Andanças na metrópole

As camadas de história encobertas em construções, ruínas e paisagens

Andanças na metrópole - Vicente Vilardaga
Vicente Vilardaga

Túmulo de fundador da TFP no Cemitério da Consolação é venerado

Plínio de Oliveira, Antoninho Marmo e Maria Judith são os mortos mais cultuados

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São Paulo

Com a fama de museu a céu aberto e repleto de mortos ilustres, o Cemitério da Consolação virou um concorrido local de movimentação turística. Muita gente vai lá para conhecer o túmulo de Mário de Andrade, de Francisco Matarazzo, de Monteiro Lobato, de Tarsila do Amaral e de outros.

Mas existe um tipo de visitante mais cerimonioso que se dirige à necrópole para venerar alguns personagens do passado e expor sua devoção. Essas sepulturas costumam ter alguém por perto rezando ou refletindo quase todos os dias e suas flores estão sempre frescas.

É o caso do líder ultrarreacionário Plínio Corrêa de Oliveira, fundador da TFP (Socidade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade), do menino milagreiro Antoninho da Rocha Marmo e da dona de casa Maria Judith de Barros, cultuada pelos vestibulandos.

Plínio Corrêa de Oliveira
O túmulo do fundador da TFP, Plínio Corrêa de Oliveira, no Cemitério da Consolação - Vicente Vilardaga

Advogado, escritor e político, Plínio de Oliveira foi um católico hiperconservador e anticomunista que fundou a organização TFP. Esteve à frente da Marcha da Família com Deus pela Liberdade que apoiou o golpe militar e deu forte apoio à ditadura. Morreu em 3 de outubro de 1995 e sua memória ainda é venerada por milhares de seguidores. Visitar o cemitério é uma tarefa protocolar dos membros da entidade. Todo dia há por ali alguma figura soturna depositando flores.

O antigo braço direito de Oliveira e seu herdeiro espiritual, João Clá Dias, depois uma luta judicial de quatro anos, conseguiu o direito de usar a marca TFP e criou uma nova sociedade reacionária em 1999 chamada Arautos do Evangelho. Em 2001, ela foi reconhecida pelo Vaticano, no papado de João Paulo II, como uma associação católica.

Entre as obrigações dos membros da TFP e dos Arautos do Evangelho está a idolatria à imagem de Plínio e de sua mãe, Dona Lucília, enterrada ao lado do filho. Ambos são considerados pelos grupos como santos católicos. Já João Clá Dias é tratado por eles como um santo vivo. Os Arautos são acusados de manter escolas que tratam os alunos como escravos e de fazer lavagem cerebral em seus seguidores.

Antoninho da Rocha Marmo
Antigo túmulo do menino Antoninho, cujos restos mortais estão hoje em São José dos Campos - Vicente Vilardaga

Os jazigos de Antoninho e Maria Judith estão repletos de mensagens de agradecimentos pelas graças alcançadas. Antoninho é chamado de santo e seus restos mortais foram transferidos em 2021 para a capela Nossa Senhora da Saúde, no hospital que leva seu nome em São José dos Campos. O que resta no Cemitério da Consolação é apenas uma relíquia: um pedaço de tecido que cobria seu corpo. Mesmo assim, seu antigo túmulo continua atraindo inúmeros visitantes.

O menino morreu de tuberculose com 12 anos, em 21 de dezembro de 1930, e se atribuía a ele o dom de antecipar o futuro. Teria previsto a própria morte. Desde pequeno brincava de celebrar missas. Queria ser padre e foi se tratar da doença em São José dos Campos, onde propôs a criação de um sanatório para crianças pobres.

Desde 2007 há no Vaticano um processo de beatificação e canonização de Antoninho. São atribuídas curas milagrosas ao garoto. Além do hospital, Antoninho batiza um centro espírita em São Caetano do Sul.

Maria Judith de Barros
A sepultura de Maria Judith de Barros é repleta de placas de agradecimentos de estudantes - Vicente Vilardaga

Já Maria Judith de Barros padecia de uma doença degenerativa e sofria com a violência doméstica. Sua data de nascimento é desconhecida. Ela morreu em 26 de novembro de 1938 vítima das agressões do marido. O que se sabe sobre sua vida é que era dona de casa.

O que o guia do Cemitério da Consolação, Francivaldo Gomes, o Popó, conta é que logo depois da morte de Maria Judith, uma mulher que conhecia seu drama ajoelhou-se diante do túmulo e rezou. Algum tempo depois colocou uma primeira placa na sepultura pela graça alcançada.

A partir de 2001, o túmulo de Maria Judith passou a fazer parte das visitas guiadas no Cemitério da Consolação e cada vez mais alunos, sem qualquer explicação, passaram a pedir a ela a aprovação no vestibular. Maria Judith virou uma espécie de santa protetora dos vestibulandos e prestadores de concursos. Sua sepultura passou a ser procurada rotineiramente por estudantes e hoje está totalmente tomada por pequenas placas de agradecimento.

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