Saúde Mental

Informação para superar transtornos e dicas para o bem-estar da mente

Saúde Mental - Sílvia Haidar
Sílvia Haidar
Descrição de chapéu Mente

Como relações familiares traumáticas afetam a saúde mental

Psicóloga explica herança transgeracional e desenvolvimento de transtornos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

As relações e costumes familiares ajudam a moldar as personalidades das pessoas que fazem parte desse grupo.

De um núcleo familiar em que os pais apoiam e estimulam os filhos, pode se desenvolver uma nova geração mais autoconfiante e segura. No entanto, quando há traumas, situações de estresse, muitas expectativas e cobranças, os descendentes correm o risco de se tornarem adultos inseguros e enfrentarem transtornos como ansiedade e depressão.

A herança transgeracional é estudada pela psicologia e psicanálise de família e nada tem a ver com constelação familiar, que é considerada pseudociência.

Menina tampa os ouvidos enquanto os pais discutem ao fundo
Crianças que enfrentaram traumas dentro do núcleo familiar podem desenvolver transtornos como ansiedade e depressão na vida adulta - Fotolia

"Identificar os fatores oriundos das gerações passadas que compõem a genealogia e a configuração psíquica da pessoa, bem como atuar de forma compreensiva para transformá-los, é um caminho que pode prevenir riscos graves, muitas vezes de abuso de álcool, drogas e até suicídio", diz Ana Gabriela Andriani, psicóloga especialista em terapia de casal e família, mestre e doutora pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise.

No texto a seguir, escrito para o blog Saúde Mental, como a psicóloga explica como herança transgeracional afeta a saúde mental e o que fazer para quebrar esse ciclo.

Herança Transgeracional e sua importância para a saúde mental

Por Ana Gabriela Andriani

A importância de termos consciência sobre as mensagens que são transmitidas na rede das relações familiares ainda é um tema pouco discutido, embora já muito estudado pela psicanálise de família por autores como René Kaes, Pierre Benghozi e Alberto Eiguer.

Essas mensagens circulam e são reproduzidas tanto de forma consciente como inconsciente de geração para geração e referem-se a ideias, valores, modos de ser, informações de como devemos ver e nos defender do mundo, ansiedades, medos, segredos, culpas, vergonhas, fantasias, mitos etc., presentes no grupo familiar.

Todos somos de alguma forma afetados por esta rede de significados reproduzidos de forma velada ou explícita nas falas e discursos familiares. Assim, uma família que viveu na geração dos avós um trauma relacionado à morte de um de seus membros em uma guerra, por exemplo, podem transmitir aos descendentes sensações de medo de perda, de separação, e uma necessidade de permanecerem juntos de forma simbiótica, o que muitas vezes gera dificuldades e culpas para os mais jovens se tornarem independentes e fazerem suas escolhas.

Sendo assim, podemos afirmar que somos constituídos como sujeitos na e pela trama das relações e discursos familiares, discursos estes, oriundos de experiências transgeracionais das quais nos tornamos herdeiros. Tais experiências e mensagens podem contribuir tanto para nosso desenvolvimento e enriquecimento como para nosso aprisionamento.

Uma das formas de aprisionamento pode ser por exemplo, quando uma pessoa se torna "depositária" ou guardiã —por um processo de identificação inconsciente— de características de um membro da família que morreu e, por conta disso, passa a se responsabilizar, a ser seu substituto (um filho que se sente impelido inconscientemente em ser igual e a ocupar as mesmas funções do pai após sua morte é um modo desta situação acontecer).

Ainda complexo quando explorado, o tema da herança transgeracional tem profunda importância na aplicação analítica (estou falando aqui em análise pessoal, de casal e familiar). Identificar os fatores oriundos das gerações passadas que compõem a genealogia e a configuração psíquica da pessoa, bem como atuar de forma compreensiva para transformá-los, é um caminho que pode prevenir riscos graves, muitas vezes de abuso de álcool, drogas e até suicídio.

Em linhas gerais, o modo de transmissão e reprodução dessas mensagens acontece através do processo de identificação. A identificação, para Freud, seria um mecanismo de construção de nossa identidade. Por meio da internalização ou da introjeção de aspectos ou propriedades do outro, vamos nos constituindo e diferenciando psiquicamente.

Trazendo agora mais um exemplo, uma neta pode se identificar de maneira não elaborada à história e aos sentimentos experienciados pela avó por ter sido violentada e, sem ter consciência disso, apresentar muitas dificuldades para confiar em seus relacionamentos afetivos, sem saber os motivos disso.

A importância do trabalho de análise nestes casos, refere-se a, através dela, ser possível entrarmos em contato com tais conteúdos, digeri-los e elaborá-los, a fim de, desvelando-os, dar-lhes forma, sentidos e pensamento, construindo significados sobre as mensagens que circulam nas famílias de geração a geração.

Isto tudo para que possamos evitar nos tornamos depositários e prisioneiros de histórias e demandas de outros, o que muitas vezes, ocasiona o aparecimento de sintomas e atuações emocionalmente não saudáveis. Não nos damos conta, mas somos receptores dessas mensagens mais do que imaginamos.

Siga o blog Saúde Mental no Twitter, no Instagram e no Facebook.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.