Jairo Marques

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O notório desconforto de quando a plateia vai ao palco

Enfrentamentos em relação a conceitos e abordagens que façam menção à diversidade são pertinentes, desde que todos possam exercer protagonismo

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Em uma entrevista recente, um desses comediantes que adoram falar que são polêmicos, disse, fora do palco e não usando suas credenciais profissionais, que, atualmente, "as vítimas têm tido razão demais".

O piadista fazia referência, principalmente, aos grupos de diversidade que, em sua visão, estariam reclamando inadvertidamente de comportamentos e atitudes —nem sempre tão discriminatórios, só um pouquinho—, e tendo adesão rápida de massas vindas e protegidas pelas redes sociais.

Para ele, há reclamação demais, sem estofo que justifique reações contrárias, e causando a geração de um enorme efeito "mimimi" e tolhendo a liberdade criativa, de expressão e até de convivência.

Achar que há uma grita acentuada por parte de grupos sociais historicamente silenciados tem sido comportamento cada vez mais frequente e importante de ser avaliado, uma vez que há nessa mentalidade a formação de um campo de conflito equivocado.

A questão posta é que quem nunca falou tem mostrado a voz, quem nunca esteve presente está puxando uma cadeira para se sentar, quem não era considerado, agora, pode até concorrer a vencedor.

Todas essas novidades de conceitos, falas, argumentos e necessidades de respirar provocam flagrante desconforto no rearranjar das realidades que estão postas.

Ceder lugar ao outro, rever uma postura ou um modo de falar, sem que isso seja entendido como uma desvantagem para si é exercício humano que só praticando muito se consegue notar a musculatura gerada em forma de equidade, de justiça social, de avanços humanos coletivos com reflexos e impactos contundentes.

Haver enfrentamentos em relação a conceitos e abordagens que remetam ao capacitismo —o preconceito contra a pessoa com deficiência—, ao racismo, ao etarismo e a todos os outros esgotos de exclusões criados e forjados com base em privilégios e ignorância é e sempre será pertinente. Vamos debater!

Mas escorrega-se para um campo autoritário e maniqueísta querer arrancar o direito do outro de externar suas dores, seus incômodos com o mundo, suas tentativas de mostrar desconforto com a maneira como se é notado e subrepresentado.

O processo de inclusão e de ampliação das oportunidades, tornando os ambientes mais plurais, ainda está decolando no mundo e taxiando no Brasil. Pressões para que se voe mais depressa ou que se desista do céu vão sempre acontecer e gerar torcidas apaixonadas.

Como se tratam de vidas, de pessoas, de sentimentos e de sensações não há manuais capazes de orientar completamente o processo, que exige escutas atentas e disponibilidade de pensar diferente e querer que seja diferente.

Ainda estamos no momento que uma pessoa trans estar no fenômeno televisivo Big Brother e poder expressar sua forma de ser e defender sua identidade é muito mais impactante e, talvez, importante, do que ela saber ganhar a competição, saber jogar aquela disputa.

Existe o momento de entrar na roda e o de fazer a ciranda, de entrar em campo e de chutar a bola, de ganhar o Oscar e ter a vez de falar contra as injustiças. Fundamental é não querer tolher as manifestações —legítimas— de busca por igualdade, por respeito e por representatividade. Fundamental é pensar duas vezes antes de avaliar que uma vítima está querendo chorar demais.

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