Frederico Vasconcelos

Interesse Público

Frederico Vasconcelos - Frederico Vasconcelos
Frederico Vasconcelos
Descrição de chapéu Folhajus

Juiz afirma que o TRF-6 vai garantir mais acesso ao Judiciário

Tribunal terá que olhar não apenas para a capital, diz Carlos Henrique Haddad

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Sob o título "TRF-6 como solução", o artigo a seguir é de autoria de Carlos Henrique Borlido Haddad, juiz federal em Belo Horizonte. O texto é um contraponto ao post intitulado "Novo tribunal pode comprometer os Juizados Especiais Federais".

Procuradores elegem lista sêxtupla para novo tribunal
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, Jair Bolsonaro, presidente da República, e Luiz Fux, presidente do STF, durante ato em que foi sancionada a lei que cria o TRF-6. - Isac Nóbrega/PR

*

A criação do TRF-6 pela Lei nº 14.226/21 foi fruto de intensa movimentação de magistrados e parlamentares ao longo dos últimos lustros. Parece impensável que, em algum momento, cogitou-se que o novo tribunal seria instrumento de denegação de justiça. Ao contrário, o tribunal surge para garantir mais acesso ao Judiciário pelo povo mineiro e prestação jurisdicional célere, sem perda da qualidade. Ele é solução.

O tribunal vai provocar mudanças, nem sempre bem-vindas, porque importam em sentimento de perdas de vantagens e benefícios, modificam relações pessoais e trazem o medo do desconhecido. Mas a resposta para isso é encarar a mudança com olhar prospectivo e dinâmico, cientes de que os desafios serão superados.

Embora seis varas federais tenham sido extintas – duas delas com competência de JEF –, é possível conceber alternativas para que não haja déficit na prestação jurisdicional.

Pode-se pensar na criação de juizados adjuntos em cada vara-gabinete cível, para prestar auxílio ao Juizado Especial Federal, caso efetivamente se constate excesso de processos dessa competência.

Não se pode esquecer que a situação no interior de Minas Gerais é pior, tal como o Juizado Especial Federal de Uberlândia, que hoje conta com 21.209 processos em tramitação, o que corresponde a mais de duas vezes o acervo de uma vara do Juizado em Belo Horizonte.

O TRF-6 terá que olhar não apenas para a capital, mas também e principalmente para as subseções judiciárias.

É preciso ter em mente que, com a tecnologia, atualmente, não há mais sentido haver distribuição não igualitária de trabalho entre juízes da mesma região.

A única vara federal da Subseção Judiciária de Teófilo Otoni, por exemplo, recebeu 9.366 processos em 2021. Por outro lado, para a Subseção Judiciária de Paracatu, foram distribuídas 3.105 ações no mesmo período, o que já é muito.

No atual estágio de evolução da Justiça brasileira, permitir que um juiz tenha carga de trabalho três vezes superior à de outro magistrado é destituído de qualquer racionalidade. Se a comparação se estender à distribuição das varas da capital, incluindo as Turmas Recursais, vai se perceber que há coisas a serem aprimoradas.

Apesar de seis varas terem sido extintas, permaneceram os cargos de juízes, os quais podem compor Núcleos de Justiça 4.0, especializados em razão de uma mesma matéria e com competência sobre toda a área territorial situada dentro dos limites da jurisdição do tribunal.

O TRF-6 pode selecionar varas e reforçar a especialização de algumas unidades para que a jurisdição seja prestada com mais celeridade. O redesign organizacional pode passar pela ampla remodelagem do sistema de divisão de competências materiais das varas de todo Estado, edificada sobre três pilares, como se faz no TRF-4: especialização, regionalização e equalização do trabalho.

Mesmo a utilização de equipes volantes, se empregadas de forma criteriosa, pode servir para prestar auxílio eventual e temporário a unidades judiciárias com defasagem de servidores ou excesso de carga de trabalho.

O fato de cada vara do JEF ter-se desvinculado de secretaria própria, com a proposta de integrar secretaria única, não é vantagem, nem desvantagem. Estudo realizado pelo CNJ revela o óbvio: unificar secretarias não traz, por si só, mais eficiência.

Consta da pesquisa de percepção que a "unificação de cartórios (...) embora bem avaliada por magistrados (52,1%), não encontra a mesma receptividade entre os servidores do Poder Judiciário e os advogados...".

Para as secretarias unificadas, vale a mesma regra aplicável a governos. O que é melhor: um Estado com governo centralizado ou dividido em federação? Não há resposta certa, pois a França é centralizada e os Estados Unidos são federados, assim como o Brasil, e diferentemente do Haiti, cujo governo é unitário.
Tudo depende, simplesmente, de se implantar gestão em cada célula da Justiça.

Afirmar que um servidor do JEF terá 1.700 processos sob sua responsabilidade, em carga que não se compara com servidores das secretarias cíveis e criminal, diz muito e diz pouco.

Muito, porque mostra que processos não faltam para serem julgados em Minas Gerais. Pouco, porque se trata de número isolado, sem parâmetros confiáveis de comparação, especialmente quando se vive em tempos de PJe.

Vale destacar os ganhos, em termos de rotina cartorária, advindos da adoção do PJE, que automatizou tarefas da secretaria e eliminou inúmeras atividades das equipes.

Embora o PJe considere pesos dos processos para fins de apuração do acumulador de peso da distribuição, desconhece-se na literatura nacional estudos que tratam do "case weighting system", isto é, sistema de pesos processuais especificamente para direcionamento de força de trabalho e de orçamento.

De toda forma, a experiência revela que, na média, a condução de processos criminais é mais complexa do que a de processos cíveis, que são mais complexos do que processos do Juizado Especial, que, por sua vez, envolvem maior complexidade do que processos de execução fiscal. Menor complexidade compensa maior quantidade.

Não se tem notícia de que os Juizados Especiais em Belo Horizonte façam uso de "bots", de algum tipo de inteligência artificial ou mesmo da extensão do PJe+R9 desenvolvida na Subseção Judiciária de Ji-Paraná – celeiro de inovação – para tornar automatizadas inúmeras rotinas judiciais.

Não se pode esquecer de que a atividade judicial é essencialmente rotineira e o gasto de dias com a programação de automações economiza meses de trabalho de servidores. Investir em automação é investir em qualidade de vida dos integrantes do Judiciário, e esse é um dos carros-chefes do novo tribunal. É apenas mais uma possibilidade de lidar com carga de trabalho expressiva, valendo-se da tecnologia que traz racionalidade ao serviço judicial.

É certo que as varas de execução fiscal em Belo Horizonte tiveram previsão de maior número de servidores, baseada no fato de que contam com mais processos. Contudo, são as varas mais propícias à automação de rotinas e que, em tese, precisam de menos servidores por processo. Todavia, futuros ajustes serão capazes de dimensionar com mais precisão as necessidades da primeira instância do novo tribunal.

É muito importante trazer à tona os riscos e não conformidades que estarão no caminho do TRF-6.

Pessoalmente, não tenho dúvida de que as lideranças do tribunal saberão enfrentar esses desafios. Porém, o mais importante nesse momento de transição é mudar a chave mental e olhar os desafios que virão com mentalidade de TRF-6. Dessa maneira, mais do que problemas, surgirão inúmeras soluções no atendimento da população mineira pelo Judiciário federal.

(*) O autor é Pós-doutor pela Universidade de Michigan. Professor Associado da Faculdade de Direito da UFMG e do Mestrado em Direito e Poder Judiciário da ENFAM.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.