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Cristina Kirchner tem semana definitiva em julgamento por atos de corrupção

Audiências terão início na terça e são última chance de defesa antes de decisão da condenação

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Buenos Aires

As próximas semanas não serão apenas definitivas para o futuro jurídico da vice-presidente Cristina Kirchner, diante das mais de cinco causas que enfrenta na Justiça. Serão também, essenciais do ponto de vista político. A ala mais ligada ao presidente Alberto Fernández prefere que ela se atenha em defender-se em seus processos, e influencie pouco na formação das listas para as primárias eleitorais, que definirão o sucessor para o cargo em 2023 e parte do Congresso.

Apoiador de Cristina Kirchner em ato pré-eleitoral ocorrido em Pilar, em novembro
Apoiador de Cristina Kirchner em ato pré-eleitoral ocorrido em Pilar, em novembro - Juan Mabromata/AFP

Nesta terça-feira (29), Cristina Kirchner terá longa audiência para que ela e os 13 acusados na obra de viabilidade pública apresentem sua última defesa no caso. A sessão começa às 9.30 e não terá hora certa para acabar. Dos processos contra a Cristina, este é o mais avançado, e uma condenação pode ocorrer ainda em dezembro deste ano.

Paralelamente, corre o processo que envolve a suposta participação da "gangue do algodão doce", considerada responsável pela tentativa de assassinar a presidente. Neste caso, há retrocessos com relação ao que a vice pretendia, como o de esclarecer o vínculo entre o grupo de extremistas de direita, Revolução Federal, em uma suposta ação coordenada com o empresário amigo de Macri, Nicolás Caputo. Cristina queria o afastamento da juíza Maria Eugenia Cacuphetti do caso, que considerava próxima a Macri, mas esta será mantida.

Hoje, o racha entre "albertistas" e "cristinistas" no governo é quase mais ferrenho do que entre o próprio governo e a oposição. Entre os peronistas, figuram com melhor chance para a sucessão o ministro Wado de Pedro ou algum outro escolhido de Cristina. Com a ligeira melhora da economia do país, ainda que em meio ao caos e a uma inflação de 100%, contida à força de congelamentos, Sergio Massa se solidifica como um candidato peronista possível.

Com menos de 20% de aprovação, é difícil que Cristina se lance diretamente ao posto, e mais provável que escolha continuar como vice ou alçar-se à senadora, para garantir a continuidade de sua imunidade parlamentar. Em seus últimas aparições e em conversas com seus amigos mais íntimos, a preocupação de Cristina é livrar de acusações os filhos Máximo, hoje deputado, e Florencia, menina abalada pelo que os pais a fizeram passar, ao envolvê-la com o desvio de altos valores de dinheiro. O trauma a levou a passar anos num centro de recuperação em Cuba.

Ambos os filhos da vice-presidente estão envolvidos numa das causas que ainda estão num estágio anterior da que avança a passos rápidos nos tribunais. Mais que o centro do poder novamente, Cristina parece ter como prioridade salvar a filha, que atravessou quadros sensíveis de depressão e problemas decorrentes da internação em Cuba. Dentre os dois, é quem tem a situação mais frágil, a de não ter imunidade partlamentar.

As vitórias de Cristina no plano jurídico não foram poucas nestes anos, desde a reforma da formação da Corte de Magistrados do país ao questionamento insistente de promotores responsáveis por suas causas. Três anos depois da posse e à frente do Senado do país, pode-se dizer que as prioridades de Cristina estiveram essencialmente no lado da Justiça. Setor em que Fernández praticamente não se envolveu.

Se a Justiça acatar o pedido de prisão de 12 anos por conta da obra da viabiliade púbica, algo que deve ocorrer ainda neste ano, Cristina terá de passar por um impeachment no Congresso para perder a imunidade e, a partir de então, responder a causa. No momento, isso não se configura como possível, pois a ex-mandatária possui os votos nas duas casas para manter-se no cargo e com o foro.

Embora a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva tenha animado os kirchneristas, que o interpretam como uma carona possível para seus candidatos em 2023, quando ocorre a sucessão presidencial argentina, analistas políticos locais veem que a proximidade de Lula com os kirchneristas deve ser mais cuidadosa. "Em um ano, o mais provável é que Lula esteja lidando com uma força de centro-direita recém-eleita na Argentina. Ou seja, por mais que o chamem para integrar a campanha do peronista até lá, Lula deverá ser hábil", diz o ex-diplomata e analista político Diego Guelar, à Folha.

O poder vem sendo exercido, na realidade, na Argentina, por duas figuras que não passam pelo atual mandatário. São eles a vice Cristina Kirchner, que praticamente não mantém contato diário com o presidente Alberto Fernández, mas sim com seu ministro da Economia, Sergio Massa, artífice dos congelamentos e do ponto em suspense em que se encontram os compromissos de pagamento da dívida de US$ 44 bilhões com o Fundo Monetário Internacional.

"A única forma de que suplantem no dia-a-dia a Alberto, é não saírem juntos em fotos e atos", afirma Guelar. Assim, Cristina fica livre para atuar com a militância, assim como as tratativas com grandes empresas ficam por conta de Massa, que se queima em nome de não manchar a imagem de Cristina como líder da ala mais kirchnerista do setor, ainda reduto importante de votos.

Enquanto no processo do atentado à sua pessoa, Cristina usa a hipótese de vínculo com o empresário melhor amigo de Macri, Nicolás Caputo, por parte dos moleques extremistas que a ameaçaram. Nas causas de corrupção contra ela e seus filhos, além de funcionários de governo, a estratégia é apelar para a muleta do "lawfare", construção que pega fácil no universo dos esquerdistas mais radicais, como os de sua base kirchnerista, embora seja uma causa que levante debates acalorados entre juristas.

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