Pretos Olhares

Fotografia e outras linguagens da arte feitas por pessoas pretas

Pretos Olhares - Catarina Ferreira
Catarina Ferreira

Série fotográfica transforma cabelo crespo em escultura

Especialista em cabelo afro, Jacy Carvalho fez de seus fios material artístico

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

"Ver meu cabelo crespo como possibilidade artística, depois de ter ouvido tantas coisas ruins sobre ele, é um ato de existência através da arte", diz Jacy Carvalho.

Trancista e criadora de conteúdo, Jacy idealizou o projeto "Escultura Crespa", em que explora as diversas possibilidades de trançar e moldar os fios crespos. Extensões, objetos, cores e formas variadas estão presentes nas fotos que compartilha em sua conta no Instagram.

A carioca Jacy Carvalho usa cabelo crespo como forma de expressão
A carioca Jacy Carvalho usa seu cabelo crespo como forma de expressão - Divulgação

A ideia para usar o cabelo como forma de expressão artística veio após ver uma performance da cantora americana Solange Knowles. "Fiquei surpresa com as possibilidades que se abriram pra mim e queria colocar pra fora tudo que estava sentindo."

Tirar o estigma de que o crespo é difícil ou traz poucas possibilidades de penteados, é um dos objetivos do conteúdo produzido por Jacy, que se define como afrohairstylist. Nas redes sociais, a carioca produz conteúdo sobre o tema há mais de dez anos.

Para ela, o cabelo das pessoas negras ultrapassa seu papel estético, principalmente no Brasil, um país racista.

A percepção de Jacy está presente na pesquisa da historiadora Célia Regina Reis da Silva, que estuda memória e corporeidade negra em São Paulo.

Para a pesquisadora, as representações positivas do cabelo crespo, na arte, na mídia e na literatura, extrapolam a vaidade individual para se tornarem símbolo de conexão com a coletividade. "Os negros encontram na subjetividade do seu próprio corpo, territórios de expressão, de resistências e de alternativas de transformação social", afirma.

Segundo ela, este é um processo contínuo de resgate da autoestima para superar a "antipatia social do cabelo crespo" e os processos de auto-ódio vividos pelas pessoas negras.

"O corpo negro sofreu diversos tipos de violências: para trabalhar, para falar a língua do opressor, para refazer suas crenças, para deixar de ser negro e ao mesmo tempo para não pensar que é branco."

Célia diz ver o corpo como território de expressão, um lugar em que se estabelecem vivências, afetos, em que se solidifica a identidade e onde é possível negar as violências do racismo.

Do outro lado do Atlântico, o trabalho da costa-marfinense Laetitia Ky faz do cabelo crespo instrumento de reflexão questões como política, feminismo e negritude.

O traçado que parte de seus fios desenha formas como o símbolo do feminismo negro, em homenagem ao Dia Internacional da Mulher, ou uma vulva, em protesto contra a violência de gênero.

Já nas telas do streaming, cachos, tranças e dreads contracenaram com trajes que remetem à realeza britânica do século 18, época em que supostamente se passa a série americana "Rainha Charlotte: Uma História Bridgerton", da Netflix, que estreou no mês passado.

A produção conta a história de como Charlotte ascendeu ao trono no universo produzido por Shonda Rhimes.

Jacy foi convidada pela Netflix para fazer uma série de penteados inspirados na série que foram apresentados às atrizes que vivem a monarca, Golda Rosheuvel e India Ria Amarteifio, que interpreta a rainha na juventude.

"Foram décadas de representações totalmente estereotipadas do que ser preto significa. É legal a gente se ver como possibilidade de realeza", diz ela sobre a série, mas ressalta que é preciso estudar a história preta, tanto brasileira quanto africana, que são menos frequentes na mídia.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.