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Nobel pode diminuir o impacto de cientista em sua área de pesquisa

Após ganharem prêmios importantes, laureados se tornam menos produtivos, segundo estudo

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Katrina Miller
The New York Times

Ganhar um Prêmio Nobel pode mudar uma vida. Os vencedores tornam-se conhecidos mundialmente e, para muitos cientistas, o reconhecimento representa o auge de suas carreiras.

Mas qual é o efeito de ganhar um prêmio desse?

John Ioannidis, pesquisador de saúde pública da Universidade de Stanford, queria responder a essa pergunta. Prêmios como o Nobel são "uma importante ferramenta de reputação", mas ele questiona "se realmente ajudam os cientistas a se tornarem mais produtivos e terem mais impacto em suas áreas".

Em agosto, uma equipe de pesquisadores liderada por Ioannidis publicou um estudo na revista Royal Society Open Science que tentou quantificar se grandes prêmios impulsionam a ciência. Usando padrões de publicação e citação para cientistas que ganharam um Prêmio Nobel ou uma Bolsa MacArthur —a chamada bolsa de gênio— a equipe analisou como a produtividade pós-premiação é influenciada pela idade e estágio da carreira. No geral, descobriu-se que os laureados de qualquer um dos prêmios tiveram impacto semelhante ou menor em seu campo.

Medalha entregue a premiados com o Nobel - Hiroko Masuike/The New York Times

"Esses prêmios não parecem aumentar a produtividade dos cientistas", disse Ioannidis. "Parece, na verdade, ter o efeito oposto."

O estudo contribui para um conjunto de trabalhos que visa desmistificar como prêmios moldam a maneira como a ciência é feita, embora estudiosos divirjam em quais fatores as láureas são mais importantes.

Desde 1901, a Fundação Nobel tem concedido prêmios por conquistas inovadoras em física, medicina e química (além de prêmios pela paz, literatura e, desde 1969, pesquisa econômica). A Bolsa MacArthur foi fundada em 1981 e, ao contrário do Nobel, é concedida como um investimento no potencial de um indivíduo.

A equipe de Ioannidis estudou os vencedores de ambos os prêmios para levar em conta como a idade afeta a produtividade científica. Em média, os vencedores do Prêmio Nobel têm mais chances de serem mais velhos e mais avançados em suas carreiras em comparação com os bolsistas MacArthur.

Para o estudo, a equipe selecionou uma amostra de 72 laureados do Nobel e 119 bolsistas MacArthur deste século e comparou a contagem de publicações e citações de cada premiado três anos antes de receberem o prêmio com três anos depois do reconhecimento. As publicações deram uma dimensão do volume de novos trabalhos que um pesquisador estava produzindo, enquanto as citações quantificaram o impacto que esse trabalho teve no campo, disse Ioannidis.

Sua equipe descobriu que os vencedores do Nobel publicaram aproximadamente o mesmo número de artigos após receberem o prêmio, mas o trabalho pós-premiação teve muito menos citações do que o trabalho pré-premiação. Por outro lado, os bolsistas MacArthur publicaram um pouco mais, mas suas citações permaneceram aproximadamente as mesmas. A taxa de citações por artigo tanto para os laureados do Nobel quanto para os bolsistas MacArthur diminuiu após a vitória.

Ao analisar as tendências diretas por idade, a equipe descobriu que os laureados de ambos os prêmios que tinham 42 anos ou mais sofreram uma diminuição no número de citações e no de publicações após a vitória. Os beneficiários que tinham 41 anos ou menos publicaram mais e foram mais citados, o que, segundo os pesquisadores, sugere que a idade desempenha um papel na produtividade científica dos premiados.

Mas Harriet Zuckerman, uma socióloga da Universidade de Columbia que passou sua carreira acompanhando as vidas e o trabalho dos laureados com o Nobel, disse que era difícil resumir a produtividade em métricas tão simples. A dificuldade aumenta ao generalizar em diferentes campos da ciência, que têm padrões variados para publicar ou citar trabalhos. Em alguns campos, por exemplo, cientistas mais experientes podem não se incluir como autores para dar uma chance aos cientistas em início de carreira brilharem.

Embora Zuckerman não necessariamente relacione isso à produtividade, ela também estudou como os padrões de publicação e citação dos vencedores do Nobel flutuaram com a idade, estágio da carreira e outros fatores. Ela descobriu que a experiência com a fama causou a maior mudança—algo com que os vencedores do Nobel lidam de uma maneira que os bolsistas MacArthur podem não lidar.

"Eles são tratados por outros, tanto dentro de suas áreas quanto fora da ciência, frequentemente como celebridades, como pessoas cujas opiniões contam em tudo", disse ela. "Isso acaba causando muita distração."

Andrea Ghez, astrofísica da Universidade da Califórnia, Los Angeles, concordou que a diferença entre se tornar uma bolsista MacArthur, o que ela fez em 2008 aos 43 anos, e um laureado do Nobel de Física, o que ela fez em 2020 aos 55 anos, é marcante. "Há uma enorme responsabilidade que vem com um Nobel em termos de realmente ser identificado como um líder no mundo", disse ela. Para Ghez, isso inclui ser uma representação positiva para as mulheres e defender a importância da ciência —dois impactos que não são registrados em artigos ou citações.

Andrea Ghez, astrofísica da Universidade da Califórnia, Los Angeles, foi bolsista MacArthur e laureada com o Nobel de Física - Alex Welsh/The New York Times

Outra razão pela qual os laureados do Nobel podem ver uma queda na produtividade é que eles sentem que atingiram o ápice em uma área de pesquisa e querem tentar algo novo. "Isso é chamado de penalidade de mudança", disse Dashun Wang, pesquisador da Universidade Northwestern que analisa a investigação científica e que não estava envolvido no estudo.

Wang descobriu que isso levou a uma queda temporária na taxa de publicação, mas que isso se recupera após cerca de três anos. Ele argumentou que isso deve ser visto como algo positivo.

"Isso significa que essas pessoas querem continuar a ultrapassar novas fronteiras", acrescentou.

No que diz respeito ao Nobel especificamente, o prêmio lhe dá a confiança e a influência para perseguir ideias maiores e mais ambiciosas, de acordo com Ghez. "O trabalho transformador é conhecido por não ser bem medido por citações."

Ioannidis reconhece as limitações de reduzir a produtividade a artigos e citações, pois eles contam apenas uma parte da história. "Existem muitas outras coisas que importam no impacto da ciência e da sociedade."

Mas até que haja dados para quantificar esses benefícios, Ioannidis ainda encontra valor em tentar avaliar os efeitos dos prêmios —e em instigar a comunidade a pensar profundamente sobre como alcançar um trabalho mais rigoroso e impactante. "A ciência é a melhor coisa que pode acontecer aos seres humanos", disse Ioannidis. Mas como aproveitar melhor seus benefícios, acrescentou, é uma questão científica em si.

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