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Livro de Brecht é manual de sobrevivência em tempos obscurantistas

'Bertolt Brecht: Poesia' reúne poemas, fragmentos de diários e anotações autobiográficas do autor militante alemão

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Bertolt Brecht: Poesia

Avaliação:
  • Preço: R$ 89,90 (584 págs.)
  • Autoria: Bertolt Brecht
  • Editora: Perspectiva
  • Tradução: André Vallias

Se fosse vivo, Walter Benjamin indicaria “Bertolt Brecht: Poesia” como um antídoto de indignação contra o ano que findou e um libelo de coragem para o que se anuncia. Com tradução, introdução, notas e projeto gráfico do poeta e designer André Vallias, o livro reúne 300 poemas, fragmentos de diários, anotações autobiográficas e textos sobre poesia do autor militante alemão.

Após “Heine, Hein?”, Vallias nos brinda com os versos de quem deu “a volta ao mundo em um único exílio”, passou por três guerras (as mundiais e a Fria), criou o efeito de distanciamento e fez do teatro sua razão dialética de vida. Para o tradutor, “não dá para separar poesia e dramaturgia, tampouco prosa e filosofia, da atividade poética de Brecht —tudo está interligado num grande projeto pedagógico e interveniente”.

Um dos motivos a cativá-lo foi “o fato de que a inovação em Brecht se concentra no eixo da pragmática, ou seja, na relação do signo com seu contexto e uso”. O tradutor aponta ainda sua singularidade: “É um poeta que não está sob a égide de Apolo nem de Dionísio, mas de Hermes: o ‘trickster’ do panteão grego, divindade criadora tanto da lira quanto da escrita; protetora dos poetas e pensadores, dos diplomatas e tradutores, dos comerciantes e ladrões”.

O escritor e dramaturgo alemão Bertolt Brecht - Reprodução

Inédito até 2017, “WB”, de 1941, é traduzido por Vallias: “Mesmo a mudança das/ estações do ano/ rememorada a tempo/ deveria tê-lo/ detido”.

Segundo o tradutor-designer, Brecht “inventou o fotoepigrama no livro ‘ABC da Guerra’ (1955), editando recortes de jornal com poemas”. É um método afinado ao atlas de Aby Warburg e aos cinejornais de Dziga Vertov. Num achado da diagramação deste “Brecht: Poesia”, a foto da mina de ouro cava entre as “Elegias Hollywoodianas”, compostas pelo “pobre Brecht” quando criava com Fritz Lang o argumento de “Os Carrascos Também Morrem” (1943).

Em “O Desprezo” dirigido por Godard em 1963, Lang recita uma delas para Brigitte Bardot: “Toda manhã, para ganhar meu pão”. No papel de si mesmo, é o diretor humanista que filma “Odisseia” para o bruto produtor Jack Palance. Este, ao ouvir a palavra cultura, saca o talão de cheque —não o revólver, como Goebbels, que ofereceu a Lang o comando do cinema alemão e fez o diretor fugir do país em 1933.

Para Vallias, traduzir e ler Brecht hoje é “debruçar-se sobre as estratégias de reprocessamento do grande acervo das linguagens e pensar a criação como intervenção transformadora no presente”. O tradutor-poeta cita: “A verdade só pode ser difundida com astúcia”. E avalia: “Vamos precisar aprender muito com Brecht para sobrevivermos na era do capitalismo de vigilância”.

Pela propriedade poética e política, este livro é um manual de sobrevivência para a sanidade sensível e pensante em tempos obscurantistas. 

Atual, Brecht aposta: “A injustiça avança hoje a passos firmes [...] / Assim como está, não vai ficar”.
Vallias repara que “Brecht e seus personagens só fumavam charutos Brasil”, que vinham de Irará, na Bahia, onde nasceu Tom Zé, “o mais brechtiano dos tropicalistas”.

Em “Bargan Deixa pra Lá – Uma História de Filibusteiros” (1921), conto com ousado lance homoerótico entre piratas, ele anota: “Tão desgraçadamente abrupto que Deus desviou a sua face para longe, a fim de ver a colheita no Brasil”. Então Brecht volta o rosto para a terra devastada, em réplica ao desafio do poema “Mau Tempo para a Poesia” (1939), e nos lembra: charutos não se tragam.

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