Antonia Pellegrino e Manoela Miklos

Antonia é escritora e roteirista. Manoela é assistente especial do Programa para a América Latina da Open Society Foundations. Feministas, editam o blog #AgoraÉQueSãoElas.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Antonia Pellegrino e Manoela Miklos

É acintoso

Alvos de Bolsonaro, conselhos são espaços de participação na democracia

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O movimento pelos direitos das mulheres nasceu na virada do século 19 para o 20. Sua primeira agenda foi a luta pelo direito das mulheres de participar da tomada de decisão sobre o futuro das sociedades que integravam.

Elas queriam votar, tomar parte da democracia para que a própria democracia pudesse realizar seu potencial. O movimento pelos direitos das mulheres nasceu porque elas entendiam o valor da participação, a importância da representatividade, o potencial do regime democrático.

Essa semana, assistimos aterrorizadas a autoridades mutilando democracia brasileira em todos os níveis de governo. No dia em que o país tentava compreender o saldo desses cem dias de Bolsonaro, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, anunciou a decisão do presidente de realizar “pente fino” nos conselhos federais.

O Brasil tem hoje aproximadamente 700 conselhos federais. São espaços de participação e controle social importantíssimos, uma demanda antiga e uma conquista da sociedade civil organizada brasileira.

O governo Bolsonaro, todavia, não pensa assim. Incapaz ou indisposto a compreender a importância desses espaços deliberativos para a saúde de nossa democracia, ele parece enxergar nos conselhos apenas o fato de terem sido, em sua maioria, instituídos por administrações petistas. Lorenzoni deixou isso claro ao afirmar que a maioria dos conselhos seriam desnecessários, irremediavelmente esteados na “visão ideológica dos outros governos” e amparados por um entendimento “deturpado” da participação social.

É digno de nota: para Lorenzoni, a extinção dos órgãos se traduziria em economia aos cofres públicos, já que implica pagamentos de diárias, passagens e outros custos para encontros que servem só “para consumir recursos públicos e aparelhar o Estado brasileiro”.

Bala de prata do governo Bolsonaro, o argumento da “conta que não fecha” segue sendo empregado todas as vezes que a administração toma decisões que lhe interessam. Curioso é que o argumento nunca é usado para auxílios-paletó ou para auxílio-moradia para políticos. Esses gastos sempre cabem na tal da conta. Os conselhos, pilares da democracia brasileira pelos quais a sociedade lutou por décadas, é que estouram a conta.

Especialistas defendem a inconstitucionalidade da decisão sobre os conselhos e estudam maneiras de mantê-los operantes. É o que nos resta. Na mesma semana, foi anunciado um projeto de Lei Complementar que pretende extinguir a Ouvidoria de Polícia do Estado de São Paulo. O projeto conta com o apoio do governador Doria, dizem.

Iniciativa pioneira no Brasil, a Ouvidoria da Polícia foi criada em 1995 e desde 1997 está regulamentada por lei. A ideia deu tão certo que inspirou a criação de ouvidorias no Distrito Federal, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Paraná. Atua como uma espécie de ombudsman da segurança pública e é dirigida por um representante da sociedade civil, com total autonomia e independência. Autonomia e independência. Claro que isso incomodaria os conservadores, claro que isso desafia a ideia míope 
de democracia que eles têm.

As mulheres se entenderam como movimento social ao lutar pelo direito ao voto. O movimento foi perseguido, as lideranças foram presas. Mas elas seguiram. Sabiam que a democracia era um bem maior, queriam defendê-la em pé de igualdade com os homens.

É acintoso, mas é fato: as mulheres desde sempre souberam da importância da democracia. Bolsonaro, Onyx, Doria e os seus, infelizmente, parecem pouco afeitos a ela. Só gostam daqueles atributos que garantiram a sua chegada e garantirão sua permanência no poder. O resto é caro, desimportante ou perigoso. É melhor acabar com isso aí, tá ok?

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.