Virada Psicodélica

Novidades da fronteira da pesquisa em saúde mental

Virada Psicodélica - Marcelo Leite
Marcelo Leite
Descrição de chapéu Mente

Morre Roland Griffiths, pioneiro na renascença psicodélica

Cientista tinha câncer e estudou efeito da psilocibina em pacientes terminais

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Homem idoso discursa com a mão fazendo sombra aos olhos
Pesquisador Roland Griffiths faz apresentação na conferência Psychedelic Science 2023 - Marcelo Leite/Folhapress

O segundo advento de estudos com substâncias alteradoras da consciência perdeu nesta segunda-feira (16) um de seus pioneiros, Roland Griffiths. Fundador do Centro de Pesquisa Psicodélica e da Consciência da Universidade Johns Hopkins, Griffiths tinha 77 anos e recebera há menos de dois anos o diagnóstico de câncer de cólon avançado.

Ele publicou em 2006 um artigo sobre psilocibina (psicoativo de cogumelos Psilocybe) tido como o marco que pôs fim a quatro décadas de obscurantismo deslanchado pela fracassada Guerra às Drogas. A partir dela, testes com psicodélicos para saúde mental caíram em desgraça, e a ciência psicodélica parou quase por completo.

O título do trabalho, publicado no periódico Psychopharmacology, era "Psilocibina pode ocasionar experiências de tipo místico dotadas de significado pessoal e significância espiritual substanciais e sustentados". Participaram do ensaio duplo cego controlado por placebo ativo (metilfenidato, ou Ritalina) 36 voluntários saudáveis.

Depois viriam dois trabalhos igualmente famosos, em 2008 e 2011, ainda sobre vivências místicas mediadas pela psilocibina. Em 2016 saiu sua mais impactante contribuição, sobre baixa na depressão e na ansiedade de pacientes terminais com psilocibina. Há um mês e meio, assinou como autor sênior um dos maiores testes clínicos com essa substância no tratamento de depressão.

Griffiths nunca fez segredo do tumor, ao contrário. Falava abertamente sobre a doença e o impacto dela em sua vida espiritual. Foi o caso de sua comovente palestra na conferência Psychedelic Science 2023, junho passado em Denver, Colorado. Até no programa de Oprah Winfrey ele falou de como encarava a morte com serenidade.

Reverenciado no panteão psicodélico ao lado de Albert Hofmann, Sasha Shulgin, Timothy Leary, Stan Grof e David Nutt, entre outros, Griffiths contribuiu também para a associação dessas substâncias com o misticismo que alguns gostariam de ver expurgado da ciência. No próprio centro da Johns Hopkins há visões opostas sobre essa ligação, encarada de maneira crítica pelo discípulo Matthew Johnson, por exemplo.

Em Denver, Griffiths amenizou o tom místico. Contou como sua longa vivência com meditação e psicodélicos vinha ajudando a contemplar a "preciosidade da própria vida". Repetiu várias vezes a palavra gratidão, numa delas "por esse espantoso mistério: a capacidade de estarmos conscientes de que estamos conscientes".

"Estou aqui com vocês como nunca estive antes em minha vida", afirmou na ocasião, muito emocionado, como vários na plateia do BellCo Theater. "Juntem-se todos nesta celebração."

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AVISO AOS NAVEGANTES - Psicodélicos ainda são terapias experimentais e, certamente, não constituem panaceia para todos os transtornos psíquicos, nem devem ser objeto de automedicação. Fale com seu terapeuta ou médico antes de se aventurar na área.

Sobre a tendência de legalização do uso terapêutico e adulto de psicodélicos nos EUA, veja a reportagem "Cogumelos Livres" na edição de dezembro de 2022 na revista Piauí.

Para saber mais sobre a história e novos desenvolvimentos da ciência nessa área, inclusive no Brasil, procure meu livro "Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira".

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