Alexandra Forbes

Jornalista, escreve sobre gastronomia e vinhos há mais de 20 anos. É cofundadora do projeto social Refettorio Gastromotiva e autora de livros de receitas.

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Fale menos e faça mais!

Seu restaurante favorito pode virar cinzas até o verão chegar

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Quem mais aí está como eu, com a cabeça fervendo e os olhos cansados pela overdose de fake news, real news, memes, vídeos emotivos em que o vírus toma forma de uma mulher que fala italiano, piadinhas, desabafos, protestos, fotos de gente enchendo a cara em casa, entrevistas com especialistas, alertas médicos e manchetes catastróficas sem ter fim? Ufa! À beira de um curto-circuito cerebral, com meu celular pelando tamanho o vaivém de posts e mensagens febris, não consigo parar de pensar nas pessoas por trás dos bares e restaurantes do Brasil.

O Brasil todo está ferrado, sei bem. Mas o coração sente mais o que os olhos vêem de perto, e o que eu vejo e descrevo de perto e vivo há mais de 30 anos é o Brasil que dá de comer e de beber às pessoas. No meu feed do Instagram aparece um chef atrás de outro postando comunicados: "Vamos fechar. A saúde de nossos clientes e funcionários é prioridade". Daniele Zukerman fechou seu restaurante vegano Plantmade temendo não conseguir reabrir. Desolada, diz: "estamos matando um leão a cada dez minutos, a gente tem mais de 90 fornecedores, a maioria pequenos produtores, é uma baita responsa". Má notícia após má notícia e uma bizarra sensação de volta à Segunda Guerra Mundial, com milhões de seres apavorados e estocando víveres nas suas tocas. Muita opinião, muita informação mas pouca ação.

Em meio à zona, como agulhas despontando em um fétido palheiro, consigo enxergar uma ou outra iniciativa pensada para gerar benefícios rápidos e concretos. Enquanto o governo federal não acode bares e restaurantes que sangram a olhos vistos, vejo alento ao ler comunicados como o enviado pelo delivery iFood, que "irá destinar R$50 milhões de sua receita na forma de um fundo de assistência a restaurantes, com foco especial nos pequenos estabelecimentos locais". Tem mais: "a empresa irá antecipar os recebimentos dos restaurantes, sem custo adicional. Dessa forma, todo restaurante que optar por fazer parte dessa iniciativa, receberá seu pagamento em sete dias após a venda nos meses de abril e maio. Com isso, a expectativa é injetar até R$ 600 milhões no mercado brasileiro".

Pelo que ando ouvindo, os milhões não bastarão. Nem dá para tentar imaginar o que vai sobrar dos bares e restaurantes depois dessa catástrofe. Que fazer? Cortar os pulsos? Ou fazer uma omelete e abrir um bom vinho na paz de meu confinamento campestre e desencanar? Nem um, nem outro. Resolvi lançar uma loja online de vales-presente de bares e restaurantes no aplicativo Start Pay para ajudar de alguma maneira.

A partir de segunda ou terça-feira estarão muitos deles lá, reunidos em uma pagineta do app: Mocotó, Bar da Dona Onça, Evvai, Lanchonete da Cidade, Borgo Mooca, Capim Santo, Le Jazz, Rubaiyat, Vista, Amadeus, Charco... Nem conseguiria mencionar todos, porque são muitos e a lista cresce a cada hora. Ajudar será fácil: basta baixar o Start Pay, fazer o registro e depois clicar no ícone GGG (Gentileza Gera Gentileza), escolher seus restaurantes do coração e comprar vales-presente. Copiei a ideia do ecommerce canadense Brunette, que não só está encorajando a venda de vales-presente como tem ligação com o recém-criado Montréal Restaurant Workers Crisis Relief Fund, ou fundo de alívio para os trabalhadores de restaurantes de Montréal, que recebeu mais de 15 mil dólares canadenses de doações em poucos dias.

Vales-presente são um jeito simples de injetar dinheiro agora em um setor que está em desespero. A plataforma paulistana de eventos gastronômicos FoodPass teve a mesma ideia e está lançando iniciativa parecida, chamada Quarentene-se, na segunda-feira: que bom! Empresas do bem estão juntando-se à onda solidária: a marca de águas San Pellegrino, por exemplo, comprometeu-se a comprar muitos milhares de reais de vales-presente pelo Start Pay nos próximos dias.

Na América do Norte os governos têm muito mais condições financeiras de ajudar. Mesmo assim, chefs e restauranteurs não quiseram esperar essa ajuda e montaram rapidamente operações de socorro aos trabalhadores. O chef José Andrés, por exemplo, radicado em Washington, transformou parte de seus muitos restaurantes em cozinhas comunitárias para fazer e servir gratuitamente comida para quem precisa. A renda de seus recém-criados vales-presente Employee Support Fund vai, como indica o nome, para os funcionários da empresa. O restauranteur e apresentador do Netflix David Chang já levantou mais de US$ 32 mil com seu Momofuku Employee Relief Fund (fundo de assistência aos empregados do Momofuku).

Já no Brasil, onde o buraco é muito mais embaixo, ainda não vi fundos filantrópicos de apoio a trabalhadores de bares e restaurantes. A essa altura já há milhares de garçons e cozinheiros demitidos e gente sem comida na despensa. O vírus não tem dó. Não chega ao Brasil pegando leve porque aqui falta organização, liderança, dinheiro, sabão, álcool em gel, hospital e tudo mais. Vírus ataca a nós e aos gringos com suas redes de segurança igualmente. Isso significa que seu boteco ou restaurante favorito, quiçá, terá virado cinzas até o verão chegar. Não é hora, portanto, de ficar olhando a casa pegar fogo. Mexa-se você também!

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