Ana Paula Vescovi

Economista-chefe do Santander Brasil

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Ana Paula Vescovi

Público ou Privado?

É preciso persistir na estratégia de atrair investidores privados para a infraestrutura

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A trajetória recente dos investimentos privados sugere que o interesse de investidores em infraestrutura no Brasil é crescente. A principal agenda para destravar a infraestrutura é fugir à tentação de "turbinar" o investimento público e persistir na estratégia de atrair o setor privado, atuando na sua melhoria contínua.

A dotação de infraestrutura no Brasil ronda um terço do PIB, nível abaixo dos pares (50% a 60%) e aquém das economias avançadas (75%). Após a recessão de 2015/2016, o fluxo anual de investimentos caiu 25%, em média, muito por causa do encolhimento do setor público, diante de uma crise fiscal sem precedentes. Enquanto o investimento privado praticamente voltou aos níveis prévios de 2016, o público recuou para menos da metade.

Em 2020, os investimentos em infraestrutura alcançaram o montante de R$ 125 bilhões (sem óleo e gás) e foram liderados por energia elétrica (45,4%), seguida por telecomunicações (25,1%), logística (18,1%) e saneamento (11%). Dados internos do Santander indicam valores para o setor de óleo e gás próximos a R$ 63 bilhões.

Vista aérea de rio, com barcos atracados em ambas as margens
Vista do Porto de Vitória, no Espírito Santo. - Fred Loureiro/Secom-ES/Divulgação

Uma análise superficial concluiria que basta aumentar o investimento público para ampliar a infraestrutura. Porém, foi exatamente o excesso de gastos públicos que levou à grave crise de 2015/2016, da qual o país ainda não se recuperou. Seguir este caminho seria sobrecarregar a dívida pública, aumentar seu custo de rolagem e perder conquistas dos últimos anos.

Em termos econômicos, a maneira ótima seria fortalecer a participação privada, atrair poupança externa, avançar na contenção das despesas públicas obrigatórias e abrir espaço para ampliar as escolhas orçamentárias, inclusive, a infraestrutura.

Enquanto os investimentos privados avançam de modo sustentado, aumentando o PIB potencial, os governos poderiam se concentrar em corrigir desequilíbrios nas contas públicas, melhorar a efetividade do gasto social e a segurança jurídica dos negócios.

Tão ou mais importante seria replicar a experiência de governança deste processo, que passa cada vez mais pelo mercado de capitais privado. Se o valor captado em debêntures em 2016 foi apenas R$ 6,7 bilhões, em 2021 aumentou dez vezes (R$ 68 bilhões), já com a participação do mercado de ações.

Os investidores domésticos e estrangeiros observam com lupa os dados de risco e retorno. As instituições financeiras têm ampliado seus times de analistas e consultores, e cada vez mais atores interagem na seleção de projetos para investidores de diferentes naturezas, propósitos e geografias.

Fundos dedicados à infraestrutura (private equity) têm se especializado em captar recursos para aportes em projetos previamente selecionados. Além da pré-seleção, fornecem assessoria regulatória e tributária e ainda contratam a operação de concessões públicas até a sua maturação, para futura transferência a interessados.

Isso significa que o aprofundamento da participação do setor privado nas duas pontas —investidor e tomador de recurso— traz como benefício uma aplicação mais eficiente, selecionando os projetos mais viáveis em função do seu custo de oportunidade, o qual observa projetos similares em outros países ou a remuneração dos títulos da dívida pública, livre do risco de mercado.

Logo, quanto maior o uso de recursos públicos em desequilíbrio fiscal, maior o custo de oportunidade e menor a lista de projetos com retornos viáveis. Na verdade, usar recursos públicos nessa condição pode atrofiar o avanço da infraestrutura no longo prazo.

Porém, o setor público cumpre papel importante nesta dinâmica privada. Além de aperfeiçoar marcos regulatórios, origina grande parte das operações, por meio das concessões, vendas de ativos ou autorizações.

Os exemplos são abundantes. No mercado de capitais a mudança fundamental foi a nova taxa de juros de longo prazo (TLP), que retirou subsídios do BNDES, sempre às custas do Tesouro. Sem a hipertrofia do financiamento público, a TLP catapultou o crédito privado. O BNDES continua fundamental para complementar o mercado privado, especialmente nos prazos mais longos.

Na regulação, houve importante aperfeiçoamento nos marcos regulatórios em petróleo, energia elétrica, gás, saneamento, ferrovias, telecomunicações. Na gestão, o marco tem sido o Programa de Parcerias e Investimentos —PPI, iniciado em 2016— com foco na governança dos projetos e na atração do setor privado, com interação técnica e transparente com investidores, em um locus único —o que tem sido seguido por vários estados.

A chave do processo decisório passa pela equação risco-retorno, sob avaliação técnica, com atores múltiplos interagindo em todas as fases, o que também deveria valer para os investimentos públicos. A política de preços baseada em parâmetros de mercado foi fundamental para a atração de investidores em projetos mais equilibrados, reduzindo a dependência das empresas estatais e a incerteza.

No final desta história, ganham os consumidores, com serviços mais abrangentes, mais estáveis e seguros, com melhor qualidade e tarifas mais justas.

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