Descrição de chapéu The New York Times

China traça planos para colocar astronautas na Lua e em Marte

País está correndo uma constante maratona espacial, em vez de competir numa corrida apertada com os EUA

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Keith Bradsher
Jiuquan, China | The New York Times

Trinta anos atrás, o governo chinês iniciou um plano secreto para seu programa espacial, incluindo o objetivo principal de construir uma estação espacial até 2020.

Na época, o país estava a 11 anos de enviar seu primeiro astronauta ao espaço, e seus esforços passavam por uma fase difícil: os foguetes chineses falharam em 1991, 1992, 1995 e duas vezes em 1996. A pior falha, em 1996, foi um foguete que tombou para o lado, voou na direção errada e explodiu 22 segundos após o lançamento, cobrindo uma aldeia com destroços e combustível em chamas, o que matou ou feriu pelo menos 63 pessoas.

Embora os grandes planos de voos espaciais de alguns países tenham ficado muitos anos atrasados, a China concluiu a montagem em órbita de sua estação espacial de Tiangong no final de outubro, 22 meses depois do planejado. E, em 29 de novembro, a missão Shenzhou 15 decolou do Centro de Lançamento de Satélites Jiuquan, nas profundezas do deserto de Gobi, na Mongólia Interior, e levou três astronautas à estação espacial para iniciar a ocupação permanente do posto avançado.

Lançamento da missão Shenzhou 15 no Centro de Lançamento de Satélites Jiuquan, no deserto de Gobi, em novembro deste ano - CNS/AFP

Essas conquistas de voos tripulados, combinadas com sondas espaciais recentes para a Lua e Marte, aumentam a evidência de que a China está correndo uma constante maratona espacial, em vez de competir numa corrida apertada com os Estados Unidos. O fato de o programa espacial chinês estar avançando na direção de seus objetivos de longo prazo foi reforçado durante uma rara visita da mídia estrangeira à base de foguetes fortemente protegida no deserto para o lançamento em 29 de novembro –incluindo longas entrevistas com altos funcionários espaciais chineses para o The New York Times.

O Pentágono previu em agosto que a China ultrapassaria as capacidades americanas no espaço em 2045.

"Acho que é perfeitamente possível que eles possam nos alcançar e nos ultrapassar, com certeza", disse a tenente-general Nina Armagno, diretora de estado-maior da Força Espacial dos EUA, numa conferência em Sydney (Austrália) um dia antes do lançamento da Shenzhou 15. "O progresso que eles fizeram foi impressionante –incrivelmente rápido."

O programa chinês saiu da linha de largada em 1986, décadas depois do auge da corrida espacial EUA-União Soviética. Foi quando Deng Xiaoping, então líder supremo da China, aprovou o Projeto 863, um programa de desenvolvimento de ciência e tecnologia que incluía planos para uma espaçonave tripulada.

O programa começou a ganhar velocidade em 1992 com o Projeto 921. "O objetivo estabelecido naquela época era concluir a construção da estação espacial chinesa por volta de 2020", disse Zhou Jianping, designer-chefe do programa espacial tripulado.

Apesar do embaraço inicial, pois os foguetes continuaram explodindo em vez de chegar ao espaço, Pequim acelerou o ritmo nos anos seguintes. Empresas americanas, que procuravam uma maneira barata de colocar satélites no espaço, ajudaram a China a resolver seus problemas de qualidade de foguetes. Em 2003, a Boeing acabou concordando em pagar US$ 32 milhões em multas por violações dos controles americanos de exportação de armas por uma empresa que havia adquirido, a Hughes Space and Communications.

Astronautas Fei Junlong, Deng Qingming and Zhang Lu participam de entrevista coletiva, em novembro, antes da missão Shenzhou 15 - Reuters

O Congresso acabou proibindo em 2011 as agências espaciais americanas de gastar qualquer dinheiro para cooperar no espaço com a China, exceto em circunstâncias limitadas. A proibição, promulgada em resposta a preocupações com roubo de tecnologia e violações dos direitos humanos, bloqueou qualquer chance de convidar a China a participar da Estação Espacial Internacional.

Frank Wolf, um congressista republicano aposentado que pressionou pela aprovação da legislação, disse em um email recente que ainda acredita que ela seja necessária. "Resumindo, não deveríamos estar colaborando com a China", afirmou.

A China também aproveitou extensamente a experiência russa ao longo dos anos, desde a fundação de Jiuquan em 1958 como base militar para o desenvolvimento de seus primeiros mísseis balísticos intercontinentais. A espaçonave que transporta as missões de Shenzhou se parece muito com a Soyuz da Rússia.

As autoridades espaciais do país dizem que todos os componentes de sua espaçonave são fabricados na China. Mas reconhecem que se beneficiaram da cooperação ao longo dos anos com seu vizinho do norte.

"O voo espacial tripulado da China também teve muitos intercâmbios com a Rússia no processo de desenvolvimento —100% de localização não significa que não haja intercâmbio ou cooperação", disse Zhou.

A China agora está buscando seus próprios programas e não fez parceria com a Rússia para sua nova estação espacial.

Depois de grandes avanços nos últimos anos, meia dúzia de autoridades espaciais chinesas delinearam seus planos para os próximos anos em entrevistas no centro de lançamento, que fica numa vasta extensão congelada de cascalho cinza no noroeste da China, a quase quatro horas de carro da cidade grande mais próxima.

A estação espacial Tiangong pesa quase 100 toneladas. É pouco mais do que o Skylab americano lançado em 1973, e menos que a estação espacial Mir que a União Soviética começou a montar no espaço em 1986.

Tiangong está sendo retratada pela mídia estatal para o público chinês como uma casa de três quartos no céu. Ainda assim, é muito menor que a Estação Espacial Internacional, que pesa cerca de 450 toneladas e acomoda sete pessoas.

Começando com a chegada dos três astronautas da Shenzhou 15 em 30 de novembro, a China agora planeja que sua estação espacial seja ocupada continuamente por pelo menos três astronautas. Isso se expandirá para seis durante sua sobreposição de uma semana a cada seis meses, quando uma tripulação substituta chegar —ainda aquém da ocupação habitual de sete astronautas na Estação Espacial Internacional.

Ji Qiming, diretor-geral-assistente do escritório de engenharia do Programa Espacial Tripulado da China, disse que os astronautas da Shenzhou 15 primeiro vão depurar o equipamento a bordo da estação espacial recém-concluída. Eles "concluirão o desbloqueio, instalação e teste de 15 racks de experimentos científicos e realizarão mais de 40 experimentos de ciências espaciais e testes técnicos no campo de pesquisa e aplicações de ciências espaciais, medicina espacial, tecnologia espacial e assim por diante", disse ele, sem fornecer detalhes.

Já no próximo ano, a estação espacial chinesa terá um telescópio lançado separadamente, o Xuntian, orbitando nas proximidades para pesquisar o universo em comprimentos de onda ópticos e ultravioleta —em muitos aspectos, uma versão mais sofisticada do Telescópio Espacial Hubble de 32 anos da Nasa.

O desenvolvimento de tecnologia de foguetes reutilizáveis na China tornou-se ainda mais importante após críticas internacionais consideráveis a seus foguetes Longa Marcha 5B. A China permitiu que os enormes propulsores desses foguetes caíssem sem controle na Terra enquanto enviava cada um dos três módulos da estação espacial Tiangong para a órbita.

R. Nicholas Burns, embaixador dos Estados Unidos na China, disse em entrevista que encorajou a China "a ser mais cautelosa com a reentrada descontrolada de grandes corpos de foguetes".

Apesar de todas essas dificuldades, a China pretende manter seu plano espacial de longo prazo.

"Pousar na Lua, pousar em Marte, é um progresso muito significativo no desenvolvimento da civilização humana", disse Zhou. "Podemos entender e perceber seu valor adicional passo a passo. Mas seu papel no desenvolvimento de nossa civilização humana é enorme, então vale a pena nossos esforços —vale a pena lutar por isso."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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