Saúde Mental

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Saúde Mental - Sílvia Haidar
Sílvia Haidar
Descrição de chapéu Mente

TCC é terapia mais indicada para ansiedade e pânico

Abordagem ajuda a lidar com pensamentos negativos e a enfrentar fobias

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São Paulo

A TCC, terapia cognitivo-comportamental, foi desenvolvida ao longo do século 20 por psicólogos e psiquiatras como uma alternativa para pessoas com depressão que não se beneficiavam da psicanálise criada por Sigmund Freud (1856-1939).

Enquanto a psicanálise enfatiza a importância de mergulhar no inconsciente do sujeito analisado, a terapia cognitiva foca a necessidade de examinar a percepção da pessoa sobre suas experiências.

De modo geral, os estudiosos cognitivos rejeitavam a psicanálise por considerá-la pouco científica e baseada em teorias difíceis de comprovar, como a lembrança reprimida.

Na década de 1960, o psiquiatra americano Aaron Beck (1921-2021), considerado o pai da terapia cognitivo-comportamental, levou em conta que seus pacientes com depressão tinham pensamentos automáticos e negativos em relação a eles mesmos e aos outros. Ele propôs que se esses pensamentos fossem examinados e confrontados, a pessoa conseguiria reconhecer que a sua percepção está distorcida.

A terapia cognitiva desenvolvida por Beck fez com que os pacientes se sentissem melhor em um tempo menor de tratamento do que os submetidos à psicanálise. O psiquiatra conseguiu demonstrar a eficácia ao aplicar métodos científicos para garantir provas empíricas.

O objetivo da terapia cognitivo-comportamental é que o paciente tenha autonomia e consiga enfrentar situações desconfortáveis - Loreanto/Adobe Stock

Nos anos 1980, a terapia cognitiva de Beck se uniu à teoria comportamental do psiquiatra sul-africano Joseph Wolpe (1915-1998), dando origem à terapia cognitivo-comportamental e suas diferentes vertentes utilizadas atualmente.

Por sua caraterística de examinar pensamentos e comportamentos diante de uma situação que causa desconforto, a TCC é a primeira escolha de psicoterapia para transtorno de pânico e de ansiedade indicada pela OMS (Organização Mundial da Saúde).

"Na TCC, o psicólogo não procura apenas escutar o paciente, a sua história, mas também propor mudanças comportamentais e cognitivas a partir do seu dia a dia", diz Mariângela Gentil Savoia, psicóloga e doutora em psicologia clínica pela USP (Universidade de São Paulo), coordenadora e professora do curso de especialização em terapia cognitiva-comportamental do Amban do IPq-HCFMUSP (Ambulatório de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP).

A seguir, a psicóloga explica as indicações da TCC e o que o paciente pode esperar do tratamento.

O que é a terapia cognitivo-comportamental?
A terapia cognitiva-comportamental, essa denominação, é de um grande guarda-chuva que abriga diversas abordagens. Mas, basicamente, o que a diferencia de outros métodos é que a TCC é uma terapia baseada em evidências, pois tem vários estudos controlados demonstrando eficácia clínica.

A TCC tem menor recaída comparada à farmacoterapia, por exemplo. É um processo breve e a aplicação das técnicas não é complicada, são questões com bom aprendizado.

As bases empíricas remetem ao início do século 20. Os estudos com animais começam com o fisiologista russo Ivan Pavlov (1849-1936), em 1904, depois se desenvolve com o behaviorismo, com os psicólogos americanos John B. Watson (1878-1958) e com Burrhus Frederic Skinner (1904-1990). Mas a psicoterapia mesmo se inicia na década de 1950 com o psiquiatra sul-africano Joseph Wolpe (1915-1998), que traz a dessensibilização sistemática e o treino de assertividade.

Um aspecto que diferencia a terapia cognitiva-comportamental, que vem da parte da análise de comportamento das décadas de 1960 e 1970, é a prática de uma ajuda psicoterápica que se baseia numa filosofia e numa ciência de comportamento, que são caracterizadas pela concepção naturalista e determinista do comportamento humano.

Isso significa que o ser humano faz parte da natureza. Ele é um ser da natureza e, como tal, seu comportamento é determinado pelas contingências da natureza. Essa natureza pode ser a família, os amigos, o ambiente que o cerca.

Então a TCC começa nessa questão ambientalista, passando por uma questão cognitivista. Depois tem a questão contextualista, em que o contexto em que as pessoas se desenvolvem é que determina o seu comportamento.

Por exemplo, se uma pessoa nasce com a mesma dotação genética, mas é criada por famílias diferentes, ela desenvolve valores, crenças, maneiras de lidar com o mundo diferentes, de acordo com a família e com o ambiente em que ela vive.

Uma característica importante da TCC é que ela é considerada pela OMS (Organização Mundial de Saúde) como a terapia mais indicada para praticamente todos os transtornos mentais.

É a primeira escolha de psicoterapia para pacientes com transtorno de pânico e de ansiedade pela OMS. A Associação Americana de Psicologia (APA) ela preconiza também os tratamentos da TCC para alguns transtornos mentais, a TCC é considerada a primeira escolha para todos os transtornos de ansiedade, para depressão, para esquizofrenia, para uso abusivo de drogas, entre outros.

A TCC abrange a terapia de aceitação e compromisso (Act), a terapia focada na compaixão, a terapia comportamental dialética, a terapia beckiana, a terapia comportamental ou terapia analítico-comportamental, a terapia de esquemas.

Todos os processos terapêuticos que estão dentro desse grande guarda-chuva da TCC usam técnicas para auxiliar o paciente a se conhecer, a conhecer os seus limites, a mudar seu comportamento, a controlar a ansiedade, pode ser por técnicas de respiração ou por técnicas de distração, meditação.

O psicólogo ensina essas técnicas não com o objetivo de que o paciente elimine a ansiedade de sua vida, mas para que ele aprenda a conviver com ela e lide com as crises no tempo, no momento, do jeito que ela aparecer.

O que acontece durante uma sessão de TCC? O que o paciente pode esperar dessa abordagem?
O que acontece na sessão de TCC é em geral o que acontece nas sessões de terapia. Existe muita coisa do comportamento verbal, existe observação do comportamento do paciente pelo terapeuta, existe a interação entre os dois, a relação terapêutica.

Dependendo da abordagem da TCC, você pode esperar alguns exercícios, alguns treinamentos de algumas habilidades, seja uma habilidade social, seja uma habilidade de relaxamento, seja de relatar sentimentos. Então a gente faz treinamentos e ensaios comportamentais algumas vezes. A ideia da TCC é também trabalhar também dentro do insight terapêutico.

Na TCC, o psicólogo não procura apenas escutar o paciente, a sua história, mas também propor mudanças comportamentais e cognitivas a partir do seu dia a dia. A proposta é fazer com que algumas questões que estejam incomodando sejam avaliadas e discutidas e descobertas as contingências.

Por exemplo, uma dificuldade escolar que a criança esteja enfrentando. É uma questão da escola, é uma questão da relação com os colegas, é uma questão de déficit de intelectual? No processo terapêutico, nós avaliamos quais são as causas do problema que o paciente apresenta.

Em um paciente com TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), vamos avaliar quais situações desencadeiam esse TOC e como a pessoa pode lidar melhor com seus efeitos.

É comum que o psicólogo passe "lição de casa", com exercícios para o paciente fazer durante a semana?
Sim, é comum dar lição de casa para fazer na semana, porque a ideia é que as mudanças comportamentais e cognitivas só podem acontecer durante o processo do dia a dia. Se você só for uma hora por semana na terapia, é muito difícil você conseguir ter uma mudança importante. É importante você mudar no dia a dia.

As lições de casa geralmente propõem que o paciente observe o que e como está lidando com situações que são desafiadoras para ele. Também podem incluir exercícios de respiração, técnicas de mindfulness, treino de relaxamento, treinamento de habilidades sociais, exposição aos medos. Às vezes, é indicado que o paciente seja acompanhado por um AT, que é um acompanhante terapêutico, para auxiliá-lo a fazer algumas coisas que talvez sejam mais difíceis, como frequentar ambientes com muitas pessoas.

É verdade que a TCC é a única abordagem terapêutica que tem evidências científicas para pacientes que sofrem de transtorno de pânico ou fobias específicas?
Sim, é verdade que a única terapia que tem evidências científicas para transtorno de pânico, fobias, ansiedade social, para todos os transtornos de ansiedade. Além da OMS, a TCC é recomendada pelos guidelines da NICE (National Institute for Health and Care Excellence), da Inglaterra, e pela divisão 12 da APA, que disponibiliza um guia online sobre práticas psicológicas baseadas em evidências.

Da mesma forma que cientistas fazem pesquisas com medicamentos para verificar qual deles é melhor para uma determinada doença, a TCC investiga qual é a melhor abordagem para o paciente lidar com determinadas questões.

A terapia cognitivo-comportamental trabalha muito com questões específicas, como fobias, mas também com autoconhecimento. A OMS indica tratamentos que se mostraram eficazes para trabalhar com uma demanda específica. Devido às investigações realizadas pelos pesquisadores da TCC, chegou-se ao consenso de que ela é a mais indicada para lidar com vários distúrbios psiquiátricos e a mais indicada para desenvolver habilidades, como habilidades sociais e de resolução de problemas.

Por quanto tempo é preciso fazer a terapia cognitivo-comportamental?
É recomendado fazer sessões que duram por volta de uma hora, uma vez por semana. Dependendo do caso, pode fazer duas vezes por semana. Mas o mais comum é uma vez por semana. Às vezes, a gente passa para a cada quinze dias e vai espaçando até o paciente conseguir autonomia total.

O objetivo da TCC é que o paciente tenha autonomia de seus comportamentos, da sua vida, e que ele consiga lidar sozinho com suas questões, aceitando as que não podem ser modificadas e fazendo mudanças nas que possam vir a ser modificadas.

Não tem um tempo determinado de duração. Depende muito da interação, do propósito, dos objetivos terapêuticos. Dependendo do caso, o paciente pode ter alta em seis meses, outros podem levar um ano, e outros precisam fazer por anos ou ao longo da vida.

Existe um momento em que o paciente, não obtendo uma evolução desejada, deve tentar outra abordagem?
Eu acho que esse é um ponto importante do processo terapêutico da TCC, porque a responsabilidade é compartilhada. Tanto o terapeuta como o paciente são responsáveis pela evolução do processo. Então, muitas vezes, quando o paciente não está evoluindo, o terapeuta deve avaliar como fazer essa mudança e se é alguma questão que ele não está dando conta. Esse é um ponto importante da TCC, o terapeuta deve estar sempre avaliando o processo.

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