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Historiadora e jornalista especializada em América Latina, foi correspondente da Folha em Londres e em Buenos Aires, onde vive.

Descrição de chapéu América Latina

Petro tem pressa para aprovar reformas, mas cautela lhe cairia bem

Convocar povo às ruas como se fosse uma competição sobre quem tem mais apoio parece uma atitude infantil e perigosa

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Com sua hábil retórica, o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, fez um eloquente discurso no último dia 14 do terraço da Casa de Nariño, sede do governo, para pedir que a população saia às ruas para defender suas propostas de reforma nas áreas de saúde, trabalho e penal, enviadas ao Congresso nos últimos dias.

O primeiro desdobramento foi estimular uma disputa entre quem conseguiu reunir a maior mobilização. Os apoiadores do mandatário saíram às ruas do centro e lá ficaram até as primeiras horas da noite.

Pessoa segura imagem com o rosto de Gustavo Petro durante manifestação em apoio ao presidente da Colômbia na capital do país, Bogotá - Nathalia Angarita - 14.fev.23/Reuters

Enquanto isso, críticos de Petro, atiçados por opositores, como os congressistas María Fernanda Cabal e Miguel Polo-Polo, encheram os mesmos locais no dia seguinte —não há informações oficiais sobre qual ato reuniu mais gente, mas, segundo a imprensa colombiana, a multidão antipresidente foi maior.

De branco e com bandeiras da Colômbia, os manifestantes entoavam gritos de guerra pouco relacionados às reformas em si e mais à polarização política, como "não queremos uma ditadura cubana", e exibiam cartazes que fundiam as imagens de Petro e do ex-líder venezuelano Hugo Chávez.

Líderes moderados, como Sergio Fajardo, pediram que a disputa nas ruas de mais de 12 cidades do país fosse contida, porque "alimentava um radicalismo que não temos nem queremos ter na Colômbia".

O fato é que as reformas estão na agenda do Congresso, hoje de maioria favorável ao governo. Em linhas gerais, a proposta para a saúde quer fortalecer o sistema público e realizar auditorias nos privados, para buscar casos de corrupção e, eventualmente, pedir parte dos recursos para os mais pobres. Petro defende ainda que médicos tenham salários igualitários, independentemente do sistema em que trabalhem.

Outra proposta que tem causado debate é uma revisão do Código Penal e da definição de delito na lei. Petro, desde a campanha eleitoral, defende tentar esvaziar as superlotadas prisões colombianas.

Para tal, propõe indultos a crimes menores. Saltou aos olhos e pipocou nas redes sociais, porém, que um deles seria o incesto, e mesmo que o governo tenha dito que são ínfimos os casos de presos por esse crime, a turma contrária à "ideologia de gênero" já diz por aí que Petro é a favor de "sexo entre familiares".

A proposta em si ofereceria penas mais baixas a crimes menores (que não envolvam homicídio, tortura, extorsão e sequestro) e cujas penas poderiam ser trocadas por trabalhos comunitários.

Várias pesquisas têm mostrado queda de apoio a Petro, algo comum entre novos governos na América Latina. A tese dos "100 dias de trégua" parece cair por terra em tempos tão desafiadores e com as redes sociais acelerando cobranças. O fato é que a lua de mel dos colombianos com Petro vem se desgastando.

Segundo o instituto Datexco, 44% dos entrevistados têm uma imagem positiva do presidente. Não é uma cifra preocupante, mas, menos de um ano desde sua eleição, o governo tem de ficar de olhos abertos.

Petro tem margem para, eventualmente, aprovar suas principais propostas no Parlamento. Mas convocar o povo às ruas, como se fosse uma competição sobre quem tem mais apoio, parece uma atitude infantil, populista e perigosa, ainda mais num país com histórico de confrontos e massacres que vão do mundo do futebol ao narcotráfico e que coleciona tragédias sangrentas no passado. Serenidade e precaução cairiam bem ao líder colombiano, assim como respeitar o tempo do Congresso sem inflamar a opinião pública.

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