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Violência e política fazem fabricante da arma do caso Marielle parar de vender ao Brasil

Alemã HK justifica interrupção ao ser questionada por ativistas em reunião de acionistas

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São Paulo

A alemã HK (Heckler & Koch), uma das principais fabricantes de armas do mundo, decidiu parar de exportar para o Brasil devido às mudanças políticas sob Jair Bolsonaro e à "dura operação policial contra a população".

Policial francês manipula uma submetralhadora de fabricação alemã HK UMP 9mm - Geoffroy van der Hasselt - 11.jul.2020/AFP

A HK fornece fuzis e submetralhadoras para diversas forças no Brasil, como a Polícia Federal e as polícias do Rio. São armas de uso restrito, embora frequentemente surjam nas mãos de bandidos. Foi de uma submetralhadora HK MP5 que partiram os sete tiros que mataram a vereadora Marielle Franco (PSOL-Rio) e seu motorista em 2018.

A decisão foi confirmada na quinta (27), durante assembleia geral anual da empresa, a pedido da Associação dos Acionistas Críticos.

A entidade ativista alemã compra ações de diversas empresas no país e participa de assembleias para fazer questionamentos e recolher dados sobre práticas que considera antiéticas.

Em relação ao Brasil, além de armas, a associação monitora a venda de pesticidas e a relação com projetos vistos como danosos ao ambiente e procura expor colaboração de empresas alemãs com a ditadura de 1964.

Em 2019, o presidente da empresa, Jens Bodo Koch, havia dito que a HK não forneceria mais armas ao Brasil, mas sem explicar o motivo.

Segundo disse à Folha Christian Russau, membro da diretoria da associação, na reunião deste ano a pergunta foi refeita questionando os critérios para a interrupção.

"O porta-voz afirmou: 'Com as mudanças no Brasil, especialmente a agitação política de antes das eleições presidenciais e a dura ação da polícia contra a população, foi confirmada a decisão'", relatou Russau.

Submetralhadora alemã HK MP5, a arma usada para matar a vereadora Marielle Franco - Reprodução

Sociológo e jornalista, o ativista divulgou a história em seu blog neste domingo (30). A Folha procurou, sem sucesso, uma posição da HK. Segundo o site da rede alemã Deutsche Welle afirmou nesta segunda, a empresa nunca comenta seus negócios.

A opacidade, aponta o canal, está no governo alemão também. Não há dados sobre exportação detalhado por empresas. A Alemanha é a quarta maior exportadora de armas do mundo, segundo o Sipri (Instituto Internacional para Pesquisas da Paz de Estocolmo), na conta que inclui sistemas bélicos de todo tipo.

Em 2019, o país bateu seu recorde histórico, exportando € 8 bilhões (R$ 52 bilhões nesta segunda). Pelo passado militarista alemão, o tema é um grande tabu no país. Entidades pressionam fabricantes a serem mais transparentes em seus negócios, e muitas empresas terceirizam sua produção no exterior.

É o caso da SIG Sauer, cuja filial norte-americana opera a pleno vapor, enquanto sua matriz alemã anunciou o fechamento de sua linha de produção.

A associação com ditaduras ou países com péssimo histórico na área de direitos humanos, como é o caso do Brasil, também pesa. O caso Marielle teve enorme repercussão na Europa, e era uma questão de tempo que o questionamento da relação com a arma alemã gerasse alguma reação.

Bolsonaro promove uma política explícita de flexibilização das regras para dar à população mais acesso a armas veio em seguida. Russau qualifica em artigos o presidente brasileiro como extremista de direita, rótulo que tem forte ressonância no país berço do nazismo.

O presidente e seus filhos são notórios entusiastas do uso de armas. No vídeo da famosa reunião ministerial de 22 de abril, Bolsonaro fala em armar a população como um seguro contra ditadores.

Seu filho Eduardo, deputado federal pelo PSL-SP, faz campanha por fabricantes estrangeiros —sua ação em favor da SIG Sauer, que busca associar-se ao Exército, gerou mal-estar entre setores militares.

Além de polêmicas portarias acerca da posse de armas e munições, o governo federal quer também incentivar a compra de armas no exterior, longe da fiscalização do Tribunal de Contas da União e do regramento da Lei de Licitações.

A ideia do Ministério da Justiça é fazer as compras para a PF, Polícia Rodoviária Federal e estados conveniados a partir da estrutura da Comissão do Exército Brasileiro em Washington. A alegação é a redução de custos de aquisição e melhor qualidade dos produtos.

Isso, aliado a uma portaria do Exército do dia 18 de agosto que permitiu a estrangeiros vender suas armas no país com uma moratória de dois anos nos testes de qualidade dos produtos, gerou grande contrariedade também na indústria nacional, como a Folha mostrou na quinta.

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