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Descrição de chapéu Dias Melhores

Pescador no Ceará salva tartarugas com a ajuda da lua e da maré

Aquiraz abriga 70 ninhos de espécie ao longo de 40 km de praia; trânsito irregular de turistas pode prejudicar filhotes

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Patricia Calderón
Aquiraz (CE)

Para a maioria dos trabalhadores, por volta das 9h, o dia só está começando. Para Maciano Silva Santos, 30, o Tiú, e o pai dele, José Fabiano dos Santos, 68, seu Neném, já é fim de expediente. Os dois são especialistas em rastrear ninhos de tartarugas, com o auxílio da lua e da maré.

Tiú e seu Neném são nativos da praia do Batoque, uma reserva extrativista, em área de preservação permanente de Aquiraz, a 40 quilômetros de Fortaleza. A cidade do litoral do Ceará protege mais de 70 ninhos de tartaruga-de-pente, espécie ameaçada.

Seu Neném conta que o apelido do filho caçula vem desde a infância, e faz referência a um lagarto brasileiro gigante que pode atingir dois metros de comprimento. "Ele consegue farejar novos ninhos de tartarugas de tanto ficar se rastejando por aí. Igualzinho a um lagarto gigante", brinca o pai.

pescador abaixado na areia em buraco como ovos de tartaruga
Maciano Santos, 30, o Tiú, mostra como as tartarugas trabalham com as nadadeiras para cavar o ninho em praia em Aquiraz, no Ceará - Patricia Calderon/Folhapress

Foi seguindo os passos do pai que o pescador aprendeu a observar as tartarugas marinhas, tanto vivas na água como as encalhadas na areia ou já mortas. "Comecei a prestar atenção nos rastros que a tartaruga adulta deixa na hora da desova, e como ela enterra os ovos", conta Tiú.

Ele, que hoje integra o projeto "Apremace - Amigos do Mar", perdeu as contas de quantas tartaruguinhas já viu nascer.

Para o idealizador do projeto Mariano Pereira, a ajuda do jovem pescador já colaborou para que mais de 6.000 tartarugas nascessem do ano passado até aqui. "Antes, nem 20% deste número sobrevivia, pelo impacto do trânsito irregular nas praias e porque não era possível demarcar e monitorar".

Em cada eclosão de ninho, que compreende no período de monitoramento de três meses, nascem cerca de 120 filhotes.

As ferramentas Tiú usa estão disponíveis na natureza: a maré, a lua e os rastros deixados na areia pelas fêmeas. "A lua me mostra a densidade da maré, e formato do rastro me aponta onde estão as "camas" de desova", conta.

Quando a tartaruga adulta cava o ninho, as nadadeiras ficam como que estampadas na areia, explica o pescador. "Quando os ovos são enterrados, os buracos cavados ficam parecendo uma espécie de "caminha", um montinho de areia fica formado. Pronto, é e lá que estão os ovos".

duas mulheres na praia medem uma tartaruga marinha
No projeto, as fêmeas são medidas e monitoradas; Aquiraz guarda 70 ninhos da espécie ao longo de 40 km de praia - Patricia Calderon/Folhapress

Em Aquiraz, os 70 ninhos se estendem por uma faixa de 40 km. O paraíso das tartarugas, porém, está ameaçado pela falta de fiscalização, segundo ativistas.

Há lixo descartado de forma irregular, além do trânsito irregular para as praias. "Infelizmente é uma realidade. Falta educação ambiental, falta fiscalização, um problema nas áreas de preservação. O tráfego de veículos irregular é frequente nas praias do Ceará", disse a oceanógrafa Malu Quevêdo Vilanova.

Um espaço que foi inaugurado pelo governo estadual, para cuidar das tartarugas machucadas, está inutilizado, segundo a oceanógrafa. "Os meninos não conseguem receber as tartarugas, porque não tem um veterinário no local, ninguém é remunerado. O Ceará não tem como receber as tartarugas. Quando encalham vivas, e precisam de uma reabilitação, são encaminhados para Mossoró, no Grande do Norte", diz.

Procurado sobre o trânsito irregular em praias, o Detran-CE (Departamento Estadual de Trânsito) afirmou que "realiza fiscalizações em todo o litoral cearense e de forma coordenada, para coibir o trânsito indevido de veículos, principalmente, na faixa de areia das praias frequentada por banhistas e demais pedestres".

A Semace (Superintendência Estadual de Meio Ambiente), em nota, afirmou que faz a fiscalização ambiental em todo o território cearense e que vai intensificar as ações na APA (Área de Preservação Permanente) do rio Pacoti, citada pela reportagem.

No caso da poluição sonora e do trânsito irregular de veículos aos finais de semana e períodos noturnos, o o batalhão de polícia ambiental informou que vai colaborar com a fiscalização. A ideia é atuar de forma mais direta, exercendo o controle de crimes ambientais.

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