A notícia da reabertura do bar Filial me pegou tão de jeito que eu saí compartilhando a novidade sem me dar ao trabalho de ler os termos do negócio. Cheguei até a escrever uma mensagem de felicitações para Ronen Altman, pai de um ex-colega do meu filho e antigo dono do boteco.
Foi o Ronen que me disse que ele e os irmãos não tocarão o bar em sua nova encarnação. O ponto na Vila Madalena e a marca foram repassados à Fábrica de Bares, grupo proprietário do Bar Brahma, do Bar Léo e do Riviera, entre outras casas.
Fiquei sem saber se continuava alegre ou se lamentava o fim desse ciclo. Sob a batuta dos quatro irmãos Altman, o Filial era um bar com personalidade única –algo que me parece impossível de ser recuperado na administração impessoal e nas consultorias múltiplas para os cardápios de comidas e bebidas.
O Filial foi meu bar preferido por uns bons dez anos. Era para lá que a minha turma –jornalistas, obviamente– ia depois do trabalho duas, três, quatro vezes por semana. Deixei o fígado e uma soma respeitável de dinheiro no Filial.
Eu mudei, a Vila Madalena mudou, só o Filial não mudou muito. Deixei de frequentá-lo, mas mantive o carinho e as boas lembranças. Será que elas resistem a uma visita ao bar sob nova direção? Estou com medo desse reencontro.
A transferência de bares em decadência para gestores mais competentes não é algo necessariamente ruim. Eu mesmo visitei e escrevi sobre pontos tradicionais do Rio que foram salvos dessa forma: Adonis (em Benfica), Nova Capela (na Lapa) e Adega da Velha (em Botafogo).
Mas dois motivos me fazem desconfiar da intervenção profissional no velho Filial.
Em primeiro lugar, ele não passou pelo excruciante processo de decadência e decrepitude. Havia perdido algo do encanto e da pujança, mas ainda era forte quando o fechamento forçado pela pandemia quebrou as pernas dos negócios dos irmãos Altman.
Segundo, o histórico de aquisições da Fábrica de Bares não me faz vislumbrar um futuro brilhante para o Filial. Léo, Brahma e Riviera são todos bares que frequentei na juventude com sede e entusiasmo. Eram lugares tradicionalíssimos de São Paulo; na gestão anônima da Fábrica, sobrevivem em modo anódino e desinteressante.
Riviera, Léo e Brahma seriam lendas da boemia paulistana se os tivessem deixado morrer dignamente. Foram reencarnados como arapucas para turistas. Receio que o legado do Filial também estaria melhor sem a ressurreição.
Espero estar errado em meu pressentimento. Darei uma chance ao novo Filial. Mas vou aguardar algumas semanas, até que o negócio se encaixe nos trilhos, para não fazer julgamento precipitado.
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