Que imposto é esse

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Que imposto é esse - Eduardo Cucolo
Eduardo Cucolo
Descrição de chapéu Reforma tributária

Restrição a recuperação de imposto e responsabilização de plataforma digital geram polêmica entre tributaristas

Especialistas avaliam proposta do governo como positiva, mas defendem mudanças em alguns pontos

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São Paulo

Tributaristas ouvidos pela Folha apontam alguns pontos do projeto de regulamentação da reforma tributária do governo que devem gerar polêmica.

Entre eles, a responsabilização de plataformas digitais de venda pelo recolhimento dos novos tributos e as regras que restringem o aproveitamento de crédito dos tributos pagos pelas empresas na aquisição de bens e serviços.

Esse é o caso dos bens classificados como de uso pessoal dos sócios de empresas e a restrição feita a planos de saúde empresariais. O projeto também diz que a empresa só terá direito ao crédito se o fornecedor tiver recolhido o tributo.

O projeto como um todo foi avaliado como positivo, prevalecendo o entendimento de que será alcançada a simplificação do sistema e uma adequação da tributação do consumo aos padrões internacionais.

Renato Caumo, sócio da área tributária do Pinheiro Neto Advogados, afirma que os clientes do escritório questionaram alguns pontos da proposta, como a falta de clareza sobre a alíquota, a lista de produtos com tributação favorecida e a vinculação entre crédito e recolhimento do tributo na etapa anterior.

Ele também vê com ressalvas a responsabilização de plataformas de venda internacional pelo recolhimento de tributos de vendas feitas por terceiros.

A proposta diz que plataformas digitais, inclusive domiciliadas no exterior, são responsáveis pelo recolhimento do tributo nas vendas realizadas por seu intermédio. O governo diz que não há nenhuma novidade em relação ao que já ocorre atualmente no programa Remessa Conforme.

Apesar dessas ressalvas, o advogado diz que a proposta deve garantir a simplificação prevista na emenda constitucional da reforma.

"Embora esse projeto seja denso, e em alguma medida complexo, é muito mais simples do que o que temos hoje. A legislação do PIS/Cofins é complicada e extensa, e a do IBS substitui a legislação do ICMS de todos os estados e de ISS de todos os municípios. É um ganho gigantesco de simplificação", afirma.

Mauricio Barros, sócio da área tributária do Cescon Barrieu, afirma que a vinculação do crédito ao pagamento do tributo poderia ser aplicada a segmentos com alto índice de fraudes em notas fiscais e ao setor de serviços. Mas a regra valerá para todos os contribuintes, o que pode gerar dificuldades para recuperação de créditos, comprometendo a não cumulatividade do sistema.

Para ele, o mesmo se aplica à questão dos planos de saúde e do uso de bens para consumo pessoal dos sócios.

"A promessa foi de uma não cumulatividade ampla. Os parâmetros que a gente tem hoje de PIS/Cofins e de ICMS não devem orientar o IBS e a CBS [novos tributos]. Não é porque algo não dá direito a crédito hoje que também não deve dar no futuro. Estamos virando a chave", afirma o advogado, que classifica o projeto como uma revolução no sistema tributário.

O tributarista Gustavo Brigagão afirma ter recebido o projeto com perplexidade. "Eles condicionam o crédito ao pagamento pelo elo anterior da cadeia. Isso é um absurdo, não existe em lugar algum no mundo. É absolutamente fundamental que você tenha um crédito amplo e irrestrito."

"Se você não tiver esse creditamento da forma mais simples possível, o tributo se torna cumulativo", afirma.

Luis Wulff, CEO do Tax Group, também critica esse ponto. "O controle disso será um caos. As empresas só irão comprar de outras empresas que antecipem o imposto sob pena de não conseguirem creditar."

O CLP (Centro de Liderança Pública) afirma que a regulamentação proposta é um avanço em relação ao sistema tributário atual e que a simplificação dos tributos, aliada à reorganização das obrigações fiscais, deve reduzir sobreposições e conflitos de competência que travam o crescimento econômico.

"Avaliando os principais componentes e alterações, é possível perceber que este projeto tem o potencial de reformular não apenas a estrutura tributária, mas também os padrões de consumo e a dinâmica econômica do país", afirma Tadeu Barros, diretor-presidente do CLP.

A lista de produtos com tributação favorecida ou adicional também deve gerar polêmica no Congresso. Inclusive pelo que ficou de fora.

O Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) avalia que a proposta é decepcionante sob a ótica da justiça tributária e climática. A instituição destaca a manutenção de vários regimes especiais que beneficiam o setor de óleo e gás, como Repetro e Reporto.

"O governo optou em deixar o Repetro de fora, o que demonstra o poder do lobby petroleiro e sua falta de compromisso com a reforma dos subsídios aos fósseis", diz a entidade em nota.

A Abia, associação do setor de alimentos, afirma que sempre defendeu que todos os alimentos pagassem menos impostos e que o Brasil se espelhasse nos países da OCDE, onde a média de tributação dos alimentos é de 7%.

"Seguiremos acompanhando os debates no Congresso Nacional e defendendo que todos os alimentos cheguem mais baratos para a população brasileira. Com relação ao imposto seletivo [tributação adicional que vai atingir também bebidas açucaradas], não acreditamos que ele tenha eficácia contra obesidade e doenças crônicas, que se combatem com informação e educação nutricional", diz a entidade.

Segundo o Ministério da Fazenda, a proposta reduz a carga tributária média dos alimentos dos atuais 17,5% para 13,3%, sendo zero para produtos da cesta básica, que hoje pagam 8% em média.

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