Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Bernardo Guimarães

Queremos mais carros, mais caminhões, mais ônibus?

Enquanto discursos defendem o meio ambiente, atos estimulam a queima de combustíveis

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O pacote de incentivos fiscais para compra de carros agora inclui também ônibus e caminhões. Enquanto discursos defendem o meio ambiente, os atos estimulam a queima de combustíveis.

Tenho argumentado que deveríamos fazer o contrário: aumentar a tributação sobre combustíveis, visando reduzir a poluição e o trânsito.

Alguns leitores levantaram objeções a esse argumento. Uns questionaram se preços maiores de fato levariam a menos consumo de gasolina. Outros perguntaram se medidas alternativas, como o rodízio de veículos da cidade de São Paulo, não seriam melhores.

À primeira vista, pode parecer que o consumo de combustível não responderia aos preços. Afinal, ninguém vai vender o carro amanhã e caminhar para o trabalho porque a gasolina ficou R$ 1 mais cara.

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Frentista altera preço em posto em Curitiba (PR) - Eduardo Matysiak/Futura Press/Folhapress

Há três razões para acreditar que os preços, sim, importam.

O primeiro é que combustíveis mais caros encarecem os fretes. Isso aumenta os preços de bens que costumam andar mais de mil léguas para poder chegar aos consumidores e nos leva a comprar produtos que viajam pouco. Assim, reduz-se a demanda por transporte rodoviário e a queima de óleo diesel.

O segundo é que o consumo de combustíveis reage pouco no curto prazo a preços, mas no longo prazo reage bem mais, pois modificamos nossos hábitos, damos mais importância ao consumo de combustível do automóvel quando trocamos de carro. Se o litro da gasolina custasse R$ 10, carros híbridos seriam muito mais comuns.

O terceiro é que a expectativa de preços de combustíveis maiores afeta o investimento em tecnologias alternativas. Se esperamos tributação sobre petróleo maior no futuro, gastamos mais dinheiro pesquisando outras formas de gerar energia hoje.

A segunda objeção é que não seria preciso taxar para reduzir o consumo de combustíveis. Na cidade de São Paulo, temos um rodízio de veículos, não podemos usar o carro em certo dia da semana. Assim, reduzimos a quantidade de carros nas ruas.

Essa medida de fato cumpre esse objetivo, mas o imposto é melhor por dois motivos.

O primeiro é que, com o imposto, podemos sair com o carro quando realmente precisamos e deixamos o carro de lado quando seu uso é menos importante. Pais pagariam muito para poder usar o carro para levar as crianças à escola no dia de rodízio —em vez de pegar um Uber, que é menos conveniente e consome gasolina da mesma forma. Em outros momentos, podemos usar o carro, mas seria fácil andar ou pegar carona.

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Trânsito na região central de São Paulo - Getty Images/iStockphoto

O rodízio nos força a poluir menos em alguns momentos —e não desestimula alternativas que também poluem. O preço maior me faria escolher poluir menos quando o benefício de poluir para mim não é tão grande.

Além disso, o preço do petróleo maior tornaria mais caro cada quilômetro rodado e os bens que viajam longas distâncias. O rodízio coíbe igualmente uma curta viagem à escola das crianças e um trajeto de 20 quilômetros por São Paulo.

O preço torna mais caro o que realmente queremos reduzir.

O segundo motivo é que, com o imposto, o Estado arrecada recursos e pode reduzir outros impostos que desestimulariam a produção e as trocas sem aumentar o déficit.

Claro, toda mudança em imposto tem efeitos distributivos, uns ganham, outros perdem. Mas como poderemos reduzir outros impostos, poderíamos compensar os grupos que perdem mais com maior taxação sobre combustíveis.

Idealmente, essas mudanças seriam esperadas, graduais. Se queremos de fato reduzir a queima de petróleo, aumentos no imposto sobre combustíveis fósseis deveriam ser planejados para os próximos anos. Idealmente, acreditaríamos nesses planos.

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