O periódico Nature Medicine trouxe nesta quinta-feira (14) resultados promissores de um novo estudo de fase 3 sobre psicoterapia apoiada pelo psicodélico MDMA (ecstasy) para tratar transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). Um passo a mais para esse tratamento ganhar aprovação oficial.
Um teste clínico similar com MDMA havia sido publicado na mesma revista em 10 de maio de 2021. O conjunto de dados recolhidos nos dois ensaios randomizados e controlados deve instruir um pedido de licença para essa aplicação da droga à FDA, agência de fármacos dos EUA, mas o processo ainda vai demorar.
Os testes foram organizados pela Maps PBC, empresa de benefício público ("public benefit corporation") criada pela Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos (Maps, em inglês). No segundo caso, com amostra um pouco maior, de 104 pacientes (contra 90 antes) e bem mais diversa em termos populacionais.
Havia 27% de latinos no grupo de vítimas de abuso infantil ou sexual e veteranos militares, e um total de 34% se identificaram como não brancos. Todos receberam 9 sessões de terapia, 3 de preparação (90 minutos cada), 3 de dosagem de MDMA (8 horas) ou placebo inerte, e 3 de integração (outros 90 minutos).
Após 18 semanas, no grupo de MDMA 71% dos voluntários estavam em remissão, ou seja, não se encaixavam mais no diagnóstico de TEPT. Entre os que tomaram placebo, isso ocorreu com 48% dos pacientes.
A Maps batalha desde 1986 para que MDMA volte à farmacopeia psicoterapêutica, logo após a proibição nos EUA em 1985, que acabou seguida por outros países. Antes disso, nos anos 1960 e 70, centenas de psicólogos e médicos usaram a droga, considerada um forte empatógeno, para auxiliar terapias individuais e de casais.
Apesar da proibição, MDMA –que leva outros nomes como MD, bala, Michael Douglas, molly– continuou popular em baladas e raves. Foi esse uso recreativo, aliás, que motivou sua inclusão no rol de substâncias proscritas e mais controladas, o famigerado Schedule 1 americano, em que também estão cocaína e heroína.
MDMA tem perfil toxicológico seguro e não parece causar dependência. No novo estudo da Maps, observaram-se efeitos adversos leves, como aumentos moderados de pressão arterial e batimentos cardíacos. Houve poucos casos de ideação suicida, mas nos dois grupos, e a amostra era de pessoas com 16 anos de TEPT, em média.
"A terapia assistida por MDMA está a ponto de ser considerada para aprovação pela FDA em 2024", comemora Rick Doblin, fundador e líder da Maps. Em junho passado, Doblin recebeu mais de 12 mil participantes na conferência Psychedelic Science 2023 da Maps, em Denver, Colorado.
"Esperamos que a terapia com MDMA para TEPT seja aprovada pela FDA no ano que vem, e que nosso princípio de ciência aberta/livros abertos possa inspirar pesquisadores a fazerem disso só a primeira das psicoterapias assistidas por psicodélicos a serem validadas por meio de pesquisa diligente."
Doblin continua otimista, 37 anos após iniciar sua campanha pelo renascimento psicodélico. A licença da FDA pode demorar mais do que ele prevê, e tardará até que haja psicoterapeutas treinados suficientes para a demanda –só de veteranos de guerra os EUA têm centenas de milhares com PTSD e dezenas de suicídios por dia de ex-militares.
Califórnia
A Assembleia e o Senado da Califórnia aprovaram legislação eliminando penalidades criminais para posse de pequenas quantidades de psicodélicos naturais, como psilocibina de cogumelos, dimetiltriptamina (DMT) da ayahuasca e mescalina do peiote (o próprio cacto ficou fora da nova norma, por receio de que seja extinto).
O governador democrata Gavin Newsom tem um mês de prazo para sancionar a medida. Se o fizer, o estado com 40 milhões de habitantes engrossará a lista dos que vêm afrouxando a criminalização das drogas alteradoras da consciência, como Oregon e Colorado.
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AVISO AOS NAVEGANTES PSICONAUTAS - Psicodélicos ainda são terapias experimentais e, certamente, não constituem panaceia para todos os transtornos psíquicos, nem devem ser objeto de automedicação. Fale com seu terapeuta ou médico antes de se aventurar na área.
Sobre a tendência de legalização do uso terapêutico e adulto de psicodélicos nos EUA, veja a reportagem "Cogumelos Livres" na edição de dezembro de 2022 na revista Piauí.
Para saber mais sobre a história e novos desenvolvimentos da ciência nessa área, inclusive no Brasil, procure meu livro "Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira".
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