Celulares. Senhas. Cartões.
A tecnologia está aí para ajudar.
A vida do idoso, contudo, se torna mais complicada.
Dona Esmeralda tentava aprender.
--Onde é que clica?
Só o silêncio respondia no amplo apartamento no bairro de Higienópolis.
Era preciso contar com ajuda especializada.
O jovem Edimir dava aulas de informática.
--Nossa... tão moço... e tão educado.
--Claro, dona Esmeralda. Vamos lá?
A conta-ouro no private foi acessada sem problema.
--Agora, dona Esmeralda. Precisa tomar cuidado com isso.
De fato.
Um novo golpe ameaça os usuários do banco online.
--Mão fantasma?
--Isso mesmo, dona Esmeralda.
O poupador aceita um pedido de atualização no aplicativo.
E dedos invisíveis começam a teclar senhas, transferências e desfalques.
--E a gente vendo tudo? Assim, no nariz da gente?
--Isso. Vou mostrar para a senhora. Mas é só uma simulação.
O celular de dona Esmeralda entrou em parafuso.
Números. Comprovantes. Balancetes.
--E isso aqui, o que é?
Doações. Transferências.
--Parabéns. Você acaba de contribuir para a campanha do Kid Bengala.
O famoso ator pornô tenta novamente um lugar ao sol.
--Cruz credo.
--Fique tranquila, dona Esmeralda. É só simulação.
A noite chegava com dedos de gelo nos lados da zona Oeste.
Foi agitado o sono de dona Esmeralda.
--Nossa... já é dia de votação?
A urna eletrônica tinha gavetinhas e detalhes em madeira nobre.
--Parece meu criado-mudo...
A anciã consultou a colinha com o número de seus candidatos.
--Bolsonaro sempre. E aquele rapaz que era ministro.
Os dedos trêmulos de dona Esmeralda não conseguiam impor a própria vontade.
A maquininha agia por vontade própria.
--Kid Bengala? Estou votando nesse aí?
--Clic, clic.
Exu. Cosme e Damião. Zé Pelintra.
Entidades diversas sucediam-se rapidamente na telinha.
Até surgir o rosto de outro candidato.
O grito de dona Esmeralda atravessou as paredes do Edifício Rapunzel.
--Luuulaaaa!
Da guarita, ouviu-se uma manifestação de apoio.
--Valeu, dona Esmeralda... é Lula na cabeça.
O dia seguinte trouxe a idosa ao seu estado normal.
--Voto impresso. E golpe militar para garantir.
Dedos invisíveis podem manipular uma conta bancária.
Mas, dentro de cada cabeça humana, outros fantasmas se mostram em atividade.
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