Siga a folha

Descrição de chapéu Leonardo da Vinci, 500

Depois da Broadway e de paródias gays, brasileiro faz musical sobre Da Vinci

Adrian Steinway prepara espetáculo 'Leonardo, o Musical', na Itália

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Fiesole (Itália)

No palco de uma semiarena romana que data do século 3º a.C., na periferia de Florença, parece haver mais gente e menos silêncio em cena do que o razoável faltando só uma hora para a estreia.

Atores, músicos, bailarinos, equipe de criação e técnicos fazem os últimos ajustes antes da primeira apresentação de “Leonardo, o Musical”, colagem de episódios da vida do filho ilustre da terra, Leonardo Da Vinci, cuja morte completa cinco séculos neste ano.

O compositor das canções e diretor da montagem é o brasileiro Adrian Steinway, 40, que nos recebe em 
trajes estivais (faz calor neste começo de noite de julho na Itália) —camiseta, bermuda jeans e havaianas.
“Gente, isso nada mais é do que um workshop, OK?”, ele avisa, logo de saída.

Workshop é uma etapa intermediária na construção de um espetáculo, normalmente ainda sem luz, cenários e figurinos completos. Na encenação em questão, o texto também ainda não era o definitivo.

Em conversa nos bastidores, Steinway diz que fez “teatro de guerrilha” neste que é seu sexto trabalho.

Abandonado pela orquestra que acompanharia o elenco (foi trocado, ele diz, pelo evento de um político que financia a formação), teve de improvisar com um grupo de jovens na faixa dos 15 anos. Os ensaios anunciavam uma massa sonora caótica; o desempenho na estreia, ainda que imperfeito, ficou longe disso.

Em sua ala dramática, a produção mistura atores de uma respeitada companhia de Amalfi com dois herdeiros do clã Ferragamo (sim, o da grife) —ele como Lorenzo de Médici, ela como Lisa Gherardini, a Mona Lisa— que talvez tivessem desempenho mais robusto como, digamos, modelos para as telas do pintor de que trata o espetáculo.

“Os atores aqui [na Itália] são heróis, não têm apoio nenhum”, diz o diretor. “No Brasil, temos as leis [de 
incentivo com base em renúncia fiscal]. Na América, a indústria. Aqui, as coisas só funcionam com política.”

Ele fala com algum conhecimento de causa. Filho de taiwanês-americano com ítalo-judia, ele estudou teatro na Universidade de Nova York e iniciou por lá sua carreira, sob os auspícios de figuras como Julie Taymor, a cineasta e encenadora responsável por montagens célebres da Broadway nos últimos 20 anos, como “O Rei Leão” e “A Flauta Mágica”.

Atualmente, Steinway capitaneia nos Estados Unidos o espetáculo “Tiger Boy”, adaptação de um conto do uruguaio Horacio Quiroga, ainda em fase de workshop, e “Haroun”, transposição para a cena do infantojuvenil homônimo de Salman Rushdie.

No Brasil, montou em Salvador, em meados desta década, os besteiróis musicais “Éramos Gays” (com o coreógrafo da série americana “Glee”, ele frisa) e “Bocket Show”, o primeiro um sobrevoo da história da representação da homossexualidade, o segundo um chiste inspirado na era de ouro do rádio.

Também assinou as músicas do infantil “O Palhaço e a Bailarina”, em 2016, antes de trazer ao país sua primeira criação com elenco italiano, “Apocalypse Now – O Fim do Mundo para Leigos”, uma tentativa de reavivar a commedia dell’arte, cujas máscaras e arquétipos (arlequim, colombina, doutor, amantes, velho) hoje são considerados anacrônicos em sua terra natal.

Steinway encarna ele mesmo uma espécie de arlequim, o personagem que serve ao mesmo tempo a dois patrões, fazendo malabarismos para acomodar demandas e caprichos de lado a lado.

Isso porque, durante o ano letivo, ele está à frente do Laboratório de Redação, cursinho de escrita com unidades em quatro cidades paulistas, 600 alunos e uma coleção de notas máximas no Enem e em vestibulares como a Fuvest.

“Uso os meses de férias para pôr os espetáculos de pé, mas também faço muito bate-volta de São Paulo para Estados Unidos ou Europa no fim de semana”, afirma, sobre a logística complicada da vida dupla —na sala de aula, ele é Adriano Chan. “A tecnologia ajuda muito a fazer o trabalho à distância. E tenho dois ou três assistentes in loco, além de um diretor musical.”

Foi como uma extensão das atividades em sala de aula —quase como um experimento paradidático— que ele levou à cena “Pasárgada”, em 2006, a partir da poesia de Bandeira, sua estreia como diretor principal.
“Os meninos me prepararam para lidar com os artistas, mostraram que angústias e anseios vão além da questão técnica, formal”, observa.

Nas próximas férias do cursinho, no começo do ano que vem, Steinway planeja “levantar” a versão brasileira, com o cantor Pedro Camargo Mariano liderando um elenco para o qual ele também cobiça uma cantora “do calibre de uma Sandy”.

No Brasil como na Itália de Da Vinci, o diretor vê lacunas na produção de dramaturgia. “Não faltam escritores, mas sim mais autores que pensem a palavra como ação teatral”, aponta. “Quem se interessa hoje por texto dramatúrgico está indo para a TV fazer série. Os palcos estão ficando órfãos.”

Nos Estados Unidos, ele pondera, sempre temperando a fala com expressões em inglês, “o wake-up call 
[despertar] já aconteceu”.

“Desprezou-se por algum tempo a palavra em cena, mas agora muito roteirista está vindo para a dramaturgia. Basta olhar a temporada atual da Broadway.”

O arlequim Adrian, ou Adriano, talvez possa chamar alguns de seus alunos nota dez para reforçar as 
fileiras dramatúrgicas.

O jornalista viajou a convite da produção

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas