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É Logo Ali - Luiza Pastor
Luiza Pastor
Descrição de chapéu Todas escalada

Sucessores do apito, rastreadores por GPS oferecem soluções de resgate para (quase) todo tipo de perrengue

Equipamentos não são baratos, mas podem salvar a vida e a viagem de aventureiros

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Sabe qual é o primeiro equipamento de segurança que deve entrar em qualquer mochila, seja qual for o destino? Um apito. Tradicionalmente, é ele que permite ao trilheiro perdido ou acidentado alertar quem estiver pelas imediações de que um ser ali no mato ou em um buraco imperceptível precisa de algum tipo de socorro. Quanto mais ardido o apito, melhor.

O apito, como o exposto no Museu do Futebol, em São Paulo, é um dos mais antigos equipamentos de segurança para trilhas e montanhismo - Adriano Vizoni - 11.mai.18/Folhapress

Mas será que os deuses da tecnologia não inventaram algo mais sofisticado e com maior alcance do que esse singelo apito? Claro que sim. Desde que os satélites permitiram o desenvolvimento de aplicativos que se conectam com o espaço por GPS, têm pipocado diversos produtos que são verdadeiros anjos da guarda para aventureiros de todo o planeta.

Ainda em 1995, a fabricante suíça de relógios Breitling, marca tradicionalmente identificada com pilotos e navegadores abonados, lançou sua linha Emergency, que permitia ao usuário disparar por meio de uma pequena antena embutida, sinal de emergência para o serviço de apoio mais próximo. Pensado para casos de quedas de aeronaves e iates em apuros, o gadget nunca foi nem é barato: os modelos disponíveis no site da marca têm hoje preços variando de US$ 18 mil a US$ 23 mil ou R$ 88.740 a R$ 113.390 no câmbio da última terça-feira (5).

Relógio Breitling Emergency, com botão que aciona sinal de SOS por GPS
Relógio Breitling Emergency, com botão que aciona sinal de SOS por GPS - Reprodução do site da Breitling

Com a popularização dos aplicativos para smartphones, entretanto, passaram a estar disponíveis opções mais acessíveis ao bolso dos mochileiros. Os mais conhecidos são o Spot e o Garmin InReach.

O Spot, que tem cobertura mundial, contabiliza cerca de 50 mil equipamentos circulando no Brasil. Não que chegue perto dos mais de 120 mil utilizados nos Estados Unidos, país líder em seu uso, mas um número representativo do potencial do mercado local. Em todo o planeta, de janeiro a setembro deste ano, os sinais do Spot acionaram 325 pedidos de resgate, dos quais 27% em atividades de lazer (15% em atividades de escalada ou montanhismo, e 12% em atividades aquáticas) e o restante em contratos profissionais em atividades de risco, como conta Guilherme Abad, diretor de marketing para a América Latina da Globalstar, responsável pelo desenvolvimento do equipamento.

"Além dos esportistas, temos usuários corporativos, que são a maioria dos clientes, porque no Brasil a cultura outdoor ainda não é tão difundida se comparada com países da Europa ou com os Estados Unidos", aponta.

O Spot X, que permite enviar e receber mensagens além de rastrear a rota percorrida pelo usuário
O Spot X, que permite enviar e receber mensagens além de rastrear a rota percorrida pelo usuário - Reprodução do site da Spot

O Spot, que está no mercado desde 2005, tem três modelos básicos, dois para uso pessoal e outro, rastreador de ativos, para uso corporativo, como caminhões e entregas delicadas. Os de uso pessoal têm duas versões, uma mais simples, unidirecional, que só transmite e envia a posição do usuário e mensagens previamente definidas, e que custa R$ 749. E outra, a Spot X, que permite criar, enviar e receber mensagens e tem preço mais salgado, de R$ 1.699. Em ambos, em caso de emergência, a função SOS é ativada e segue para a coordenação do serviço, que aciona o resgate mais próximo do local. Nos planos básicos, a central do Spot nos Estados Unidos aciona o contato mais próximo fornecido pelo usuário, passando as coordenadas de sua localização. A assinatura do serviço inclui um pacote de 200 mensagens de SMS pelo valor de R$ 56. Os custos do resgate, entretanto, só são cobertos pelo plano Overwatch & Rescue, que exige assinatura anual —hoje em R$ 230.

"É aquele tipo de serviço que ninguém quer usar, mas que é um grande diferencial do equipamento", garante Abad.

Francisco Perez Chauás, organizador de corridas de aventura
Francisco Perez Chauás, organizador de corridas de aventura e usuário do Spot - Arquivo pessoal

Quem tem experiência com o produto é Francisco Perez Chauás, paulista de Santos que organiza corridas de aventura que exigem que cada participante tenha um aparelho da Spot, bem como a assinatura do serviço. "Corrida de aventura é um tipo de triatlo, só que dentro do mato", conta ele. "Todos os participantes de cada equipe precisam correr por trilhas, remar em rios, andar de mountain bike, fazer rapel, atravessar lagos e rios nadando, enfim, é uma corrida multiesportiva com várias distâncias e sem pausa, dia e noite direto", explica.

Chauás conta que, como o percurso não é demarcado nem é permitido usar GPS, os competidores devem se orientar à moda antiga, com mapa e bússola. "Foi numa prova de 300 quilômetros que uma das equipes errou o caminho e os quatro participantes passaram a noite toda perdidos, até que no dia seguinte, um sábado, às 15h, finalmente acionaram o botão de resgate do Spot", acrescenta.

Ao receber a mensagem do Spot em seu celular, Chauás acionou os bombeiros. Um mateiro da sua equipe acompanhou os resgatistas até o local, conferiu que pela dificuldade de acesso seria aconselhável chamar um helicóptero, e, como não havia ninguém machucado (talvez só no orgulho), o resgate foi completado às 15h do domingo.

O equipamento que salvou montanhista do veneno da jararaca

Criado em 2011, o serviço Garmin InReach opera por meio da rede Iridium, um conjunto de 66 satélites de baixa órbita que oferecem cobertura em todo o planeta, incluindo os polos norte e sul. A Iridium possui tradição em comunicação via satélite, com cerca de 320 mil assinantes que vão do Departamento de Defesa dos EUA a trilheiros como o engenheiro mineiro de Piedade de Paraopeba Lourenço Marquez.

Lourenço Marquez, montanhista e usuário de Garmin InReach
Lourenço Marquez, montanhista e usuário de Garmin InReach - Arquivo pessoal

"Uso o Garmin inReach com plano de mensagens ilimitadas e pago U$ 25 (R$ 124) mensais. Ele vem comigo sempre que estou em áreas remotas, ou seja, quase todo fim de semana", conta Marquez. "Como costumo ir para expedições em alta montanha, e fico até 2 semanas incomunicável, o utilizo para receber notícias da família e sempre dizer que está tudo bem, mesmo quando quase não está", acrescenta com uma boa risada.

Marquez, que usa o dispositivo que recebe e envia mensagens, considera importante ter alguém do outro lado passando a previsão do clima, "para decidir se é dia de cume ou hora de abortar a subida". Mas mesmo para caminhadas de um dia, se for em área remota onde celular não pega, ele gosta de ter o recurso à mão "para o caso de uma emergência que, felizmente, comigo nunca aconteceu".

Se ele até hoje saiu ileso, o mesmo não se deu com um amigo, do qual Marquez era marcado como contato de emergência. "Recebi um recado de que ele havia sido picado por uma jararaca, e além dos contatos de emergência já acionei os bombeiros". Como se trata de uma das espécies mais peçonhentas do continente, cada segundo contava e, mesmo com toda a agilidade da mobilização do resgate, em poucas horas o amigo já sofria de confusão mental, fortes dores, hemorragia e delírios. "Ele chegou a fazer vídeos se despedindo dos familiares, mas felizmente, ao chegar ao hospital em Itabira (MG), aplicaram o soro e começou a melhorar, mesmo tendo que ficar mais sete dias internado", lembra.

Júnia Freitas, montanhista e usuária do Garmin InReach
Júnia Freitas, montanhista e usuária do Garmin InReach - Arquivo pessoal

Quem acionou a mensagem que salvou a vida do colega foi a mineira de Belo Horizonte Júnia Freitas, auditora fiscal que usa o equipamento todos os finais de semana "não importa se numa aventura exploratória ou numa simples caminhada". Ela lembra que, no local onde o montanhista foi picado, não havia sinal nem para o Garmin (sim, acontece em áreas específicas de sombra para os satélites, como cânions e cavernas). Ela seguiu então até um ponto em que havia sinal de GPS, e passou os detalhes do incidente. "O Lourenço [Marquez] seguia nosso itinerário pelo equipamento e mandou mensagem perguntando se estava tudo bem, por não termos conseguido enviar a mensagem padrão no horário". Informado da gravidade da situação, ele acionou outro contato previamente acertado, que conseguiu chegar perto do local com uma caminhonete e levar o ferido ao hospital.

Para Marquez e Freitas, toda pessoa que se aventura por áreas onde não pega celular, "deve pensar em um dispositivo destes, porque uma simples torção em um local sem abrigo, com chuva, pode levar a hipotermia", e todos estamos sujeitos a sustos com insetos, cobras e outros seres inesperados.

Garmin InReach 2, rastreador de emergência
Garmin InReach 2, rastreador de emergência - Reprodução do site da Garmin

Fabricante de ampla gama de produtos para práticas esportivas, a Garmin conecta seus rastreadores ao aplicativo InReach, que permite, além do rastreamento das trilhas percorridas, a emissão de pedidos de socorro. Com preços variando de R$ 2.349 a R$ 4.149 para os rastreadores, o serviço de mensagens e localização demanda uma assinatura que sai por, no mínimo, US$ 15 (R$ 74) mensais. Segundo André Piva, representante da área de comunicação da Garmin no Brasil, já foram realizados 10 mil atendimentos de emergência em 150 países a partir do sinal do equipamento. Desses, 39% eram mochileiros em trilhas ao redor do mundo.

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