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Vinicius Carrasco

Bancos e fintechs devem ter a mesma regulação financeira? NÃO

Aplicar normas idênticas às instituições de pagamento pode ter efeito indireto

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Vinicius Carrasco

Sócio e economista-chefe da StoneCo e professor do Departamento de Economia da PUC-RJ

Um princípio basilar da regulação econômica é que atividades que ensejem riscos diferentes sejam tratadas de maneira diferente. Bancos criam liquidez ao se financiar por instrumentos de curtíssimo prazo —depósitos junto ao público ou recursos de outras instituições financeiras— e fazer empréstimos de longo prazo (ou deter ativos de maturidade mais longa).

Essa “transformação de maturidade” gera um risco evidente. Consideremos o caso de financiamento integral por meio depósitos: se todos os depositantes sacarem seus recursos ao mesmo tempo, o banco terá de vender os ativos que detém (por exemplo, sua carteira de crédito). Sendo ilíquidos, a venda se dará a desconto, e o banco não conseguirá honrar todos os depósitos. Portanto, independentemente da qualidade de seus ativos, um banco está sujeito a uma corrida bancária. Pior: essa corrida pode ter efeito sobre outros bancos. Financiamento por instrumentos de curto prazo junto a outras instituições gera riscos de interconexão entre os entes e potenciais efeitos dominó (vide a crise de 2008).

Esses riscos fazem com que: 1 - bancos centrais assumam a condição de emprestadores de última instância; 2 - tenha-se leniência quanto a fusões e aquisições que busquem estancar a possibilidade de risco sistêmico (vimos isso no Brasil durante a crise); e 3 - em casos extremos, para evitar contágio e implicações maiores para a economia, recursos do Tesouro sejam utilizados. Os três itens correspondem a alguma forma de subsídio à atuação dos bancos. Não menos importante é o potencial “moral hazard” (risco moral): cientes das possibilidades de resgate “ex post” (após o fato) e não internalizando os efeitos sobre o sistema e a sociedade de suas decisões, há incentivos a se tomar risco em excesso.

É isso que justifica a regulação prudencial “ex-ante” (antes do fato), envolvendo requerimentos de capital para que bancos absorvam perdas com recursos próprios e internalizem os efeitos de suas decisões (alinhando, assim, incentivos).

Por sua vez, a maior parte das fintechs se organiza como instituições de pagamento, que surgiram quando da abertura do mercado de maquininhas e, depois, como provedoras de contas de pagamento. Ambas atividades estão sujeitas a restrições regulatórias e legais que eliminam riscos similares aos gerados por bancos. No caso de contas de pagamento, os recursos estão apartados e devem ser alocados em títulos públicos (“narrow banking”).

No caso da maquininha, os recursos de uma transação só podem ser utilizados para se pagar o varejista. Não faz sentido algum, portanto, achar que essas atividades devam ser tratadas como a de intermediação bancária. Mais: em geral, quando o fazem, essas instituições dão crédito integralmente com recursos próprios (por meio de sociedades de crédito direto), não colocando recursos de depositantes em risco (não gerando corrida ou contágio).

Não há assimetria na regulação vigente no Brasil para pagamentos —similar à PSD2 (“payment services revised directive”, ou “diretiva revisada de serviços de pagamentos”) da Europa. Haveria se atividades com riscos distintos fossem tratadas da mesma forma pela regulação (a propósito: bancos podem sempre colocar todos os recursos de seus depositantes em títulos públicos e só emprestar com capital próprio).

De fato, aplicar a instituições de pagamento as regulações de banco pode ter o efeito indireto de aumentar riscos: tendo que incorrer no custo regulatório, instituições de pagamento, que não o farão, terão incentivos a virar bancos e transformar maturidade.

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