Sem identificar obras, artista propõe retrospectiva diferente na Pinacoteca
Fernanda Gomes revê 30 anos de produção que quer ensinar pessoas a ver
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Apesar de integrar um programa da Pinacoteca dedicado a nomes que expandiram o conceito de escultura —uma seleção que foi dos seres maleáveis e teias de crochê de Ernesto Neto a Marepe—, é difícil classificar dessa forma os trabalhos que Fernanda Gomes exibe no museu agora.
Suas peças têm um caráter instalativo e se relacionam de maneira íntima com o espaço que ocupam e entre si.
Também parece estranho chamar o conjunto que se estende por sete salas do museu de retrospectiva.
Apesar de reunir obras dos 30 anos de carreira da carioca —uma monotipia que ela fez em 1973, aos 12 anos, se infiltra entre elas—, elas não têm plaquinhas de identificação ou títulos, uma prática que Gomes adota desde o início de sua trajetória.
O que vemos no museu são, assim, conjuntos de obras fragmentárias, peças que são ora objetos garimpados (bancos, louças, pedras), ora "assemblages" delicadas, sempre em tons de branco e da madeira natural de que são feitas.
Amontoados no centro do grande corredor que corresponde ao espaço expositivo, os itens se tornam cada vez mais rarefeitos à medida que se caminha em direção aos cantos.
Muitos deles foram produzidos ao longo dos 21 dias em que a artista se instalou no museu, sobre cavaletes que devem continuar numa sala mesmo depois da abertura.
Uma rebeldia sutil que pode ajudar a entender sua obra.
Contemporânea da chamada Geração 80, de artistas que, como Beatriz Milhazes, Daniel Senise e Leda Catunda, retomaram uma pintura gestual, expressiva, depois do reinado da arte conceitual, a carioca diz se sentir mais próxima da linguagem das décadas anteriores, de Artur Barrio e de Cildo Meireles.
Sua produção vai na contramão de espetacularização e excesso. Caminha em direção a uma economia de gestos e de materiais que o crítico Paulo Venâncio definiu como "design às avessas", uma recusa ao mesmo tempo do consumismo e do apelo pop.
Isso, aliado ao caráter conceitual do trabalho, pode ajudar a explicar a circulação limitada de Gomes no Brasil.
Embora tenha participado de mostras importantes aqui e lá fora, entre elas a Bienal de Veneza, e tenha sido tema de publicações como Art News e Artforum, ela diz expôr pouco fora do Rio de Janeiro, onde mora, e São Paulo, local da galeria que a representa, a Luisa Strina. Nos últimos anos, sua obra tem circulado sobretudo na Europa.
"Meus interesses estão cada vez mais anacrônicos", diz. "Hoje as pessoas veem o que querem ver, e não o que estão vendo. Se há uma tomada numa sala de exposição, fingem não vê-la. Eu não consigo."
Se transformar essa percepção não é exatamente um objetivo de Gomes no ateliê —"no pico da criação, você não pensa em nada", diz— sua obra convida os visitantes a explorarem os cantos, descobrirem variações de luz, traçarem relações.
"Tudo é exercício. Se nos dedicarmos a ver, vemos melhor."
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