Atila Iamarino

Doutor em ciências pela USP, fez pesquisa na Universidade de Yale. É divulgador científico no YouTube em seu canal pessoal e no Nerdologia

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Atila Iamarino

Quem ainda tem medo da Covid?

Parece muito mais justificado temer o ebola, um vírus letal para mais de metade dos infectados, do que o novo coronavírus

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O medo tem o seu papel em uma pandemia. Parece muito mais justificado temer o ebola, um vírus letal para mais de metade dos infectados, do que o novo coronavírus. Um caso de ebola em um brasileiro seria notícia por dias. Mas mesmo no pior surto de ebola, que aconteceu entre 2013 a 2016, morreram menos de 12 mil vítimas. O equivalente às mortes por Covid na primeira metade de fevereiro aqui no Brasil.

Na pandemia de Covid, o medo e a falta dele nos fez alternar entre medidas tomadas em momentos de temor, bons resultados de algumas delas e o relaxamento fora de hora graças a esses resultados. No começo de 2020, por exemplo, países do oeste europeu passaram por dias calamitosos, enquanto o leste foi aparentemente poupado. Hoje, os países mais atingidos nesse começo, como Itália e Espanha, estão entre os que mais se vacinaram. Já os países do leste, como Bulgária e Tchéquia, têm os piores números de vacinação e mortes da Europa.

Profissional da saúde prepara vacina contra Covid
Profissional da saúde prepara vacina contra Covid - Mauro Pimentel - 28.out.2021/AFP

O medo do contágio por contato nos fez focar no álcool em gel, enquanto ignoramos as máscaras que barraram o vírus em regiões como Singapura e Hong Kong no começo de 2020. E em parte por conta desse sucesso inicial, muitos em Hong Kong não viram a necessidade de se vacinar contra a Covid. Agora, infelizmente, padecem por isso. A cidade que seguiu uma política de Covid zero bem sucedida por cerca de dois anos agora mostra o que acontece quando a ômicron encontra uma população pouco imunizada: em fevereiro, registraram uma das maiores taxas de fatalidade pela Covid-19 do mundo. E as mortes estão concentradas entre idosos não vacinados, principalmente os que vivem em asilos e casas de repouso.

No Brasil, nos fechamos em 2020 e controlamos relativamente bem a situação. Com a melhora da maré no final do ano, relaxamos e levamos a onda da variante gama na cabeça. Em 2021, durante essa subida de mortes, vimos uma grande adesão à vacina. Conforme a situação foi melhorando por causa dessa vacinação, a adoção à segunda dose não foi tão grande quanto à primeira. E agora, com o sucesso das duas doses, a demanda pela dose de reforço só foi crescer realmente em janeiro, com a preocupação com a variante ômicron. E mesmo assim continua baixa.

Alternamos novamente entre medo e relaxamento fora de hora. Com UTIs menos ocupadas, parece que o problema da Covid acabou. Máscaras deixam de ser obrigatórias em ambientes abertos em muitas regiões. E até em ambientes fechados no Rio de Janeiro. O problema da Covid certamente diminuiu, mas não passou. Especialmente para algumas faixas etárias mais ignoradas pelo nosso temor.

Entre as crianças, sobra o medo infundado das vacinas, enquanto faltam vacinas para os menores de 5 anos e faltam leitos pediátricos em regiões como o Distrito Federal e Salvador. Já entre os idosos, faltam doses de reforço e sobram óbitos. De acordo com as mortes por Covid confirmadas no SIVEP-Gripe, o número de óbitos diários entre quem tem mais de 80 anos no final de janeiro foi comparável ao pior de 2020.

Nossa proteção vacinal é enorme, tanto que não repetimos os números de 2021 durante a onda de ômicron. O contrário do que acontece em Hong Kong. Mas nossa adoção das duas doses e principalmente da dose de reforço ainda deixa a desejar. E para quem tem muito risco com a Covid, como os mais idosos, mesmo com vacinas, ele continua alto —e o SUS ainda não tem os tratamentos antivirais que poderiam dar proteção extra aos grupos de risco. Principalmente para essas pessoas, ainda não é hora de abandonar máscaras e deixar de temer a Covid.

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