Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Bernardo Guimarães
Descrição de chapéu ataque à democracia

A falha que abriu caminho para os atos golpistas

Cientistas conhecem bem as vulnerabilidades da mente humana

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Os atos do fim de semana trazem à tona questões sobre desinformação, fake news e manipulação de massas. Como tantas pessoas podem ficar tão convictas sobre crenças que nos parecem implausíveis?

Muito já foi falado sobre o papel de redes sociais e das estratégias de desinformação utilizadas para sustentar narrativas fictícias —e ainda temos muito a aprender sobre isso.

Mas redes sociais não mudam nossos neurônios de lugar. Mensagens disparadas por WhatsApp não instalam chips que mudam a configuração do nosso cérebro.

Golpistas invadem a praça dos Três Poderes e depredam os prédios - Gabriela Biló - 8.jan.2023/Folhapress

A falha fundamental está em nossas cabeças. Às vezes, acabamos por acreditar que surgirá um segundo Sol no céu para realinhar as órbitas dos planetas. Não porque sejamos sempre tolos, mas por termos vulnerabilidades que nos levam a cometer graves enganos.

Essas vulnerabilidades têm sido estudadas pelos psicólogos há muito tempo —e exploradas por profissionais de marketing há décadas.

Na década de 1980, o psicólogo Robert Cialdini publicou o livro "Influência: a Psicologia da Persuasão", que se tornaria um clássico na área. Muito já foi escrito depois disso sobre o tema. Ainda assim, o livro continua trazendo ensinamentos importantes.

Uma dessas lições é que gostamos de ser e parecer consistentes.

Trazendo para hoje, ao enviarmos uma postagem em rede social, nos tornamos mais predispostos a acreditar ou defender opiniões da mesma pessoa ou grupo.

Nosso desejo por consistência nos leva a concordar com opiniões que emitimos anteriormente e a agir de modo coerente com nossas ações passadas. Isso abre portas para sermos levados, aos poucos, a atos que inicialmente rejeitaríamos com certeza.

Da mesma maneira, se pagamos um custo alto por alguma coisa, vamos querer acreditar que há um benefício importante. Por exemplo, se resolvermos acampar desconfortavelmente por alguma causa, faremos de tudo para nos convencer de que a causa vale todo o esforço.

Um segundo ponto importante é que, se todos ao redor estão de acordo com alguma coisa, nós instintivamente tendemos a concordar.

O livro narra um estudo de três cientistas da Universidade de Minnesota sobre um culto em Chicago que acreditava que uma grande calamidade aconteceria em um determinado dia —mas os participantes do culto seriam salvos por discos voadores. O estudo foi publicado num livro com o título "When Prophecy Fails".

O livro documenta a saga de pessoas largando empregos e familiares, seus rituais bizarros e a enorme decepção quando o disco voador não vem e o mundo não acaba.

Um dos achados interessantes do estudo é que, antes da catástrofe anunciada, os participantes do culto, convencidos de suas crenças, davam pouca atenção aos vários jornalistas que os procuravam. Porém, quando o mundo não acaba, eles começam a ativamente procurar a imprensa (e quem passasse por perto) para explicar o que havia ocorrido, tentando convencer o mundo de suas crenças.

Convencer outras pessoas é uma maneira de continuarmos convencidos de nossas opiniões. Ouvir opiniões similares às nossas nos traz confiança nas nossas crenças.

Além de prezar consistência e de tender a concordar com quem está ao nosso redor, nós também gostamos de nos sentir parte de um grupo. Creio que esses elementos nos ajudam a entender, um pouco, como chegamos aonde estamos.

É importante entendermos nossas vulnerabilidades para compreender o que acontece no mundo, mas também para reduzirmos as chances de sermos nós mesmos os incautos utilizados como massa de manobra por quem explora essas vulnerabilidades humanas.

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