feijoada.

Poder-se-ia pensar que talvez a rainha não tivesse muito tempo para influenciar os destinos do país por estar demasiado investida na família.

No entanto, o filho mais velho casou com uma mulher de que não gostava, e o caso acabou em tragédia.
Outro filho tinha amigos estranhos e protagonizou um escândalo relacionado com agressão sexual.

E um dos netos acusa a família de racismo. Tudo somado, tem sido um reinado excelente. Sobretudo, creio eu, para os partidários da república.