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Lira ironiza CPI e sinaliza que não dará sequência, por ora, a pedido de impeachment contra Bolsonaro

Presidente da Câmara afirma que impedimento como ação política não se faz com discurso, mas com materialidade

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Brasília

Poucas horas após a apresentação de um superpedido de impeachment contra Jair Bolsonaro, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sinalizou que, por enquanto, não vai dar sequência ao processo e que uma ação do tipo exige materialidade.

Lira falou na noite desta quarta-feira (30), ao deixar a Câmara dos Deputados. Mais cedo, oposição e movimentos sociais protocolaram o superpedido de impeachment, que reúne cerca de 120 ações em um só processo, apontando mais de 20 tipos de acusações.

O presidente da Câmara foi questionado sobre se rejeitaria ou analisaria o pedido apresentado nesta quarta. “Não será feito agora, né. Tem que esperar.”

“O que houve nesse superpedido? Uma compilação de tudo o que já existia nos outros e esses depoimentos. Depoimentos quem tem que apurar é a CPI. É para isso que ela existe. Então ao final dela a gente se posiciona aqui, porque na realidade o impeachment como ação política a gente não faz com discurso, a gente faz com materialidade.”

Lira disse ainda que antes de analisar o pedido apresentado nesta quarta “tem 120 na fila”. Questionado se vai seguir a ordem de ações apresentadas, respondeu: “Pode até ser.” Sobre se esperaria a CPI terminar, ele afirmou, em tom irônico, que sim. "Vou esperar a CPI, está fazendo um belíssimo trabalho, bem imparcial."

Com 271 páginas, o superpedido de impeachment é resultado de uma articulação de partidos de oposição a Bolsonaro e ex-aliados do presidente. Esse grupo reúne cerca de 140 deputados. Para eventual impeachment passar pela Câmara, são necessários 342 votos dos 513 deputados.

A denúncia do empresário Luiz Paulo Dominguetti Pereira, que afirmou ter recebido pedido de propina de US$ 1 por dose em troca de fechar contrato com o Ministério da Saúde, foi incluída como um pedido de investigação, mas não ainda como um suposto crime do presidente.

Na terça-feira (29), a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), indicou que o superpedido poderá futuramente ser ampliado para incluir a denúncia envolvendo a negociação de propina revelada pela Folha. “Podemos adendar a peça”, disse.

Dominguetti Pereira está no rol de testemunhas incluído na petição entregue à Câmara.

O superpedido é assinado por 46 pessoas, dentre representantes de centrais sindicais, movimentos sociais, deputados da oposição e de centro-direita, senadores de siglas de esquerda, o grupo Prerrogativas, que reúne advogados e juristas brasileiros e personalidades, entre outros.

No texto, os autores da ação lembram que, até esta quarta, já foram protocolados 122 denúncias de prática de crimes de responsabilidade junto à Câmara dos Deputados —seis delas foram arquivadas.

Além disso, acusam o presidente de crimes de responsabilidade contra o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário e dos Poderes constitucionais dos Estados, crimes contra o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais, contra a segurança interna e contra a probidade na administração, entre outros.

O CAMINHO DO IMPEACHMENT

  • O presidente da Câmara dos Deputados é o responsável por analisar pedidos de impeachment do presidente da República e encaminhá-los
  • O atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é aliado de Jair Bolsonaro. Ele pode decidir sozinho o destino dos pedidos e não tem prazo para fazê-lo
  • Nos casos encaminhados, o mérito da denúncia deve ser analisado por uma comissão especial e depois pelo plenário da Câmara. São necessários os votos de pelo menos 342 dos 513 deputados para autorizar o Senado a abrir o processo
  • Iniciado o processo pelo Senado, o presidente é afastado do cargo até a conclusão do julgamento e é substituído pelo vice. Se for condenado por pelo menos 54 dos 81 senadores, perde o mandato
  • Os sete presidentes eleitos após a redemocratização do país foram alvo de pedidos de impeachment. Dois foram processados e afastados: Fernando Collor (1992), que renunciou antes da decisão final do Senado, e Dilma Rousseff (2016)

O episódio envolvendo a compra de vacina da Covaxin é citado na peça. A existência de denúncias de irregularidades em torno da compra da vacina indiana foi revelada pela Folha no dia 18 de junho, com a divulgação do depoimento sigiloso ao MPF (Ministério Público Federal) do servidor Luis Ricardo Miranda, que é chefe da Divisão de Importação da Saúde

“No que se refere à Covid-19, após se notabilizar por uma atitude avessa à aquisição de vacinas e ao estímulo à sua aplicação, o presidente da República passou a ser envolvido em denúncias de conivência com negociações lesivas ao interesse público para a compra da vacina indiana Covaxin”, escrevem.

“Tais suposições devem ser objeto de apuração instrutória uma vez admitida e processada a presente denúncia sob a forma de processo de impeachment perante o Congresso Nacional.”

Segundo o documento, ao longo de 2020, “época estratégica para que fossem celebrados pré-contratos e contratos voltados a garantir o suprimento de vacinas à população brasileira, o presidente Jair Bolsonaro reiteradamente esquivou-se de adotar medidas concretas e tempestivas em resposta às ofertas de fabricantes de vacinas contra a doença, sobretudo as sucessivas mensagens emitidas pela laboratório Pfizer, que quedaram prolongadamente não respondidas, inclusive pelo gabinete presidencial.”

“Enquanto isso, em postura delirante e absolutamente temerária, o presidente da República priorizou, sem qualquer respaldo científico, o investimento na utilização de hidroxicloroquina, mediante propaganda pessoal, aliada ao irresponsável estímulo à determinação de uso e a distribuição de kits inadequados do chamado tratamento precoce, divulgada em site oficial, com efeitos desastrosos para os pacientes.”

Apesar do ciclo de desgaste político do presidente e da baixa tração nas pesquisas eleitorais de 2022, o centrão permanece disposto a barrar a iniciativa de opositores ao governo. A fissura nessa aliança traz mais riscos para Bolsonaro no projeto de ser reeleito.

O centrão é um consórcio de partidos que se juntou a Bolsonaro quando o Palácio do Planalto passou a liberar cargos de indicação política e pagamento de verbas das emendas ao Orçamento.

Por ora, está mantida a blindagem para que o atual mandato seja concluído. Além disso, com o desgaste provocado pelas denúncias envolvendo a negociação da Covaxin, a avaliação é que esse grupo ganhou ainda mais poder de barganha junto ao Executivo.

O presidente da Câmara dos Deputados é o responsável por analisar pedidos de impeachment do presidente da República e encaminhá-los.

Se o pedido for aceito, a denúncia é encaminhada a uma comissão especial e depois ao plenário da Casa. São necessários os votos de pelo menos 342 dos 513 deputados para o processo seguir para o Senado.

A próxima etapa seria uma votação para o Senado confirmar ou não a abertura da investigação. Se o processo for aberto na Casa, o presidente da República é afastado até a conclusão do julgamento e é substituído pelo vice.

ENTENDA O SUPERPEDIDO DE IMPEACHMENT

Alguns dos partidos e entidades que assinam o documento

  • PT
  • PDT
  • PSB
  • PCdoB
  • PSOL
  • ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia)
  • Coalizão Negra por Direitos
  • Ambientalistas, como Rafael Echeverria Lopes e Enilde Neres Martins
  • MBL (Movimento Brasil Livre)
  • Advogado Mauro Menezes, ex-presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República
  • Ex-aliados de Bolsonaro, como deputados Alexandre Frota (PSDB-SP) e Joice Hasselmann (PSL-SP)

Alguns dos crimes mencionados no pedido

  • Crime contra a existência política da União
    Ato: fomento ao conflito com outras nações
  • Crime contra o livre exercício dos Poderes
    Ato: ameaças ao Congresso, STF e interferência na PF
  • Tentar dissolver ou impedir o funcionamento do Congresso
    Ato: declarações do presidente e participação em manifestações antidemocráticas
  • Ameaça contra algum representante da nação para coagi-lo
    Ato: disse que teria que “sair na porrada” com senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), membro da CPI da Covid
  • Opor-se ao livre exercício do Poder Judiciário
    Ato: interferência na PF
  • Ameaça para constranger juiz
    Ato: ataques ao Supremo
  • Crime contra o livre exercício dos direitos políticos, individuais e sociais
    Ato: omissões e erros no combate à pandemia
  • Usar autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder
    Ato: trocas nas Forças Armadas e interferência na PF
  • Subverter ou tentar subverter a ordem política e social
    Ato: ameaça a instituições
  • Incitar militares a desobedecer a lei ou infração à disciplina
    Ato: ir a manifestação a favor da intervenção militar
  • Violar direitos sociais assegurados na Constituição
    Ato: omissões e erros no combate à pandemia
  • Crime contra a segurança interna do país
    Ato: omissões e erros no combate à pandemia
  • Permitir a infração de lei federal de ordem pública
    Ato: promover revolta contra o isolamento social na pandemia
  • Crime contra a probidade na administração
    Ato: gestão da pandemia e ataques ao processo eleitoral
  • Expedir ordens de forma contrária à Constituição
    Ato: trocas nas Forças Armadas
  • Proceder de modo incompatível com o decoro do cargo
    Ato: mentiras para obter vantagem política
  • Negligenciar a conservação do patrimônio nacional
    Ato: gestão financeira na pandemia e atrasos no atendimento das demandas dos estados e municípios na crise de saúde
  • Crime contra o cumprimento das decisões judiciárias
    Ato: não criar um plano de proteção a indígenas na pandemia
  • Blindar subordinados em caso de delitos
    Ato: não pediu investigação de suposta irregularidade na Covaxin

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