Um governo que forjou o próprio lema a partir de uma interpretação torturada do versículo que diz "conhecereis a verdade e a verdade vos libertará" parece muito seguro do seu apego ao conhecimento, certo? Bem, os fatos depõem contra.

O governo começou a semana decretando a morte do Censo. Pensam que é por acaso que o mesmo governo que estrangula o jornalismo e insulta jornalistas, faz abertamente campanha contra o STF, parou de financiar a ciência e ataca as universidades foi o primeiro que teve coragem de matar o Censo?

Não. É mais uma ofensiva típica do ceticismo mal-intencionado. O conhecimento, a ciência e a informação foram declarados inimigos. O governo e o movimento bolsonarista não são contra o conhecimento em geral, porém, apenas têm horror ao conhecimento científico, à informação jornalística e à interpretação autorizada da lei (pelo STF, claro), uma vez que são produzidos pelos "outros", os adversários que os cercam e que na sua fantasia persecutória possuem o controle sobre a definição do que é a verdade e de como se chega a ela.

Uma das grandes incógnitas desses novos tempos, quando estamos afogando em fake news e narrativas de complôs, em que todas as instâncias que lidam com o conhecimento são desafiadas pela extrema direita, é entender por que as pessoas mais engajadas preferem a informação proveniente de militantes e líderes da sua facção, mesmo que plausivelmente falsas e infundadas, em vez daquela assegurada por professores, cientistas, jornalistas e intelectuais independentes?

As respostas, a meu ver, são duas. 1. Para o bolsonarismo, ninguém é independente, as universidades, o jornalismo e a ciência foram ocupados pelo "comunismo e o globalismo" e tudo está dominado. O STF também. 2. Não há informação imparcial ou independente, só se pode confiar nos líderes tribais que compartilham as suas convicções. É assim que a política se converte em seita e a verdade vira questão de fé e revelação.