Cecilia Machado

Economista-chefe do Banco BoCom BBM, é doutora em economia pela Universidade Columbia

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Retorno na reabertura das escolas

Volta às aulas presenciais não vem sem preocupações e riscos

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No início do mês, muitas escolas voltaram a receber alunos para aulas presenciais. Em São Paulo, um terço dos municípios autorizou a reabertura. Na cidade de São Paulo, as escolas municipais estão funcionando para as atividades extracurriculares em dia e horários restritos. Já as aulas regulares devem ocorrer apenas a partir do mês que vem.

A volta às aulas presenciais não vem sem preocupações. Nos Estados Unidos, a decisão ficou por conta de cada estado, com base em cartilha elaborada pelo CDC (Center of Disease Control and Prevention) para várias modalidades de ensino —desde totalmente remota até totalmente presencial. Apesar do enorme temor de pais, professores e da própria comunidade científica, muitos distritos escolares optaram pelo retorno presencial e, desde o final de agosto até o presente, a experiência tem sido bastante exitosa.

Escolas públicas e particulares reabrem para atividades extracurriculares; o secretário Rossieli Soares acompanha a reabertura da escola estadual Estadual Thomaz Rodrigues Alckmin, no Itaim Paulista, na zona leste de São Paulo
Escolas públicas e particulares reabrem para atividades extracurriculares; o secretário Rossieli Soares acompanha a reabertura da escola estadual Estadual Thomaz Rodrigues Alckmin, no Itaim Paulista, na zona leste de São Paulo - Rivaldo Gomes/Folhapress

Dados compilados pela economista Emily Oster da Universidade de Brown e demais pesquisadores sobre 200 mil crianças em 47 estados mostrou taxa de infecção de 1,3 por mil crianças e 2,2 por mil funcionários ao longo das duas últimas semanas de setembro. Taxas similares foram obtidas para o Texas por outra fonte de dados: 1,4 por mil crianças e 1 por mil funcionários. Os resultados obtidos até agora não indicam que as escolas sejam locais de alto contágio e transmissão como antes se imaginava.

É possível argumentar que as taxas de transmissão possam ser maiores no caso do Brasil, especialmente considerando diferenças na infraestrutura das escolas entre os dois países. Mas decretar que a abertura das escolas só pode se dar em ambiente 100% seguro, ou após a vacina, negligencia importantes riscos decorrentes do fechamento das escolas, incluindo seus efeitos indiretos na saúde das próprias crianças.

Entre os prejuízos está o déficit de aprendizagem, uma vez que o ensino remoto é substituto bastante imperfeito para as aulas presenciais, e as possibilidades de compensação —via reforço no ano que vem— são limitadas. A taxa de evasão escolar já alcança média de 9% nas diversas etapas do ensino médio, e pode aumentar ainda mais durante a pandemia.

Negros e pobres estão entre os grupos mais afetados, reforçando ainda mais nossas iniquidades.

Ocorre que a escola também é lugar de entrega de outros serviços igualmente importantes para o desenvolvimento das crianças, além do ensino propriamente dito. Incluem a merenda, o atendimento de saúde (através de iniciativas com o Programa Saúde na Escola), a oportunidade de denúncia para quem sofre situações de violência dentro de casa.

Soma-se a estes fatores a crescente preocupação com o aumento da ansiedade e estresse trazidos pelo confinamento, e a consequente deterioração da saúde mental das crianças. Estudo publicado este ano no JAMA Pediatrics mostrou que 22.6% das crianças em Hubei reportaram sintomas de depressão após curto período de confinamento, comparado à média de 17,2% em estudos anteriores a pandemia. Condições econômicas adversas também estão associados ao aumento de transtornos mentais das crianças, de acordo com estudo publicado no periódico Health Economics em 2019.

No Estados Unidos, 7,1% das crianças de 3 a 17 já foram diagnosticadas com ansiedade. Um adicional de 3,2% neste grupo sofre de depressão, de acordo com estatísticas da CDC. No Brasil, relatório da Organização Pan Americana para a Saúde releva que a saúde mental é responsável por 16% das doenças entre 10 e 19 anos, e que o suicídio é a terceira principal causa de morte nas idades de 15 a 19 anos. Metade de todas as condições de saúde mental começam aos 14 anos de idade, e os efeitos adversos desta condição se manifestam por muitos anos. Transtornos mentais também estão associados à perda salarial e ao aumento da dependência em assistências no futuro.

A pandemia agrava todas estas condições, e o fechamento continuado das escolas exibe efeitos adversos não desprezíveis na saúde física e mental dos estudantes, além de prejuízos econômicos através do déficit de aprendizagem. Se todas as vidas importam, não se pode deixar a vida das crianças e dos adolescentes fora da conta.

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